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Resposta dos Cardeais a Walter Kasper sobre a Família

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Robert Dodaro, OSA (ed.), Remaining in the Truth of Christ, Ignatius Press, San Francisco, 2014, 275p.

Tradução do primeiro capítulo
(texto provisório)


Resumo da argumentação

Robert Dodaro, OSA

Os ensaios deste volume representam a resposta de cinco Cardeais da Igreja Católica Romana e quatro outros especialistas ao livro Evangelho da Família, publicado anteriormente este ano pelo Cardeal Walter Kasper. O livro de Kasper contém o discurso feito por ele, durante o consistório extraordinário de cardeais celebrado nos dias 20-21 de fevereiro de 2014. Um tema importante daquele encontro foi a preparação das duas sessões do Sínodo dos Bispos, convocadas pelo Papa Francisco para 2014 e 2015, com o tema “Desafios Pastorais para a Família no Contexto da Evangelização”. Quase no final de sua colocação o Cardeal Kasper propôs uma mudança no ensinamento e na disciplina sacramental da Igreja, que permitisse, em casos limitados, que católicos divorciados e recasados civilmente fossem admitidos à comunhão eucarística, depois de um período de penitência. Ao defender esta proposta, o cardeal usou como argumento a prática primitiva dos cristãos assim como a longa tradição ortodoxa oriental de aplicar a misericórdia às pessoas divorciadas, dentro de uma fórmula na qual as segundas núpcias seriam “toleradas” – uma praxe geralmente chamada pelos ortodoxos de oikonomia. Kasper espera que seu livro venha a fornecer  “uma base teológica para uma ulterior discussão entre os cardeais”, e que a Igreja Católica encontre um caminho de harmonizar “fidelidade e misericórdia em sua prática pastoral”.
A finalidade da presente obra é responder ao convite, feito pelo Cardeal Kasper, de uma ulterior discussão. Os ensaios publicados neste volume refutam a sua proposta específica de uma forma católica de oikonomia,para alguns casos de pessoas divorciadas e civilmente recasadas, tendo como fundamento o fato de que tal proposta não pode ser harmonizada com a doutrina católica da indissolubilidade do matrimônio e que, com isto, ela fortalece uma concepção equivocada seja de fidelidade, seja de misericórdia.
Depois deste capítulo introdutório, o volume examina os principais textos bíblicos a respeito do divórcio e do segundo casamento. O capítulo seguinte trata do ensinamento e da praxe que predominavam na Igreja primitiva.  Em nenhum dos dois âmbitos, seja bíblico, seja patrístico, os autores encontraram fundamento para o tipo de “tolerância” de casamentos civis após divórcio como advogado por Kasper.  Em seguida, o capítulo quarto examina o fundamento histórico e teológico da praxe ortodoxa oriental da oikonomia, enquanto o quinto capítulo traça o plurissecular desenvolvimento da atual doutrina católico romana a respeito do divórcio e do segundo casamento. A urgência destes capítulos se torna clara com a afirmação do Cardeal Kasper de que com relação à  doutrina da indissolubilidade do matrimônio, “a tradição em nosso caso não é de forma alguma convergente, com se costuma afirmar”, e que “há questões históricas e opiniões discordantes de sérios especialistas, que não podem ser facilmente desconsideradas”. Dada a gravidade da questão doutrinal envolvida, estas suposições históricas exigem uma resposta acadêmica.
À luz dos dados bíblicos e históricos desta primeira parte deste volume, os autores dos quatro capítulos restantes reafirmam o arrazoado teológico e canônico a favor de se manter a coerência entre a doutrina e a disciplina sacramental católicas a respeito do matrimônio e da sagrada comunhão. Assim, os estudos contidos neste livro levam à conclusão que a longa fidelidade da Igreja à verdade do matrimônio constitui o fundamento irrevogável de sua misericordiosa e amorosa resposta ao indivíduo que seja divorciado e civilmente recasado. Sendo assim, este livro contesta a premissa de que a doutrina tradicional e a prática pastoral contemporânea se encontram em contradição.
A finalidade deste primeiro capítulo é resumir e salientar os principais argumentos contra a proposta de Kasper, tais como são apresentados neste livro.

Divórcio e segundo casamento nas Sagradas Escrituras
  
O Novo Testamento documenta o fato de o Cristo condenar um outro casamento após o divórcio como sendo adultério. Nas passagens do Evangelho nas quais se trata do divórcio, a condenação de um outro casamento é sempre absoluta (veja Mt 5, 31-32; 19, 3-9; Mc 10, 2-12; e Lc 16, 18; cf. Lc 5, 31,32). São Paulo repete este mesmo ensinamento e insiste que não é seu, mas de Cristo: “Aos que estão casados, tenho uma ordem. Aliás, não eu, mas o Senhor” (1 Cor 7, 10; ênfase nossa). O texto bíblico chave de Gênese 2, 24 (“Por isso, um homem deixa seu pai e sua mãe, e se une à sua mulher, e eles dois se tornam uma só carne”) estabelece a verdade de que o casamento é entre um homem e uma mulher, de que ele só pode acontecer com alguém de fora da família de origem da pessoa, de que o matrimônio requer intimidade física e proximidade, e de que tem como resultado que os cônjuges se tornam “uma só carne”. Que este texto representa a verdadeira definição cristã do matrimônio torna-se claro quando Jesus o cita em sua resposta aos fariseus dizendo que Moisés teria permitido o divórcio como uma concessão “por causa da vossa dureza de coração... Mas não, no início não era assim” (Mt 19, 8; cf. Mc 10, 5-6; ênfase nossa). E em sua explicação aos fariseus, nesta ocasião (Mc 10, 6-9), Jesus faz alusão tanto a Gênesis 1, 27 (do princípio da criação, “E Deus criou o homem à sua imagem,... e os criou homem e mulher”) como a Gênesis 2, 24. Tomados juntos, estas duas passagens descrevem o casamento no estado original como Deus o criou. O que Jesus quer ensinar aqui é que a indissolubilidade do matrimônio entre um homem e uma mulher  está fundamentada em uma lei divina, que está acima das normas judaicas contemporâneas a respeito do divórcio: “Portanto, o que Deus uniu, o homem não deve separar” (Mc 10, 9).

As cláusulas de exceção no evangelho de Mateus

Se o ensinamento de Jesus a respeito do divórcio e do segundo casamento é tãoclaro, como devemos interpretar as duas passagens no evangelho de Mateus que parecem permitir o divórcio em caso de porneia (Mt 5, 32; 19, 9)? Dois autores neste volume enfrentam a questão. Paul Mankowski, SJ, sugere, com base na filosofia, que porneia não diria respeito a adultério, como se supõe comumente, mas a incesto, e talvez também à poligamia (um prática então comum entre os gentios). Neste caso, Mankowski argumenta que estas duas passagens representam “condições dirimentes” na medida em que não se trata de exceções à regra, mas de condições sob as quais a regra não se aplica, dado que a separação entre um homem e um mulher em qualquer um destes dois casos não constitui um “divórcio”, não havendo um matrimônio real a ser dissolvido.
John Rist, em seu ensaio neste volume, oferece uma explicação diferente. Ele interpreta porneia nestas passagens como “adultério” por parte da mulher. A lei judaica não somente permitia o divórcio neste caso, como a exigia (Dt 24, 4; Jer 3,1). Nas sociedades antigas, hebreia e pagã, o adultério por parte da mulher era um risco de introduzir filhos de estranhos no patrimônio familiar, já que a propriedade passava do pai para seus herdeiros. Jesus rejeita claramente esta lógica, que ele diz Moisés ter permitido por causa de “vossa dureza de coração”, e indica o mandamento divino original sobre o matrimônio como um compromisso para toda a vida. Por isto, o segundo casamento depois do divórcio não é permitido por quanto o outro esposo continue vivo.

Os dados patrísticos

O Cardeal Kasper procura fundamentar o seu argumento na praxe da Igreja primitiva. No entanto, os poucos exemplos citados por ele não são capazes de sustentar sua conclusão, e a vivência vastamente documentada da Igreja primitiva a contradiz totalmente. Sua apresentação dos dados patrísticos é breve; ele envia seus leitores a três estudos publicados a respeito do divórcio e do segundo casamento na Igreja primitiva. Mesmo assim, fica claro que ele se baseia, para os casos especificamente mencionados por ele, em um único autor e ignora os contra-argumentos dos outros. Ele diz, por exemplo, que “há boas razões  para presumir” que o cânon 8 do Primeiro Concílio Ecumênico celebrado em Nicéia no ano 325 d. C. confirma uma praxe pastoral já existente na Igreja primitiva “de tolerância, clemência e indulgência” para com os cristãos divorciados e recasados. Mas a evidência histórica para que se tire esta conclusão, que foi apresentada por Giovanni Cereti, é profundamente equivocada, como foi demonstrado há décadas por Henri Crouzel, SJ, e por outro eminente especialista em patrística, Gille Pelland, SJ. No terceiro capítulo deste volume, John Rist revê cuidadosamente este e outros casos e faz notar que Cereti, até o dia de hoje, ainda não conseguiu responder adequadamente às sérias objeções feitas contra seu argumento. Não ficou claro se Kasper tem consciência nível de detalhes das objeções acadêmicas, não somente da interpretação de Cereti sobre este cânon, mas também dos outros textos patrísticos que ele cita. Mesmo assim, o Cardeal os utiliza como provas para sua proposta.
Embora Rist aceite que a solução “misericordiosa” proposta por Kasper não era desconhecida na Igreja primitiva, ele afirma que que tal posição geralmente era condenada como “não escriturística”  e que praticamente nenhum dos escritores que chegaram até nós e consideramos como autoridades a defendem” (pg. 82). Rist acusa Kasper de usar “uma prática infelizmente bastante comum em alguns ambiente acadêmicos”, através da qual “bem poucos casos” são selecionados com a finalidade provar a existência de um costume, mesmo quando as provas históricas contrárias são “esmagadoramente superiores” (pg. 92). Quando esta tática não consegue convencer, acrescenta Rist, argumenta-se então que a insuficiência das provas “ao menos deixa a solução em aberto”. Procedimentos acadêmicos com estes, conclui Rist, “só podem ser condenados como metodologicamente defeituosos”(pg. 92). Pelland apresenta uma ideia semelhante:
Para que se possa falar de uma “tradição” ou “praxe” da Igreja, não é suficiente apresentar um certo número de casos espalhados por um período de quatro ou cinco séculos. Dever-se-ia demonstrar, o quanto possível, que estes casos correspondem a uma praxe aceitada pela Igreja da época. Do contrário, teríamos apenas a opinião de um teólogo (por renomado que seja), ou uma informação a respeito de uma tradição local em um momento específico da história – o que, obviamente, não tem o mesmo peso.

A Doutrina e a Praxe Oriental Ortodoxa

Fora do ambiente limitado de uns poucos especialistas, a praxe ortodoxa oriental da oikonomia tal como é aplicada ao divórcio e às segundas núpcias não é bem compreendida, até mesmo em termos gerais. O Cardeal Kasper cita-a como um estímulo para a Igreja Católica. No capítulo quatro deste volume, o Arcebispo Cyril Vasil’, SJ, oferece uma narrativa rara e atualizada da história, da teologia e do direito por trás desta praxe. Ele identifica a diferença fundamental entre a posição ortodoxa oriental e posição católica sobre o divórcio e segunda união em uma divergência da compreensão de Mateus 5, 32 e 19, 9. Historicamente, as autoridades ortodoxas interpretaram porneia  como adultério e ler estas passagens como apresentando uma exceção à proibição de Cristo sobre o divórcio. As interpretações católicas, por outro lado, sustentam que Cristo pretendia o vínculo matrimonial permanecesse intacto mesmo se, por causa do adultério, o casal devesse se separar.
Durante o primeiro milênio a Igreja, tanto no ocidente como no oriente, resistiu às tentativas de imperadores de introduzir o divórcio e a segunda união no direito e na praxe eclesiástica. O Concílio Trulano de 692 marca o primeiro sinal de a Igreja aceitar motivos de divórcio e de novo casamento (motivos, no entanto, que podem ser resumidos na ausência ou morte presumida de um dos esposos). Uma mudança ainda maior acontece em 883 quando sob o Patriarca Fócio I de Constantinopla um código de leis eclesiásticas incorpora uma lista muito mais longa de razões que permitem o divórcio e um novo casamento. Um outro fator que complica ainda mais é o aparecimento em 895 do Imperador Bizantino Leão VI que, para obter o reconhecimento legal de seu casamento, precisa da bênção da Igreja. Por volta de 1086 no Império Bizantino, somente os tribunais eclesiásticos tem a permissão de investigar os casos matrimoniais, e eles devem fazê-lo com base no direito civil e imperial que permite o divórcio e o novo casamento para um número grande de razões que muito além do adultério. Sendo assim, a partir do século nono a Igreja Oriental cai progressivamente debaixo da influência dos líderes políticos bizantinos, que convencem os bispos a aceitarem o divórcio liberalizado e as regras de um novo matrimônio. O Patriarca Aléxio I de Constantinopla (1025-1043) permitiu pela primeira vez um cerimônia eclesial (um bênção) para segundas núpcias no caso de uma mulher que tenha divorciado um marido adúltero. Com o esforço missionário que levou o cristianismo a outras nações, estes e outros costumes e éticas matrimoniais semelhantes se desenvolveram dentro das Igrejas Ortodoxas naquelas terras.
O Arcebispo Vasil’ ilustra estes desenvolvimentos olhando de perto a Rússia, Grécia, e o Oriente Médio, e observando as semelhanças e diferenças entre aquelas igrejas. Ele nota a falta de uma base coerente – ou até mesmo de uma terminologia comum – para que se faça uma comparação da lógica que está por trás da praxe teológica, canônica e pastoral associada com aoikonomia entre as diversas Igrejas Ortodoxas. Este contexto confuso explica, em parte, a dificuldade de se encontrar escritos teológicos maduros a respeito da oikonomia entre os escritores Ortodoxos Orientais. Vasil’ conclui  que não é possível determinar um “posição Ortodoxa” uniforme a respeito do divórcio e das segundas núpcias, e por consequência, a respeito daoikonomia. Ele teme que, na melhor das hipóteses, possa se falar de praxes dentre de uma Igreja Ortodoxa específica – embora nem mesmo neste caso a praxe seja muito consistente – ou pode-se falar a respeito da opinião comum a alguns bispos, ou do ponto de vista de um teólogo específico. Existem claras discordâncias entre os bispos e teólogos ortodoxos a respeito da teologia e do direito a respeito desta matéria.
No coração do problema encontra-se o problema da indissolubilidade do matrimônio. A teologia católico romana, seguindo Santo Agostinho, vê a indissolubilidade no sentido seja legal, seja espiritual como uma aliança (sacramentum) que vincula os esposos mutuamente em Cristo por quanto eles viverem. No entanto, os autores ortodoxos evitam o sentido legal desta aliança e veem a indissolubilidade  do casamento em termos de uma aliança espiritual. Como já foi afirmado, as autoridades ortodoxas geralmente interpretam Mateus 5, 32 e 19, 9 como uma permissão de divórcio em caso de adultério, e elas insistem que existem fundamentos patrísticos para fazê-lo. Se existe um ponto de vista comum entre os bispos e os teólogos do oriente ortodoxo, é este. Mas daqui em diante, os autores ortodoxos começam a tomas posições diferentes. Por isto, enquanto alguns sustentam a posição relativamente estrita de que o divórcio e as segundas núpcias são permitidos somente em casos de adultério, alguns, como John Meyendorff, sugerem que a Igreja possa conceder um divórcio baseada no fato de que o casal se recusou de aceitar a graça que lhes foi conferida no sacramento do matrimônio. O divórcio eclesiástico, no ponto de vista de Meyendorff , é simplesmente o reconhecimento da Igreja de que esta graça sacramental foi recusada. Paul Evdokimov modifica esta tese , afirmando que já que o amor recíproco constitui a imagem do sacramento, um fez que o amor se esfria, as comunhão sacramental, que é expressada pela união sexual do casal, se perde. Como resultado, a relação se deteriora numa forma de “fornicação”. Outros escritores ortodoxos falam da “morte” moral ou  espiritual do casamento e a relacionam à morte física de um dos cônjuges, com a consequente dissolução do vínculo que torna um novo casamento possível.
À luz da compreensão que estes autores da indissolubilidade, John Rist pergunta que relação os ortodoxos encontram entre o primeiro e o segundo casamento no caso de divórcio. Rist acredita que seja difícil responder a esta pergunta de forma coerente porque a visão que os ortodoxos possuem de indissolubilidade deixa o papel de Deus na sacramento ambíguo. Se a ação má de qualquer um dos cônjuges (adultério, abandono, etc.) pode realmente destruir o vínculo, de tal forma que um segundo matrimônio deva ser celebrada com menos cerimônia e até mesmo com um espírito penitencial, então existem dois graus de casamento no pensamento ortodoxo? Considerando o fato que a teologia católica indica um papel claro desempenhado por Deus na indissolubilidade do vínculo matrimonial, Rist sugere que seriam ainda mais difícil para os católicos encontra o sentido teológico de uma segunda núpcia (uma observação que trás à mente a observação do Cardeal Kasper sobre “uma disposição de tolerar algo que, em si mesmo, é inaceitável”).

A doutrina e a praxe católica na idade média

No quinto capítulo o Cardeal Walter Brandmüller esboça um breve apanhado do ensinamento da Igreja ocidental a respeito do casamento e do divórcio desde o sínodo de Cartago (407) até o concílio de Trento (1545-1563) que completa a narrativa do Arcebispo Vasil’ do desenvolvimento da Igreja oriental. Brandmüller nota que até mesmo durante a evangelização dos povos franco-germânicos, entre os quais o costume matrimonial autóctone estavam em desacordo com as normas cristãs, os bispos agindo através dos concílios eclesiásticos estabeleceram gradualmente o princípio da indissolubilidade do matrimônio. A pesar deste desenvolvimento, Brandmüller reconhece que houve ocasiões na Idade Média nas quais os sínodos e os concílios eclesiásticos permitiram um segundo casamento após o divórcio, é famoso, por exemplo, o caso do Rei Lotário II (835-869). No entanto, ele examina alguns destes casos e encontra neles um contexto de negociações, tais como a aplicação de uma pressão política externa, o que enfraquece o significado doutrinal das decisões tomadas por tais concílios. Ele defende que o resultados dos concílios gerais e dos sínodos particulares podem encarnar um paradosis  ou tradição “se eles mesmos corresponderem às exigências de uma autêntica tradição tanto no âmbito da forma como do conteúdo” (p. 141). Assim, durante a Idade Média, com também na era patrística, a existência esparsa de exceções altamente duvidosas àquilo que é o ensinamento e a prática costumeira da Igreja com relação à indissolubilidade do matrimônio é muito mais indício de anomalias do que de tradições paralelas ou alternativas que possam ser eventualmente recuperadas na atualidade.

O atual ensinamento católico

O atual ensinamento da Igreja a respeito do divórcio, segunda união e Santa Comunhão pode ser apreendido de forma bastante concisa concentrando-se em partes da Exortação Apostólica Familiaris consortio (parágrafo 84), publicada por São João Paulo II em 1981, e Sacramentum caritatis (parágrafo 29) publicada por Papa Bento XVI em 2007. Estes pontos são sumariamente apresentados pelo Cardeal Gerhard Ludwig Müller no sexto capítulo deste volume. Este último documento desmente a afirmação de que a doutrina da Igreja relega os católicos divorciados e recasados a uma pertença de segunda categoria. Bento XVI exorta expressamente que eles “cultivem, quanto possível, um estilo cristão de vida, através da participação na Santa Missa ainda que sem receber a comunhão, da escuta da palavra de Deus, da adoração eucarística, da oração, da cooperação na vida comunitária, do diálogo franco com um sacerdote ou um mestre de vida espiritual, da dedicação ao serviço da caridade, das obras de penitência, do empenho na educação dos filhos”. O Cardeal Kasper argumenta que esta afirmação demonstra um amolecimento da atitude para com os católicos divorciados e recasados e uma tendência de revisão da atual disciplina. Mas o Cardeal Müller explica, citando a Familiaris consortio (n. 84), a natureza irreformável do ensinamento a respeito dos fieis cujo “estado e condições de vida contradizem objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a Igreja, significada e atuada na Eucaristia”. O Cardeal continua:
A reconciliação através da confissão sacramental, que abre o caminho para a recepção da Eucaristia, somente pode ser concedida no caso de arrependimento sobre o que aconteceu e que estão “dispostos a uma forma de vida não mais em contradição com a indissolubilidade do matrimônio” (pg. 155).
Mesmo assim, como salienta Müller, longe de tratarem os divorciados e civilmente recasados com um frieza condenatória e distância, os pastores são obrigados pelo magistério “a acolher as pessoas em situações irregulares com abertura e sinceridade, a estar ao seu lado com simpatia e disposição de ajudar, e a fazer com que eles tenha consciência do amor do Bom Pastor” (pg. 165).

Casamento e a pessoa individual hoje

O Cardeal Müller retorna a um tema que já havia sido introduzido em um ensaio anterior deste volume por John Rist: a natureza da pessoa individual que procura o casamento nos dias de hoje. Ambos autores levantam a questão das intenções ou da “mentalidade” dos esposos antes, durante e depois da troca de consentimento matrimonial. O que eles compreendem como sendo matrimônio? Eles compreendem que o matrimônio é indissolúvel, ou eles somente querem experimentá-lo para ver se vai dar certo? Como eles compreendem a questão da geração de filhos neste mundo? Eles compreendem que a abertura à geração de filhos é necessária para um casamento sacramental válido? E, ainda mais importante, dada a superficialidade dos relacionamentos nos dias de hoje, os jovens católicos são capazes de compreender a linguagem da Igreja a respeito dos sacramentos, da fidelidade, da indissolubilidade, e da abertura à geração da prole?
John Rist também se preocupa que as pessoas estejam tomadas pelo conceito de Si-mesmo “sequencial” ou “serial” que foi desenvolvido na filosofia contemporânea. Este conceito estimula uma mudança na ideia tradicional de natureza humana; especificamente ele promove uma visão na qual a identidade pessoal muda durante o tempo de vida de uma pessoa. Rist observa que “muitos têm dificuldade em crer que são a mesma pessoa da concepção até a morte” porque “estão sujeitos a variações contínuas e psicologicamente radicais ao longo de suas vidas” (pg. 67). Sendo assim, estas pessoas poderiam concluir “eu não sou a mesma pessoa que eu era quando me casei, e também a minha mulher não é mais a mesma pessoa”, o resultado disto é uma crença de que o próprio casamento se tornou “um relacionamento fictício” (pg. 68).
O Cardeal Müller concede que “a mentalidade atual é bastante oposta à compreensão cristã de casamento, no que tange a sua indissolubilidade e a abertura à prole”, e que, como consequência, “os casamentos hoje me dia são provavelmente inválidos com uma frequência maior do que antigamente”. Ele sugere “a avaliação da validade do casamento é importante e pode ajudar a resolver problemas” (pg. 157).
Mesmo assim, numa Igreja onde o termo “profético” se tornou uma palavra chave nos movimentos que se opõem abertamente à corrente cultural dominante, Müller convida a Igreja a se opor a “uma resignação pragmática  ao supostamente inevitável” e a proclamar “o evangelho da santidade do matrimônio” com “profética simplicidade” (pgs. 160-161); ênfase nossa). A dificuldades de aceitar o ensinamento de Cristo a respeito da santidade do matrimônio foram primeiro notadas, não pelo Sínodo dos Bispos, mas pelos próprios apóstolos que, quando ouviram este ensinamento diretamente do Senhor, responderam com incredulidade: “se tal é a condição do homem a respeito da mulher, é melhor não se casar”! (Mt 19, 10). No entanto, tanto o Cardeal Müller como Paul Mankowski, SJ, em seus respectivos ensaios neste volume, reconhecem que juntamente com este “duro” ensinamento a respeito da indissolubilidade do matrimônio, Cristo também prometeu, nas palavras de Mankowski, “um novo e superabundante derramamento da graça, do auxílio divino, de tal forma que ninguém, por mais frágil que seja, pense se impossível realizar a vontade de Deus”(pg. 63).

Misericórdia e as normas da Igreja

Mas, o que dizer então da falência do relacionamento conjugal, da separação e do divórcio?  Será que o ensinamento e a prática atual da Igreja a respeito dos católicos divorciados e recasados demonstra a qualidade de misericórdia que Jesus mostrou aos pecadores? O Cardeal Müller responde que, para se evitar uma visão incompleta da misericórdia de Jesus devemos olhar para a sua vida e seu ensinamento como um todo. A Igreja não pode apelar para a “misericórdia divina” (pg. 163) como uma forma de descartar os ensinamentos de Jesus que ela achar difíceis.
Toda a economia sacramental é uma obra da misericórdia divina, e não pode simplesmente ser varrida de lado fazendo-se apelo à mesma misericórdia. Um apelo objetivamente falso à misericórdia corre também o risco de trivializar a imagem de Deus, dando a entender que Deus não teria outra alternativa senão perdoar. O mistério de Deus inclui não somente sua misericórdia, mas também sua santidade e sua justiça. (pg. 163)
No oitavo capítulo deste volume, o Cardeal Velásio De Paolis, C. S., reitera o ponto de vista  do Cardeal Müller: “Muitas vezes a misericórdia é apresentada com sendo oposta à lei, até mesmo a lei divina. Mas colocar a misericórdia de Deus em oposição à sua própria lei é uma contradição inaceitável” (pg. 203). De Paolis nota que Kasper não propõe “misericórdia” como um caminho para a Comunhão Eucarística para todos  os católicos divorciados e civilmente recasados, mas somente para os que preencham certas condições. Ele é da opinião que o raciocínio por trás das condições de Kasper é ilógico. Ele se pergunta o que haveria no casamento civil que o qualifique como moralmente mais saudável do que a coabitação. A Igreja não considera o casamento civil após o divórcio como sendo um casamento válido. Sendo assim, os católicos que, nesta situação, se encontram casados de acordo com as leis do Estado não fazem com que o seu comportamento seja moralmente mais respeitável do que um casal vive junto fora do casamento. Ao argumento de Kasper segundo o qual a educação dos filhos de esposos em um casamento civil faz deste casamento uma opção moral melhor ( um “mal menor”) do que outras alternativas, De Paolis responde que matrimônios fictícios desgastam os princípios básicos do matrimônio e da família assim como a moralidade sexual em geral, e ele se pergunta que tipo de educação moral o casal nestas condições possa dar aos seus filhos:
O respeito pela lei moral que proíbe uma vida marital entre pessoas  que não são casadas não pode admitir exceções. A dificuldade que alguém encontre em respeitar a lei moral não autoriza esta pessoa de dar volta a violar a mesma lei moral. (pg. 195).

Disciplina e doutrina

O Cardeal De Paolis também observa que “frequentemente se faz a distinção entre doutrina e disciplina para então se dizer que na Igreja a doutrina não muda, enquanto a disciplina muda” (pg. 206). No entanto, uma mudança na prática da Igreja que tenha em vista que católicos divorciados e civilmente recasados recebam a eucaristia implica necessariamente uma mudança doutrinal. Que ninguém se iluda a este respeito. De Paolis salienta que, na teologia católica, a “disciplina” se refere a algo mais amplo do que as leis humanas. Por exemplo, “a disciplina inclui a lei divina, como os mandamentos, que não estão sujeitos à mudança, embora não sejam diretamente de natureza doutrinal... A disciplina com frequência inclui tudo aquilo ao qual o crente deve se sentir comprometido em sua vida se desejar ser um discípulo fiel de Nosso Senhor Jesus Cristo” (pg. 206). Por isto, a distinção entre a disciplina dos sacramentos e a doutrina católica não é tão clara como muitos pensam que seja ou gostariam que fosse.
No sétimo capítulo deste volume, o Cardeal Carlo Caffarra salienta as razões pelas quais a proposta de Kasper necessariamente envolve uma mudança doutrinal e não somente na disciplina sacramental. Ele nota que de acordo com “a tradição da Igreja, fundada nas Escrituras (veja 1Cor 11, 28), ... a comunhão com o Corpo e com o Sangue do Senhor requer que os que dela participarem não encontrem em contradição com o que recebem”. O Cardeal conclui que “o status [ênfase no original] do divorciado e civilmente recasado está em contradição objetiva com o vínculo de amor que une Cristo e a Igreja, que é significado e atualizado na Eucaristia”(pg. 175).
Caffarra explica que na visão católica, o matrimônio consiste num vínculo que não é simplesmente moral, mas ontológico, porque o Cristo é integrado dentro matrimônio. “A pessoa casada está ontologicamente... consagrada a Cristo, conformada a ele. O vínculo conjugal é colocado em existência pelo próprio Deus, através do consentimento dos dois (esposos)”. Caffarra concede que, se o vínculo marital fosse somente moral e não ontológico, ele poderia ser dispensado. No entanto, dada a natureza ontológica do vinculo sacramental, “o cônjuge permanece integrado em um tal mistério, mesmo se o cônjuge, por uma decisão posterior, atacasse o vínculo sacramental entrando em um estado de vida que o contradiga”(pg. 175; ênfase no original). Como consequência, a admissão de católicos divorciados e recasados ao sacramento da penitência e à Eucaristia significaria não somente uma mudança na prática sacramental e na disciplina; ela introduziria uma contradição fundamental na doutrina católica a respeito do matrimônio, e por consequência também  a respeito da Eucaristia.
Caffarra vê na proposta de Kasper outras consequências para a doutrina da indissolubilidade do matrimônio. Ele argumenta que a admissão de católicos divorciados e civilmente recasados ao sacramento da penitência e da Eucaristia, mesmo sob as condições restritas sugeridas por Kasper, iria essencialmente “reconhecer a legitimidade moral do convívio more coniugali[como marido e mulher] com uma pessoa que não é o verdadeiro cônjuge” (pg. 176) e “convenceria, não somente o fiel, mas qualquer pessoa que prestasse atenção da ideia que, no fundo, não existe casamente absolutamente indissolúvel, [e] que o ‘para sempre’, ao qual aspira todo verdadeiro amor, é um ilusão”(pg. 179).
Em seu livro Kasper levanta duas outras opções para que se permita aos católicos divorciados e recasados se aproximem do sacramento  da penitência e da Eucaristia: um apelo à epikeia (presunção de que a lei não deveria ser aplicada em um caso particular por causa das circunstâncias atenuantes), e a aplicação do princípio moral da prudência. No entanto, o Cardeal Caffarra levanta a objeção que um apelo à prudência não pode ser feito neste caso, porque “aquilo que em si mesmo é... intrinsecamente ilícito nunca pode ser objeto de juízo prudencial”. Em outras palavras, “não pode existir um adultério prudente”. Caffarra defende que “também a referencia à epikeia é sem fundamento” (pg. 177). Como uma virtude, a epikeia só pode ser aplicada às leis humanas. Mas as leis que dizem respeito à indissolubilidade do matrimônio, a proibição do adultério, e o acesso à Eucaristia são leis divinas (veja Mc 10, 9; Jo 8, 11; 1Cor 11, 28). A Igreja não pode isentar o fiel da obrigação de obedecer a lei de Deus.

Os procedimentos canônicos que regem a declaração de nulidade

O Cardeal Kasper também sugere que no caso dos fieis que sejam divorciados e recasados civilmente, o processo jurídico da Igreja que rege a declaração de nulidade sejam simplificados. Especificamente, Kasper sugere a adoção de “procedimentos mais pastorais e espirituais”. Ele propõe que, no lugar de tribunais diocesanos para o matrimônio, “o bispo poderia confiar esta tarefa a um sacerdote com experiência espiritual e pastoral como um penitenciário ou um vigário episcopal”. No capítulo nove deste volume o Cardeal Leo Raymond Burke se serve da extensa legislação e comentários dos Papas , assim como da experiência da Signatura Apostólica, para explicar porque a sugestão de Kasper, se adotada, enfraqueceria o esforço da Igreja de garantir a justiça para com os fieis.
Burke faz notar que os fieis são mal servidos pelos tribunais que caem “em um tipo de pragmatismo pseudo-pastoral”, e então cita São João Paulo II, que “chamou a atenção exatamente que se evitasse a tentação de explorar o processo canônico ‘para poder alcançar o que talvez seja uma finalidade “prática”, que talvez poderia ser considerada “pastoral”, mas isto em detrimento da verdade e da justiça’” (pg. 215). Burke enfatiza que se os tribunais derem a impressão de que sua principal finalidade é capacitar as pessoas com matrimônios falidos possam se casar outra vez na Igreja, oferecendo explicações superficiais ou errôneas, ou até mesmo utilizando procedimentos incorretos, os fieis ficarão “desedificados ou até mesmo escandalizados” (pg. 217).
No coração do procedimento canônico que tem por finalidade estabelecer a verdade a respeito de uma demanda de nulidade em um caso específico de matrimônio é um processo dialético conhecido com o nome de contradictorium. Ele encarna o princípioet audiatur altera pars (e que a outra parte seja ouvida). Burke explica que este princípio determinou historicamente os procedimentos canônicos atualmente em uso nas declarações de nulidade, incluindo a necessidade de um defensor do vínculo e de uma dupla sentença conforme. Ele defende que estes avanços contra a acusação de “pesado juridicismo” (pg. 226) tendo como base o fato de que eles fortificam o processo dialético que, por sua vez, garante que o tribunal possa chegar a uma “certeza moral” (pg. 229) de que a nulidade do matrimônio foi comprovada. Burke afirma que os defensores do vínculo com muito frequência foram negligentes em cumprir suas obrigações, tendo como resultado uma falta de integridade no processo jurídico. Se todos os ministros do tribunal, incluindo os juízes, fossem mais escrupulosos no desempenho de suas responsabilidades, “o processo de se alcançar uma dupla sentença concorde, com o grau de ratificação, não levaria muito tempo” (pg. 236).

Sentido dos Fieis (Sensus fidelium)

Perto do final de seu livro, o Cardeal Kasper cita famoso ensaio do Bem-aventurado John Henry Newman “Sobre a Consulta dos Fieis em Matéria de Doutrina”, e ele se refere  à anedota atribuída a Newman “que, na crise Ariana do IV e do V séculos, não foram os bispos, mas ao contrário os fieis que perseveraram na fé da Igreja”. Kasper celebra Newman como um “precursor do Concílio Vaticano II” e relaciona o seu ensaio com a afirmação do Concílio a respeito do “sentido da fé que é dado a cada cristão por força do Batismo”. A maior parte dos comentaristas do ensaio de Newman toma erroneamente a compreensão que Newman tinha de “fieis” como referindo-se somente ao “laicato”. Mas como faz notar Ian Ker, um eminente especialista em Newman, o beato incluía os sacerdotes e os monges entre os “fieis” de seu argumento, de tal forma que a distinção que ele fazia não era entre clero e laicato, como muitos hoje creem. Além do mais, os historiadores discordam da versão de Newman daquela controvérsia e insistem que, porquanto nos é dado conhecer a posição dos fieis da Igreja primitiva durante a questão ariana, em sua maior parte eles tendiam a aderir à visão de seu bispo local, qualquer que fosse sua posição. Não foi, portanto, o laicato o responsável pela vitória da fé nicena sobre a ariana. Mesmo assim, Kasper forja uma analogia o “fiel” de Newman e o laicato casado na atual Igreja, que ele contrasta com os Cardeais “celibatários” no Consistório, porque os leigos “vivem a sua fé no evangelho da família em famílias concretas e algumas vezes em situações difíceis”. Ele então pede à Igreja que “escute o seu testemunho” e não permita que a questão dos divorciados e recasados “seja decidida somente por cardeais e bispos”.
No entanto, o “sentido dos fieis” não pode ser compreendido na teologia católica como uma expressão da opinião majoritária dentro da Igreja, e a ele não se chega através de pesquisas de opinião. Ele se refere a um instinto pela fé autêntica possuído pelos fieis, compreende-se aqui tanto a hierarquia como o laicato, como o único corpo de Cristo. Newman se referia a esta dinâmica como uma conspirativo, uma respiração conjunta de pastores e leigos. Por isto, enquanto seria errôneo sugerir que os fieis leigos carecem de um instinto da fé autêntica, é um abuso empregar o conceito numa tentativa de contrapor uma suposta “voz dos leigos” seja contra os bispos, seja contra os ensinamentos da Igreja. Estes princípios não constituem uma visão conservadora isolada. Cada um deles foi articulado pelo Concílio Vaticano II e pelos papas posteriores desde então, mais recentemente pelo próprio Papa Francisco em seu discurso de Dezembro de 2013 à Comissão Teológica Internacional.

Conclusão

Os autores deste volume, juntos, defendem que o Novo Testamento apresenta Cristo que inequivocamente proíbe o divórcio e o segundo casamento tendo como fundamento o plano original de Deus para o matrimônio em Gênesis 1, 27 e 2, 24. A solução “misericordiosa” de divórcio advogada pelo Cardeal Kasper não é desconhecida “na Igreja antiga, mas virtualmente nenhum dos escritores que chegaram até nós ou que nós consideramos como fonte de autoridade a defendem; ao contrário, quando a mencionam é para condená-la como sem base nas Escrituras. Não há nada de surpreendente nesta situação; abusos podem acontecer ocasionalmente, mas a sua mera existência não é garantia de que não sejam abusos, quanto menos que sejam modelos a serem seguidos” (pg. 82). A atual prática Ortodoxa oriental da oikonomia em casos de divórcio e novo casamento tem, grosso modo, sua origem no segundo milênio e surgiu como resposta a uma pressão política na Igreja por parte dos Imperadores bizantinos. Durante a Idade Média e também depois, a Igreja Católica no Ocidente resistiu a estes esforços com bastante sucesso e o fez pagando o preço do martírio. A praxe Ortodoxa oriental da oikonomia não é uma tradição alternativa à qual a Igreja Católica possa apelar. Oikonomia, neste contexto, tem como base uma visão de indissolubilidade do matrimônio que não é compatível com a teologia católico romana, que compreende o vínculo matrimonial como enraizado ontologicamente em Cristo. Assim, o casamento civil após o divórcio envolve uma forma de adultério, e isto faz com que a recepção da Eucaristia seja moralmente impossível (1Cor 11, 28), a não ser que o casal pratique a continência sexual. Estas não são uma série de regras confeccionadas pela Igreja; elas constituem lei divina, e a Igreja não pode mudá-las. À mulher flagrada em adultério, Cristo disse, “Vai e não peques mais”(Jo 8, 11). A misericórdia de Deus não nos dispensa de seguir os seus mandamentos.

FONTE



Robert DODARO, OSA (ed.), Remaining in the Truth of Christ, Ignatius Press, San Francisco, 2014, The Argument in Brief. Tradutor: Padre Paulo Ricardo (tradução não revisada) <https://padrepauloricardo.org/>



O Ofício romano do séc. VI aos nossos dias. Continuidade ou ruptura? Um ensaio de avaliação crítica

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Recebi do Pe. Jean-Pierre Herman e sacerdote da diocese de Namur (Bélgica).  Ele nasceu em 1959.  Exerceu até hoje diversos ministérios em Europa, nos Estados Unidos e no Brasil.  É autor de diversos artigos em língua francesa sobre a história da liturgia.

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O Ofício romano do séc. VI aos nossos dias

Continuidade ou ruptura?

Um ensaio de avaliação crítica

Pe Jean-Pierre Herman


Ofício Romano. Um breve percurso histórico

Em 1971 apareceu a primeira edição da Liturgia Horarum juxta ritum romanum[1], que substituiu o venerável Breviarium romanum. Um dos objetivos dos reformadores do Vaticano II era restituir ao Ofício divino seu estatuto de oração do povo de Deus. Hoje as edições em vernáculo do novo Ofício[2]são amplamente difundidas e utilizadas para a oração comunitária e individual dos cristãos, clérigos ou laicos. Pareceu-nos, contudo, conveniente arriscar uma avaliação após quarenta anos de prática. Apresentaremos aqui, portanto, duas questões cruciais: por um lado «O Ofício divino atual é realmente o digno herdeiro do Breviário romano, ou ele marca uma ruptura com uma tradição secular?» e de outro: «Os reformadores, preocupados em restituir ao povo cristão a oração das horas, alcançaram seu objetivo?» A breve reconstrução histórica a seguir ajudar-nos-á a responder.



O Ofício divino, «série de ofícios não-sacramentais celebrados ou recitados em intervalos regulares durante o dia (e à noite) visando à santificação do tempo»[3], sem dúvida só apareceu na Igreja por volta do século IV, após o edito de Constantino. Com efeito, encontramos os primeiros traços nas narrativas de viagens de Egérie[4], nas quais o autor descreve, dentre outras coisas, os diferentes momentos de oração nos locais santos de Jerusalém.

Em 1949, Anton Baumstark publicou um estudo que se tornou referência na matéria[5]no qual ele distinguiu dois tipos de ofício nos primeiros séculos, um dito «catedral», celebrado pelo bispo, pelo clero e pelos cristãos, outro dito «monástico», reservado às comunidades de eremitas. Segundo esse autor, o rito catedral compreendia somente dois ofícios, de manhã e de noite, com uma vigília na madrugada de sábado para domingo. Esses ofícios compreendiam apenas um pequeno número de salmos, escolhidos em função da hora do dia, com cantos e respostas; enquanto a oração monástica supunha a recitação de todos os salmos, do 1º ao 150º em um dado período, a maior parte do tempo em uma semana. Esses ofícios monásticos eram numerosos: às orações terça, sexta e noa que santificavam o dia, juntaram-se uma oração tarde da noite, à meia-noite (distinta da vigília antes da madrugada) depois um ofício da primeira hora (Prima)[6].

Os ofícios monástico e catedral não eram necessariamente concorrentes, mas podiam ser celebrados em complemento na mesma igreja por grupos diferentes, como vemos em Egérie[7].

No decorrer dos séculos, conquanto a estrutura do ofício de tipo catedral se impôs no oriente, a igreja romana privilegiou antes o ofício de tipo monástico e a importância da recitação da salmodia na santificação do tempo[8].

Nas origens do Ofício romano

Muito pouco sabemos sobre o ofício romano antes do século VI. Parece, contudo, claro que se deve falar de ofícios variados, e não de uma única forma de ofício. Nos «tituli», ou igrejas presbiterais, é provável que fossem celebrados apenas os ofícios da manhã e da noite na tradição catedral. O sacramentário de Verona (316) e o sacramentário «gélasien» (séc. VII) nos fornecem orações para a manhã e para a noite, mas são silentes quanto à estrutura dos ofícios.

A maior parte dos autores estima que o ofício das basílicas, cuidado pelos monges, comportava a totalidade das horas canônicas, das Vigílias às Completas, o que influenciou toda a tradição do Ofício ocidental. As descrições das Regras do Mestre[9]e de São Bento[10]são, neste aspecto, indubitavelmente derivadas dessa tradição romana antiga.

No séc. VIII a estrutura do ofício basilical romano se espalhou por todo o ocidente latino.  Em nossas terras, foi graças aos esforços de Pepino, o Breve (714-68) e de Chrodegang, bispo de Metz (+766) que o uso romano suplantou progressivamente os velhos costumes gálicos, esforços retomados por Charlemagne (C. 742-814). Documentos como o Liber Officialis e o Liber de ordine antiphonarii, obras de Amalaire, bispo de Metz (+850) nos fazem descobrir como as estruturas romanas do ofício foram implantadas em território franco, ou ainda associadas às variações locais, para formarem um ofício chamado hoje romano-francoque compreendia uma trama comum, juntamente com numerosos acréscimos locais. Essa situação perdurará até o século XI[11].


Desenvolvimentos a partir do séc. XIII

Até o século XIII essa estrutura, como tal, sofreu pouquíssimas alterações. A sobrecarga de que padecia o Ofício no momento das reformas era antes causada pelos numerosos acréscimos que complementaram o curso ordinário das horas canônicas anos a fio: salmos graduais, salmos penitenciais, Ofício dos Defuntos, Ofício de Nossa Senhora, Símbolo de Santo Atanásio, ladainha dos santos, preces... pouco a pouco sobrecarregaram e sombrearam o Ofício cotidiano. Acrescentemos a isso uma prevalência das festas dos santos no calendário temporal, em que reapareciam regularmente os salmos e as leituras do comum dos santos, em detrimento do curso ordinário[12].

Sob o pontificado de Inocêncio III (1198-1216), a codificação do breviário da Cúria romana devia aliviar esse fardo voltando essencialmente à estrutura do Ofício romano-franco.

Convém esclarecer aqui a noção de «Breviário». Ninguém cogita que esse termo designe o aliviamento ou a abreviação de um ofício outrora mais longo. Ora, os primeiros breviários não constituíam em nada um abreviamento, mas sim a compilação em um único volume de todos os elementos que compõem o Ofício, até hoje contidos nas coleções separadas (antifonários, saltério, hinários...). Por conseguinte, o breviário tornou-se um livro portável, que os clérigos levavam em viagem para celebração privada.

A reforma de Inocêncio III manteve os princípios seculares da leitura da Escritura em um ano, e a recitação de todo o saltério na semana, mas não restabeleceu a primazia do temporal sobre o santoral. É a adoção rápida desse Ofício pela Ordem dos Franciscanos e o impulso desta que contribuiu para a sua expansão em todo o Ocidente.

Uma nova necessidade de reformar se fez sentir em meados do século XVI, numa época em que a vida comunitária esteve em declínio. Os clérigos, frequentemente sozinhos para a recitação do Ofício e assoberbados pelos encargos pastorais cada vez mais numerosos, sentiam pesadamente a extensão das leituras tiradas da Escritura e os trechos de textos dos santos, nos dias em que o santoral precedia o temporal. O Papa Clemente VII (1478-1534) encarregou então um cardeal espanhol de nome Quinones (1485-1540) de pensar numa reforma radical do breviário, a fim de facilitá-lo sobretudo na recitação a solo. As características dessa reforma foram a restauração absoluta da leitura contínua da Escritura e a recitação semanal do saltério. Os salmos foram redistribuídos nas diferentes horas, sem modificações para as festas. Mais do que recitados em sua ordem no saltério, eles foram escolhidos em função da hora. Notar-se-á igualmente o lugar do hino no começo do Ofício e o encurtamento dos textos hagiográficos. Esse breviário se torna rapidamente popular e serve de modelo para a reforma dos breviários locais. Ele encontra logo um certo número de detratores, dentre os quais o teólogo espanhol Jean de Arze[13]. A maior censura deste último a Quinones é que ele elaborou seu Ofício quase exclusivamente em função da recitação do ofício em particular, abandonando assim inúmeros elementos do Ofício coral.

Sensíveis aos argumentos de Arze, os Padres do Concílio de Trento (1645-1663) instituíram uma comissão para a «correção» do breviário. Pela Bula Quod a nobis (1568), o Papa Pio V interditou formalmente o breviário de Quinones e promulgou oficialmente o Breviarium Romanum, que se manteve inalterado até o início do séc. XX, e que conhecemos pelo nome de Breviário do Concílio de Trento[14]. Ele é imposto a toda à Igreja ocidental, com algumas exceções locais.

O Concílio de Trento restituiu ao Ofício divino sua forma tradicional, simplificada mas não alterada. É portanto notável que até 1911, à parte algumas adaptações, a estrutura do Ofício romano e monástico permaneceu aquela que já encontrávamos no sacramentário de Amalaire, no séc. IX[15].


De Pio XII a VaticanoII
Desde o século XVIII , um crescente desejo de reforma veio à superfície.
O desejo era, antes de tudo, de facilitar o recitar das horas canónicas pelos clérigos a elas obrigados, a mais das vezes ocupados por deveres pastorais, ao mesmo tempo que de reduzir tempo gasto em numerosos elementos complementares que obscureciam o verdadeiro sentido de santificar o dia.
Foi tão somente Pio X, passadas tentativas infrutíferas de alguns de seus predecessores, quem instaurou uma comissão para reformar o breviário.
Essa comissão se beneficiava dos trabalhos de ilustres liturgistas do século XIX tais como Dom Guéranger, abade de Solesmes na France e o Pe Batifol, autor de uma muita popular historia do Officio romano.  Seu objetivo principal era o de restaurar a recitação contínua do saltério por uma semana, priorizando o Ofício do Tempo sobre o do Santoral, o ferial sobre as Festas dos Santos.
Os ofícios complementares, , da santa Virgem, dos defuntos, não se acrescentariam mais ao ofício ferial e os elementos anexos e de devoção tais como preces, orações votivas , não estariam mais previstos que em certos dias particulares.
Nesse ínterim, a redistribuição dos salmos tiveram por resultado uma estrutura que modificava radicalmente o esquema nunca modificado desde Amalaire.
Woolfenden evalua essa trabalho como muito insuficiente : O ofício do rito romano passou por mudanças radicais no século XX.  Em 1911, o papa Pio X criou uma comissão para reformar o breviário que devia introduzir um grande número de modificações,  destruindo assim o número de elementos antigos ou tornando o significado deles menos evidentes.[16]
Uma das mudanças mais importantes concerne diretamente nosso tópico.  Se trata do abandono,  nas laudes,  da recitação cotidiana dos salmos 148 à 150 , que deram, portanto o nome a essa hora do dia, nós falaremos sobre mais posteriormente. 
O papa promulgou o novo breviário pela bula Divino afflatu (1911) onde ele estipula que essa reforma é somente a primeira etapa de uma revisão mais profunda do ofício divino.  Por mais drásticas que sejam essas mudanças,  elas somente faziam um prelúdio da publicação, depois do VTII , de um ofício , de uma estrutura totalmente modificada
Dois movimentos complementares iriam se manifestar na primeira metade do século XX. O primeiro foi a publicação em vários países , de um breviário abreviado bilingues ( latim- língua do país) por causa dos leigos.  Foi uma abertura ao povo de Deus, isso que Pio XII chamara a oração do corpo místico de Cristo recitado pelo clero a qual os leigos são convidados a tomar parte.
O segundo, patrocinado pela santa Sé, concretizava o desejo expressado por pio X de reformar profundamente o Ofício. Começava pela nomeação de uma comissão , em 1948, que preparou realmente o trabalho do Concílio. uma primeira tarefa compreendia à edição de uma nova tradução dos salmos mas que foi rapidamente julgada impraticável.
Um primeiro sucesso, sobre João XXIII, foi uma revisão do CR. Na edição de 1961, a primazia do ferial sobre o santoral já era coisa feita e o Ofício de Vigílias se compunha desde então de 9 salmos de 3 leituras repartidas a mais das vezes em um único noturno, excetuados os dias de festas maiores, Nesse ínterim, nenhuma reforma maior havia sido deslanchada.

Ensaio de avaliação crítica da Liturgia das horas

Continuidade ou ruptura? As vantagens do novo Ofício...

De um certo ponto de vista, o novo Ofício oferece um grande número de vantagens em comparação com aquele que substituiu. Ele se caracteriza, dentre outros, por:

a) Clareza e a uniformidade de sua estrutura. Esta é marcada primeiro pela retomada das horas de Laudes e de Vésperas como «pilares» do dia, orações da manhã e da noite. O ofício de Laudes, com efeito, via sua significação um pouco ocultada por sua proximidade com as noturnas (chamadas impropriamente Matinas) e com a hora prima, percebida por alguns como um par da oração do começo do dia.

b) Certa flexibilidade e uma grande facilidade para a recitação: um «Ofício das leituras» que se recita em qualquer momento do dia, até mesmo com a possibilidade de integrá-lo a uma das outras horas (laudes, hora média ou vésperas) e as horas menores reduzidas a uma única «Hora média», mesmo que mantida uma possibilidade, quase teórica, de recitar duas outras horas. Apenas Laudes, Vésperas e Completas são fixadas num momento particular do dia.

c) Um corpo mais importante de leituras escriturais e a leitura cotidiana de um texto patrístico relacionado com o tempo litúrgico e normalmente com o evangelho do dia. Se os outros dois pontos eram de natureza estrutural, este toca ao perfil espiritual e é, na nossa visão, o único aporte maior do novo Ofício divino. O breviário de 1962, com efeito, limitou até certo ponto as leituras das matinas. Quanto às leituras patrísticas, elas eram reservadas aos domingos e às festas, com exceção dos dias de festa com três noturnas, relativamente breves.

Liturgia horarum, tanto na edição típica quanto nas suas traduções, contém um ciclo de leituras repartidas em um ano. Compreende-se facilmente que esse corpo está longe de estar completo. No entanto, no fim do volume, se propõe um ciclo mais completo, que se estende por dois anos. Este permite abordar a maior parte dos livros da sagrada Escritura, ao menos em seus textos mais significativos.

Depois de Campbell, a leitura patrística ou hagiográfica longa responde a um desejo do Cardeal Lercaro[17], presidente do Consilium. Este constatou, com efeito, que os clérigos engajados na vida pastoral dispunham de pouco tempo para consagrar à leitura espiritual. Ele desejava, portanto, integrar esta à leitura do Ofício, e também colocá-la em cotejo com a liturgia do tempo ou do dia.

Tudo está perfeito portanto?

No entanto, ao lado desses poucos pontos positivos, é forçoso constatar que essas novas construções consagram uma ruptura com o sentido secular do Ofício divino. Parece que o objetivo dos reformadores foi muito mais de adaptar o Ofício à vida do homem moderno e à sua oração pessoal do que de guardar o sentido primeiro do Ofício: a santificação do tempo e a oração de toda a Igreja, laus perennis em união com o cosmos. As traduções que se seguiram foram ainda mais longe nesse sentido. Eis um breve inventário de elementos que revelam esse estado de espírito:

a) A omissão de certos salmos ou de certos versículos de salmos. Com efeito, todos os salmos diretamente imprecatórios[18], assim como os versículos de mesma natureza em alguns salmos, são sistematicamente omitidos. Um dos principais «construtores» da Liturgia Horarum, Dom Aimé-Georges Martimort, assim se expressa quanto ao tema:

Seria preciso manter o saltério integralmente? Ao termo das discussões no seio dos grupos peritos, depois no Consilium, após estar também informado do parecer de outras Igrejas oriundas da Reforma, experiência tanto mais interessante que essas Igrejas celebrem tradicionalmente a liturgia em língua moderna, foi decidido que três salmos históricos seriam reservados aos tempos litúrgicos privilegiados[19](…). Três salmos imprecatórios foram omitidos do curso, e mesmo certos versículos de diversos outros salmos (…). Essa medida, muito discutida é claro, era porém necessária para a celebração pública em vernáculo.

Essa mutilação do saltério é de importância, pois ela priva quem recita o Ofício da totalidade do saltério e desvia o sentido de certos salmos. O historiador e sociólogo Alain Besançon assim a comenta:

A ideia do combate, da guerra, ocupa um tal lugar nas Escrituras cristãs que se pergunta como ela pode ter sido ocultada. Assinale-se que nas edições francesas dos breviários, o saltério foi censurado de seus versículos bíblicos mais belicosos e mais imprecatórios[20], como incompatíveis com a «sensibilidade de hoje em dia». Essa supressão é tipicamente marcionita[21].

A crítica do Pe. Roguet, ele próprio perito do Concílio, é ainda mais severa:

Evidentemente, um cristianismo convencional, enfadonho ou sentimental, se sente mal em face do vigor e da crueza bíblicos: mas há aí justamente uma excelente cura de saúde moral, de vigor religioso. Nada saberia melhor nos precaver contra o cristianismo mundano e superficial que o retorno à Palavra de Deus colocada em sua força[22].

b) A recitação do saltério em quatro semanas: a tradição do Ofício romano esteve, durante séculos, calcada na tradição beneditina que recita todo o saltério numa semana. Ora, no ímpeto de encurtamento dos membros do Consilium, os salmos são agora repartidos em quatro semanas. Para além de uma ruptura da tradição, é também o aspecto sistemático do Ofício que está assim destruído. A regularidade da prática fazia rezar salmos fixos em horas determinadas. Instalou-se um hábito de os encontrar cada semana no mesmo endereço. A nova repartição, muito mais fixa, rompe esse hábito.

Acerca desse último ponto e do anterior, deixaremos a última palavra ao Pe. Alain Lorans, que exprime uma opinião que partilhamos inteiramente:

Assim, só resta na nova liturgia cento e quarenta e quatro salmos, em todas as quatro semanas, e ainda numa versão suavizada. Essa poesia bíblica, judaica, que exprime todos os sentimentos do povo de Israel, todas as suas orações, suas dores, suas esperanças, esse saltério que impregnou a oração de Jesus Cristo, da Virgem Maria, dos Apóstolos foi diluído de um lado e censurado de outro[23].

c) A redução do número de horas e a flexibilidade na recitação: como já mencionamos, somente laudes, vésperas e completas guardam um lugar distribuído no dia. Dentre as horas menores, a prima foi suprimida. Das três outras horas, uma apenas mantém-se obrigatória, chamada «hora média» (lat. Ad horam mediam), à escolha do recitante. A salmodia da hora média varia a cada dia. Os que desejam recitar as outras duas horas devem recorrer aos salmos graduais.

d) A uniformização da estrutura das horas: cada hora, outrora, continha praticamente sempre os mesmos elementos, mas sua disposição variava segundo a hora recitada. Por exemplo, se o hino viesse entre a leitura breve e o Magnificat nas laudes e nas vésperas, ele teria lugar no começo da oração nas horas menores e depois dos salmos nas completas. Segundo Campbell, os reformadores basearam-se na tradição ambrosiana para fazer isso.

A nova liturgia das horas, portanto, coloca sempre o hino no início do ofício. Em seguida vêm a salmodia e a Palavra de Deus. Quanto ao responsório breve, outrora reservado às horas menores e às completas, ele tem lugar a partir de então nas laudes e nas vésperas, mas permanece nas completas. Tem-se, pois, um «ordenamento» das horas que sente a racionalização e a sistematização, em detrimento dos antigos costumes.

e) Ofício das leituras: ele é, com a hora média, uma das grandes inovações do novo ofício. Com efeito, é o sucedâneo daquilo que foi outrora a vigília, ou matinas, mas perde seu caráter típico de «oração durante a noite». A salmodia das matinas havia sido reduzida de doze a nove salmos por Pio X. A do Ofício das leituras foi reduzida ao excesso: três salmos, ou porções de salmo. Em certos dias, ele é de uma brevidade desconcertante. Destacamos aí, porém, um ponto positivo: a leitura sistemática da Escritura num ciclo de um ou dois anos, complementada por uma leitura patrística ou hagiográfica para as festas de santos.

Essa «hora» pode ser recitada em qualquer momento do dia ou da noite: na vigília, antes das Laudes, ou durante o dia, segundo a conveniência. Ela pode até mesmo se juntar a outro ofício.

A leitura repartida em dois anos oferece claramente uma aproximação muito mais completa dos livros bíblicos. Infelizmente, tanto a edição latina quanto as vernaculares da Liturgia horarum contentam-se em propor o ciclo num ano, com as leituras patrísticas adaptadas. A leitura em dois anos é mencionada apenas no fim do volume, sob a forma de tabela, sem complementos patrísticos. Ela  encontrou, supomos, pouco prestígio junto aos clérigos. Antes de mais nada em razão de sua simples menção, discreta e quase marginal, nos breviários; em seguido porque deixaram de lhe acrescentar leituras patrísticas adaptadas. Os monges de Solesmes forneceram, nesse aspecto, uma contribuição muito pouco marcante. Eles publicaram todo esse ciclo nos anos 90, antes de uma versão latim-francês, em seguida inteiramente em fracês. Lamentavelmente, apenas algumas comunidades religiosas e alguns indivíduos utilizam-na atualmente.[24][25]

f) A pobreza das traduções: a edição típica da Liturgia Horarum era, é claro, destinada a ser traduzida nas diversas línguas vernáculas. Os salmos e as leituras da Escritura são citados numa tradução reconhecida certamente. Mas as partes «próprias», os hinos e as intercessões, foram normalmente «adaptadas», quando  não foram substituídas por produções locais. O resultado é muitas vezes de uma grande pobreza teológica.

Um exame das diferentes versões mostra que a edição francesa é uma das menos fiéis e mais enganosas. Os hinos propostos pela Liturgia horarum formaram objeto de um volume à parte, publicado tardiamente e sem muita divulgação.

Os hinos são composições de autores francófonos. Quase sempre de uma grande banalidade, às vezes poéticos e ao limite da incompreensão. A tradução dos salmos foi emprestada para a TEB. Assim como os hinos, ela também é bastante banal e, aqui, de caráter pouco poético.

No responsório da edição típica, preferiu-se as fabricações de editores e as belas antífonas do Ofício tradicional soam quase sempre mal em sua tradução francesa. Para coroar tudo, as intercessões «adaptadas» e fabricadas, ao término da Laudes e das Vésperas, não têm o caráter solene e respeitoso da edição típica vaticana.

Muito mais do que a edição latina, a versão francesa, como suas irmãs de outras línguas, parece ligada a uma época, numa linguagem que passa e que, cedo ou tarde, deixará de satisfazer.

A leitura desses elementos impõe ela própria uma constatação: na nova estrutura, a natureza do Ofício se vê profundamente modificada. Taft reconhece essa revolução, e estima até mesmo que ela não tenha ido suficientemente longe:

O problema que coloca a nova Liturgia das Horas do rito romano não é de ordem estrutural. A estrutura renovada constitui, sob vários pontos de vista, uma ruptura corajosa com o passado. Os problemas – a língua, a extensão, o curso exageradamente monástico, o excessivo número de salmos por semana – foram afrontados com um espírito imaginativo e decidido. Mas muitos estimam que a recusa de uma ruptura ainda mais radical com não somente as formas mas com a mentalidade desse passado corrompeu a reforma recente do ofício romano.[26][27]

De nossa parte, só podemos lamentar a ruptura com treze séculos de tradição. É preciso ousar dizer que a reforma litúrgica foi antes de tudo elaborada em assembleia por professores de liturgia e funcionários de um «ecletismo tradicional». Muitos eruditos e especialistas se dão conta disso hoje.

O curso das horas, que começava no Ocidente com a oração durante a noite para «explodir» de alegria ao nascer do sol pelo canto das laudes, a entrega do dia e do trabalho nas mãos de Deus, a santificação do tempo na terceira, sexta e nona horas, o canto das vésperas ao pôr-do-sol e o encerramento do dia com as completas deram lugar a um esquema funcional adaptado à vida moderna, mas que, na verdade, representa somente um tira-gosto diante da bela teologia do Ofício divino. Taft partilha nossa análise, mas não nossas conclusões e nosso pesar.

Recentemente, um bispo me fazia ponderar a contingência do Ofício quanto à sua estrutura e ao seu conteúdo. Essa foi sem dúvida, na história, também a opinião de Quinones ou de alguns reformadores isolados. Esse foi também, é claro, o pressuposto dos membros do CoetusIX. A liberdade que caracteriza bem as liturgias atuais deixou-a ainda maior. Em outras épocas, em quase todos os casos, a Igreja, constatando o fracasso, voltou rapidamente à tradição. Relembremos a sábia decisão de Pio XII de abandonar a tradução do saltério de 1958 e de retornar ao antigo texto da Vulgata. O que seria dele hoje?

O objetivo foi alcançado?

Outra questão que vale a pena ser feita concerne ao objetivo principal dos membros do Coetus: devolver ao Ofício divino seu caráter de oração de todo o povo cristão, e não apenas dos clérigos. Esse objetivo foi atendido? As avaliações nesse tema são extremamente mitigadas. Segundo os autores que estudamos, mesmo se essa perspectiva esteve constantemente presente no espírito dos membros do grupo, Liturgia Horarumpermanece concebida como um ofício de tipo monástico, e mesmo em vista, antes de qualquer coisa, da recitação em particular. Citamos ainda Taft a respeito:

Nas discussões relativas ao ofício, muitas vozes bem informadas se levantaram para reivindicar um ofício popular de tipo catedral que possa convir a uma celebração pública paroquial[28]. Mas, após o relato de Annibale Bugnini acerca das deliberações da comissão para a reforma do ofício, três coisas claramente apareceram:

1)      A preocupação primordial foi produzir um livro de oração para o clero e  religiosos.

2)      Presumiu-se simplesmente que essa oração seria feita, na maior parte, em privado. Uma celebração «com o povo» - assim se disse – foi considerada e mesmo desejada, mas o teor e o vocabulário das discussões mostra que isso só era uma exceção e não um ponto de partida em busca da compreensão do ofício.

3)      A base histórica, subjacente a uma grande parte da discussão, foi gravemente deficiente, pois ela se fundou quase exclusivamente sobre uma tradição latina posterior à Idade Média[29].

Depois de alguns decênios de prática, nosso parecer será mais matizado. Se olharmos o estatuto do breviário para o povo cristão antes dos anos 1960, devemos reconhecer que um caminho enorme foi percorrido desde esse tempo. Até então, ele era para os laicos um livro um pouco misterioso, reservado aos clérigos, que tinham a obrigação de recitá-lo. Hoje podemos dizer que o objetivo da Comissão foi parcialmente atendido.

A passagem para a língua vernácula (infelizmente, como já mencionado acima, com traduções extremamente livres e uma certa falta de gosto), a diminuição da salmodia concorreram para colocar o Ofício nas mãos de muitos cristãos. Nos países de expressão francófona, Prière du Temps présent, equivalente atual do Diurnale, é regularmente reeditado e continua a ser vendido. Ele tornou-se a oração habitual dos retiros, dos grupos de oração, e também a oração individual de muitos cristãos fervorosos ou engajados.

O desejo de produzir um ofício adaptado à celebração paroquial não se realizou. O Ofício divino parece o parente pobre dos ofícios paroquiais, mesmo que haja, aqui e ali, tentativas de recitar as vésperas e as laudes em comum. Em contrapartida, as vésperas dominicais que com a Missa formavam os dois polos do domingo caíram aos poucos em desuso em toda parte.

A despeito disso, estamos no direito de nos perguntarmos se para chegar a esse resultado um tal trabalho de remanejamento e de ruptura era necessário.

Na nossa acepção, uma terceira visão teria sido possível. Campbell relata as discussões no grupo, seguidas do desejo de alguns de distinguir um ofício destinado à recitação pelos clérigos e um ofício mais «comunitário» destinado aos leigos, ou à celebração paroquial. Essa ideia não foi conservada. O ideal teria sido talvez, à semelhança de certos ofícios orientais, organizar o Ofício de 1960, fixando-lhe partes essenciais e partes facultativas. Os ofícios do Oriente, nesse aspecto, poderiam servir de exemplo. Eles compreendem geralmente elementos obrigatórios e outros facultativos. Isso permite o desenvolvimento de um ofício completo no quadro monástico, pontifical ou solene, e um ofício mais breve e mais sóbrio no quadro paroquial. Esses ofícios são acompanhados geralmente de ritos particulares, como o acendimento de velas, incensações e procissões, que tiram o ofício de uma recitação muito estática.

Nada proibia uma tal opção, que nem sequer foi invocada, mas que teria evitado uma quebra radical.

Algumas frases de uma pessoa insuspeita, Pe. Patrick Prétot, diretor do Instituto superior de liturgia de Paris, nos servirão de conclusão:

As práticas rituais vindas da tradição são na minha opinião um tesouro que não ousamos contrapor: nós buscamos o «novo» que seria considerado melhor correspondente às mentalidades do nosso tempo. Mas antes de querer inventar (e sabe-se o quanto essa palavra é problemática quando se fala de ritos), não teríamos antes de confiar nos ritos litúrgicos transmitidos? Eles formaram gerações, posto que é a liturgia que nos forma[30].



Bibliografia


Baumstark, A., Liturgie comparée (Editions de Chevetogne, 1940).

Besançon A., La confusion des langues – La crise idéologique de l’Eglise, Calmann-Lévy, 1978, pp. 123-124.

Breviarium Romanum ex Decreto SS. Concilii Tridentini restitutum… {4 volumes} (Tournai, Desclée, 1894).

Campbell S.,From Breviary to Liturgy of the Hours (Collegeville, MN, Pueblo Books, 1995, pp. 5-6. 

de Vogüé A., La Règle du Maître, 3 volumes (Sources chrétiennes 105-107) (Paris, Cerf, 1964-1965).

de Vogüé A.,La Règle de saint Benoît, 7 volumes,  (Sources Chrétiennes, 181-186, 7ème volume hors série) (Paris, Cerf, 1972-1977).

Egérie,Journal de voyage, éd. P. Maraval, (Sources chrétiennes 296 ; Paris, Cerf, 1952). 

Liturgia Horarum juxta ritum romanum, 4 volumes(Typis Polyglotis Vaticana, Rome, 1971).

Liturgia das Horas, versão CNBB (Ave Maria, São Paulo, 1995).  4 volumes.  2.

Liturgia das horas, segundo o rito romano.(Editora Vozes, Paulinas, São Paulo, 2000). 4 volumes.  Ofício Divino. Renovado conforme o Decreto do Concílio Vaticano II e promulgado pelo Papa Paulo VI. Tradução para o Brasil  da segunda edição típica.

Lectionnaire monastique de l’Office divin. A l'usage de l'abbaye Saint-Pierre de Solesmes, Tome I, Paris (Cerf, 1993) à Tome VII (Paris, Cerf, 1997).

Lorans A. , A propos du lectionnaire – Se libérer des préjugés faciles, dans Lettre à nos frères prêtres, Juin 2008, p. 5.

Martimort A.-G., L’institutio generalis et la nouvelle Liturgia horarum », dans Notitiæ 64, mai-juin 1971, p. 219.

Mateos  J., « The Origins of the Divine Office » dans Worship 41 (1967), pp. 477-485

Mateos J., « The Morning and Evening Office », dans Worship 42 (1963), pp. 31-47,

Prétot P., « Se donner des repères pour avancer » dans : Célébrer 339, octobre 2005, p. 45.

Roguet A.M., On nous change la religion (Cerf, 1959)  pp. 91-92.

Storey W., « The Liturgy of the Hours : Cathedral versus Monastery », dans : Gallen J. (éd.), Christians at Prayer (Liturgical Studies), Notre Dame et Londres, University of Notre Dame Press, 1977, pp. 61-82.

The Study of Liturgy, ouvrage en collaboration, Ed. Ch. Jones, G. Wainwright, E. Yarnold SJ et P. Bradshaw (Londres, SPCK 1992), p. 399.

Taft R.,La Liturgie des heures en Orient et en Occident (Paris, Brepols, 1991).

Woolfenden G., Daily Liturgical Prayer (Burlington, VT, Ashgate, 2004). 




[1]             Liturgia Horarum juxta ritum romanum, 4 volumes(Typis Polyglotis Vaticana, Rome, 1971).
[2]             Traduçao para o Brasil ; 1. Liturgia das Horas, versão CNBB (Ave Maria, São Paulo, 1995).  4 volumes.  2. Liturgia das horas, segundo o rito romano.(Editora Vozes, Paulinas, São Paulo, 2000). 4 volumes.  Ofício Divino. Renovado conforme o Decreto do Concílio Vaticano II e promulgado pelo Papa Paulo VI. Tradução para o Brasil  da segunda edição típica.
[3]             The Study of Liturgy, obra em colaboração, Ed. Ch. Jones, G. Wainwright, E. Yarnold SJ et P. Bradshaw (Londres, SPCK 1992), p. 399.
[4]             Egérie,Journal de voyage, ed. P. Maraval, (Sources chrétiennes 296; Paris, Cerf, 1952). 
[5]             Baumstark, A., Liturgie comparée (Editions de Chevetogne, 1940).
[6]             Ibid., pp.112-115.
[7]             Egérie, op. cit.
[8]             Ver a esse propósito Taft R.,La Liturgie des heures en Orient et en Occident (Paris, Brepols, 1991), que nos parece a obra mais completa na matéria.
[9]             de Vogüé A., La Règle du Maître, 3 volumes (Sources chrétiennes 105-107) (Paris, Cerf, 1964-1965).
[10]           de Vogüé A.,La Règle de saint Benoît, 7 volumes,  (Sources Chrétiennes, 181-186, 7º volume fora de série) (Paris, Cerf, 1972-1977).
[11]           Campbell S.,From Breviary to Liturgy of the Hours (Collegeville, MN, Pueblo Books, 1995, pp. 5-6. 
[12]           Nessa época, o ofício ferial, normalmente mais longo, devia constantemente dar lugar às festas dos santos, geralmente mais breves. O saltério do comum dos santos retornava portanto regularmente, em detrimento da sequência dos salmos distribuídos nos dias da semana. Notemos ainda que os clérigos deviam às vezes preferir um comum dos santos mais breve a um ofício ordinário mais longo.
[13]           Lê-se com interesse nesse tocante o artigo de J.A. Jungmann, «Why was Cardinal Quinonez’ Reformed Breviary a Failure?» dans Public Worship, (London: Challoner, 1957), pp. 200-214.
[14]           Breviarium Romanum ex Decreto SS. Concilii Tridentini restitutum… {4 volumes} (Tournai, Desclée, 1894).
[15]           Campbell, op. cit., pp. 11-14.
[16]Woolfenden G., Daily Liturgical Prayer (Burlington, VT, Ashgate, 2004), p. 201. Veja tambem  Baumstark, Liturgie comparée, op.cit.
[17]           Campbell, op.cit., p. 214.
[18]        Os salmos 57, 82 e 108.
[19]           Os salmos 77, 104 e 105 são reservados aos sábados do Ofício das leituras nos tempos do Advento, Natal, Quaresma e Páscoa.
[20]           De fato, esse corte concerne a todas as edições provenientes da Liturgia Horarum, em latim e em língua vernacular. Devemos mencionar, justiça seja feita, que a edição francesa manteve os versículos imprecatórios entre colchetes, enquanto a edição latina simplesmente os omitiu todos. Quanto aos três salmos de que fala Martimort, eles simplesmente caíram no esquecimento, qualquer que seja a edição.
[21]           Besançon A., La confusion des langues – La crise idéologique de l’Eglise(Calmann-Lévy, 1978)  pp. 123-124.
[22]           Roguet A.M., On nous change la religion (Cerf, 1959)  pp. 91-92.
[23]           LoransA. , A propos du lectionnaire – Se libérer des préjugés faciles, em Lettre à nos frères prêtres, Junho 2008, p. 5.
[24]           Lectionnaire monastique de l’Office divin. A l'usage de l'abbaye Saint-Pierre de Solesmes,  ed. De Solesmes. Tomo I (Paris, Cerf, 1993)  a Tomo VII (Paris, Cerf, 1997).
[25]           Lectures pour chaque jour de l’année, ed. de Solesmes.  Vol. 1 (Paris, Cerf, 1994) a Vol. 4  (Paris, Cerf, 1995).
[26]           Ver p.ex. Storey W., «The Liturgy of the Hours: Cathedral versus Monastery», em: Gallen J. (ed.), Christians at Prayer (Liturgical Studies), Notre Dame e Londres, University of Notre Dame Press, 1977, pp. 61-82.
[27]           Taft, op.cit., p. 306.
[28]           Dentre eles, Herman Schmidt SJ e Juan Mateos SJ, consultores do Concílioa para a execução da Constituição da santa Liturgia. Os artigos de Mateos, «The Origins of the Divine Office» em Worship 41 (1967), pp. 477-485 e «The Morning and Evening Office», em Worship 42 (1963), pp. 31-47, foram escritos originalmente em latim na qualidade de vota submetida ao Concílio.
[29]           Taft, op.cit.,  p. 306.
[30]                 Prétot P., «Se donner des repères pour avancer» em: Célébrer 339, outubro 2005, p. 45.
 

O que a Forma Extraordinária significa para mim

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Encontro-me em circunstâncias privilegiadas em relação à maior parte dos fiéis portugueses. A crise em Portugal obrigou-me a emigrar e, graças a tal, tenho a possibilidade de participar na vetus ordo semanalmente. É sobre a minha vivência da vetus ordo que vos quero falar, sobretudo aos leitores portugueses que, por um motivo ao outro, se vêm privados da FE em terras lusitanas. Desde já o seguinte caveat: não pretendo ser polémico, nem pretendo demonstrar que a novus ordoé pior que a vetus ordo; simplesmente quero apresentar alguns motivos porque esta última me ajuda a viver melhor a nossa Fé. Irei-me focar muito sumariamente em apenas três aspectos. As palavras seguintes serão as minhas opiniões – fruto de meditação, mas mesmo assim opinião, portanto têm o valor que têm.

http://www.effedieffe.com/images/stories/vetus_ordo.jpg


Próprios

Posso contar nos dedos a quantidade de vezes que ao longo dos anos ouvi os próprios nas várias Missas paroquiais em que participei em Portugal. Que existam lugares onde se utilizem, não duvido. É falha da novus ordo? Não, pois os próprios estão lá; se se optam por outros textos, os motivos que levam a tal já me são alheios.
Não existindo a possibilidade de escolher outros textos que não os próprios que vêm no missal (que por sua vez vêm dum livro chamado Graduale), a vetus ordo coloca-nos obrigatoriamente em contacto com estes. Os próprios falam-nos da festa que se está a celebrar, seja dum santo seja duma efeméride. Ajudam-nos a sentir cum Ecclesiae; colocam-nos na boca as palavras através das quais a Igreja entende o acto que se está a concretizar. Devido aos próprios toda a Missa está impregnada das Escrituras; são raros os casos em que os próprios não são textos retirados das Escrituras (os casos excepcionais que me ocorrem de momento nem são no missal romano, mas sim no bracarense).
Os próprios põem-nos em contacto com o Saltério pois são maioritariamente compostos por versos tirados dos Salmos. Enquanto que a exposição principal aos Salmos nas celebrações da novus ordo se dá aquando do Salmo responsarial (porque se opta muitas vezes por ignorar os próprios), na vetus ordo toda a celebração é intercalada com versos dos Salmos. Encontramos os Salmos no Intróito, no Gradual, no Tracto, no Aleluia, no Ofertório e na antífona da Comunhão. É também através dos próprios que a Igreja nos ajuda a interpretar as Escrituras.
Veja-se, por exemplo, o caso dos próprios da primeira Missa do Natal. O Intróito é  Sl 2, 7.1: Dominus dixit ad me: Filius meus es tu; ego hodie genui te. Quare fremuerunt gentes, et populi meditati sunt inania? A Igreja põe estes versos do Salmo 2 na boca de Cristo; dá-lhes uma interpretação cristológica. O Gradual vai buscar o Sl 109, 3.1 Tecum principium in die virtutis tuæ in splendoribus sanctorum: ex utero, ante luciferum, genui te. Dixit Dominus Domino meo: Sede a dextris meis, donec ponam inimicos tuos scabellum pedum tuorum e dá-lhes também uma interpretação cristológica (interpretação essa que já o próprio Jesus tinha dado, como podemos atestar nos Evangelhos). O Ofertório apresenta Sl 95, 11.13 Lætentur cæli, et exsultet terra;
commoveatur mare et plenitudo ejus;  a facie Domini, quia venit
. Mais uma vez a Igreja, utilizando este verso na sua Liturgia, mostra-nos que ele se refere a Cristo e ao Seu nascimento.


Repetição

Umas das coisas que talvez salte à vista (e aos ouvidos) de quem participa pela primeira na vez na Missa segundo a vetus ordo são as repetições. São as vezes que o sacerdote se vira do altar para a congregação; o tríplice bater no peito durante o Confiteor; os vários ósculos que o sacerdote faz ao altar; os vários sinais da cruz; as varias genuflexões;… Apesar da vetus ordo ser o rito menos “floreado” dos ritos latinos (o rito bracarense, como praticamente todo o uso medieval, tem bastante mais “ritual”), é notoriamente mais ritualizado que a novus ordo. Mas porque dar importância às repetições? Não são as repetições maçadoras ou supérfluas? Creio que não; antes pelo contrário, creio que são bastante pedagógicas para o crente que participa na Missa e ajudam melhor a entrar no mistério. Acredito que quem esteja atento ao que se passa durante a celebração é levado a questionar-se sobre o porquê da repetição de certos gestos e palavras. A Igreja, na sua sabedoria, instrui os seus filhos através da repetição. Estas repetições de gestos e palavras são, entre outras coisas, chamadas de atenção; obrigam-nos a focar no que se está a fazer ou chamam-nos de volta se por acaso nos tenhamos distraído. Quantas vezes não me distraí após o Pater Noster e é a segunda ou terceira repetição de Domine non sum dignus que sou chamado de volta à realidade. Nenhum gesto é supérfluo; tudo tem o seu significado e cabe a nós descobri-lo e apropria-lo ao invés de ceder a soberba e dizer “não entendo a razão de ser disto, logo deve estar errado”. Diz Origenes que o corpo é ícone da alma, portanto a postura e os gestos fazem parte da oração. Os Padres da Igreja dão testemunho de como o corpo é importante na oração (os Nove Modos de Orar de S. Domingos atestam a este facto); de facto a vetus ordo acaba por envolver mais a corporalidade da oração através de gestos que já nos vem de tempos remotos.

Participação

Após regressar a Igreja ouvi falar muito de participação activa e era bombardeado com opiniões contraditórias do que isso significaria.
Foi sobretudo o frequentar a vetus ordo que me ensinou a participar na Liturgia, seja em que rito ou forma for. Participação activa no seu sentido mais pleno é participar na Paixão de Cristo, completando o que falta nas Suas tribulações (cf Col 1, 24). Assistir a Missas solenes ajudou bastante para esclarecer qual o papel dos leigos na Missa (uso aqui a palavra assistir não no sentido de espectador, como é usual entender-se quando se critica que “não se assiste à Missa”, mas no sentido de quem ajuda, de quem dá apoio, que é o verdadeiro sentido). Para quem assiste pela primeira vez a uma Missa solene, parecerá certamente tudo uma confusão. Estão várias coisas a acontecer ao mesmo tempo: o sacerdote e os seus ministros estão a rezar orações que lhes são próprios, o coro está a cantar algum dos próprios da Missa do dia, os leigos estão a fazer alguns gestos (ou até a acompanhar o coro se souberem) ou estão “apenas” receptivos, atentos ao que se passa. Mas o que é à primeira vista uma confusão revela-se de facto uma sinfonia. Cada grupo está a exercer o seu munus, cada qual tem o seu papel a desempenhar na Liturgia.
Inicialmente seguia tudo pelo missal. E apesar de ainda recorrer por vezes ao missal (sobretudo para ver os próprios), com o passar do tempo tenho-me familiarizado mais e mais com a estrutura da Missa em si. A familiarização com a estrutura da Missa ajuda a que eu junte as minhas orações pessoais às do sacerdote nos momentos em que os leigos nada têm a responder durante a Missa. Vou aprendendo a trazer para a Liturgia a minha vida, a oferecê-la aquando do Ofertório para que aquilo que o sacerdote, através de Cristo, realiza ao oferecer o pão e vinho se venha a realizar em mim, para que o Cristo que se torna presente sobre o altar se vá tornando presente em mim. Nas orações do Canon junto as minhas intenções às do sacerdote, para que ele as apresente sobre o altar. 

http://stlouisreview.com/sites/default/files/article-images/137252/LatinMass0312.jpg


Termino por aqui este breve resumo, deveras incompleto, da minha participação na vetus ordo. Teria muito mais a dizer sobre outros aspectos, mas creio que outros já o terão dito e melhor do que eu alguma vez o poderia dizer. Desejo apenas que este testemunho acenda nalgum leitor português o desejo de descobrir o seu património litúrgico, de não o descartar logo a partida, e qual pai de família aprenda a tirar deste tesouro coisas novas e velhas.

Ajude o Instituto Cristandade, comprando os Paramentos Imaculada Conceição

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Recebemos o e-mail abaixo e publicamos para os amigos, para que ajudem.

"Olá, Salve Maria!

Através desse email quero expressar minha gratidão ao apostolado virtual Salvem a Liturgia que muito tem ajudado a Igreja Católica. Desejo que Nossa Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil abençoe esse blog hoje e sempre.

Também gostaria de pedir a ajuda de uma publicação sobre uma moça que está fazendo paramentos litúrgicos aqui em Presidente Prudente, SP.  A loja se chama Paramentos Imaculada. A responsável pela confecção é nossa amiga Aline Pomin, do Instituto Cristandade, que, mesmo muito doente, com dedicação aprendeu a confeccionar vestes para a Liturgia. Não possuindo uma máquina para bordar está bordando à mão.

Ela me pediu para enviar esse email este foi seu comentário a mim:  "Comecei a confeccionar os paramentos com o intuito de ajudar a Igreja Católica e de ajudar o Instituto Cristandade. Tenho como objetivo ajudar a manter a Tradição através da beleza dos paramentos."


Marlon Victor

Contatos: Página do Facebook: Paramentos Imaculada Conceição: https://www.facebook.com/pages/Paramentos-Imaculada-Concei%C3%A7%C3%A3o/803277359739453?fref=ts
telefone: (18) 98173-3670 -  Aline Pomin"

Orai sem cessar III

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6. Hora na presença do Santíssimo Exposto
A exposição do Santíssimo Sacramento se pode fazer de dois modos: solene e simples. Para a exposição solene usa-se o ostensório e se acendem quatro ou seis velas e se deve fazer incensação. Na simples, que se faz com cibório, acendem-se pelo menos 2 velas e o incenso é opcional. Pode-se celebrar qualquer hora litúrgica na presença do Santíssimo Sacramento exposto, com qualquer grau de solenidade; todavia algumas celebrações são mais apropriadas, mormente se se pretende dar a bênção com o Santíssimo Sacramento, por exemplo Laudes ou Vésperas celebradas solenes. Essas celebrações explicaremos com maiores detalhes.

A celebração inicia como de costume, se o Santíssimo já estiver exposto, a uma considerável distancia do presbitério o Bispo depõe a mitra, o solidéu e o báculo, que passa a ser carregado à sua frente; chegando ao presbitério faz genuflexão, não beijam o altar e seguem para seus lugares. Inicia-se a celebração como de costume. Se não estiver ainda exposto o Sacramento, aproximam-se do presbitério e faz a devida reverência, beija-se o altar. Todos se ajoelham, inicia-se o hino eucarístico. Estando a reserva eucarística no próprio altar, abre-se o sacrário, genuflete-se e coloca-se o Santíssimo Sacramento no ostensório. Se o sacrário estiver em uma capela própria, o sacerdote ou um diácono, munido de véu umeral branco a transporta até o altar da exposição, a coloca no ostensório e gunuflete. A seguir, de joelhos, incensa-se o Santíssimo Sacramento. Durante a exposição canta-se um canto eucarístico. Uma vez exposto o Santíssimo, inicia-se a hora.



A celebração se faz como de costume, todavia o Bispo não usa mitra ou solidéu durante toda a cerimônia. No cântico evangélico, durante o qual se incensaria a cruz, o altar, o sacerdote e o povo, seguindo o que era realizado no rito antigo, nas missas que se celebrava na presença do Santíssimo exposto e as instruções de Mons. Peter Elliott, procede-se a incensação do Santíssimo de Joelhos, em substituição à incensação da cruz, e a seguir a incensação do altar, genufletindo cada vez que se passa diante do ostensório. Esse modelo remonta à celebração da missa in coram sanctissimo existentes na forma extraordinária do Rito.

Ao fim da hora, se se vai conceder a bênção com o Santíssimo Sacramento, omite-se a bênção costumeira. Procede-se ao canto do Tão Sublime Sacramento ou outro canto eucarístico do ritual, todos de joelhos, o celebrante à frente do altar. Seis acólitos com tochas (ou castiçais), além do turiferário, naveteiro e, se possível um diácono se põem dirante do altar de joelhos, como na consagração da Santa Missa. Terminado o canto, o sacerdote ou diácono levanta-se para a oração, enquanto os demais permanecem de joelhos. Toma, então o santíssimo com o véu umeral branco e traça o sinal da cruz sobre os fiéis, se for sacerdote ou diácono, uma única cruz; se for Bispo três cruzes: à esquerda, ao centro e à direita. Durante a bênção eucarística, toca-se o sino. Depois podem-se fazer as preces de ação de graças, como de costume. 

Se o santíssimo for reposto em seguida, procede-se como para a exposição, levando-o de volta ao sacrário. O Bispo retoma o solidéu, a mitra e o báculo. Se a exposição permanecer, o Bispo permanece sem solidéu, mitra e báculo, que é levado à sua frente, e só os retomará a uma boa distância do altar da reposição. Um diácono ou sacerdote despede o povo. Por fim, faz-se o recessional em direção à sacristia.


7. Relação da Liturgia das Horas com a Missa
A relação do ofício divino com a Santa Missa é bastante estreita. A começar pelos horários, a Santa Missa só se pode celebrar depois de rezadas as Laudes; da mesma forma, só se diz Missa do domingo ou solenidade depois que se celebrou as I Vésperas deste ofício. Cabe ao ofício divino "inaugurar" o ofício do dia. O próprio da Santa Missa, salvo nas missas votivas e para diversas necessidades, será sempre relativo à Liturgia das Horas. Por exemplo, se se celebra em determinado dia a festa de um santo, se dirá o ofício do santo e também a missa dele com mesmo grau de solenidade, no exemplo, festa.

 Permite-se unir a o ofício das leituras com uma das horas (antepondo sempre o ofício à outra hora), omite-se a oração e conclusão da hora que precede e o versículo introdutório da hora que sucede. Existe, neste mesmo sentido, rubricas que permitem unir uma hora canônica à Santa Missa, todavia pela "mescla" entre os ritos que se faz, as supressões e a mistura da liturgia das horas com a liturgia sacramental, vemos essa união como pouco adequada. Sendo mais lógico que se façam duas celebrações diversas, como acontece nos cabidos das basílicas romanas e na grande maioria dos seminários.



8. Conclusão

A estrutura das horas, como escolher os textos e alguns detalhes da celebração comunitária e solene, embora tenhamos tentado apresentar de uma maneira organizada e sucinta, pode ainda parecer extremamente confusa para quem não tem o hábito de rezá-las. Não existe nenhuma maneira melhor para aprender do que rezando. Um religioso, uma religiosa, um sacerdote ou mesmo um leigo que tenha o hábito de rezar porá ser um bom orientador, fornecendo indicações e sanando dúvidas.  Permaneçamos juntos com a Igreja e perseverantes na oração para sermos mais perfeitamente "uma só corpo e um só espírito".




 Veja também:

Orai sem cessar I
Orai sem cessar II


O Pentecostes. Festa restaurada ou cortada? - Pe. Jean-Pierre Herman

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Publicamos um artigo sobre a Vigília de Pentecostes que nos foi encaminhado pelo Pe. Jean-Pierre Herman. Infelizmente não consegui publicá-lo ainda durante a Oitava de Pentecostes, contudo, tenho certeza que será do agrado de nossos leitores.

O Pentecostes: Festa restaurada ou cortada? 

Por Pe. Jean-Pierre Herman
Originalmente publicado em Schola Sainte Cécile 
Tradução: Pe. Jean-Pierre Herman / Daniel Pereira Volpato


O Missal promulgado por Paulo VI em 03 de abril de 1969 praticamente eliminou as antigas vigílias e oitavas para as principais festas.

As oitavas são agora limitadas à Páscoa e ao Natal. Quanto às vigílias, permanece, para algumas festas, uma "Missa à noite anterior", que muitas vezes passa despercebida nas paróquias. É uma antecipação da festa e não mais um dia de jejum e preparação para a ela.

A Missa da Vigília de Pentecostes é um caso especial. Ela oferece a opção de quatro textos para a primeira leitura. São textos do Antigo Testamento que preparam para o dom do Espírito Santo. Isso é tudo o que resta da antiga e rica liturgia da vigília de Pentecostes. 

A "desmontagem" da liturgia de Pentecostes foi feita em duas etapas. A vigília caiu durante a reforma dos anos 50, e a oitava foi abolida durante a promulgação do novo missal.

A antiga Vigília de Pentecostes e seu carácter batismal

Monsenhor Gromier, em uma palestra famosa em ambientes tradicionais sobre a liturgia dita "restaurada" da Semana [Santa] por  Pio XII em 1955 [1], afirma:
A vigília de Pentecostes não possui mais nada de batismal, se transformou em um dia como qualquer outro, e fazendo mentir o missal no cânon. Esta vigília era um vizinho chato, um rival formidável! A posteridade educada será provavelmente mais severa do que a visão atual com relação à pastoral. [2]
Ele está se referindo aqui à recuperação próxima da vigília batismal de Páscoa pelos cristãos, praticada desde os tempos antigos na véspera de Pentecostes.

Os cristãos primitivos celebravam primeiramente todo o Mistério Pascal: morte, ressurreição, ascensão e o dom do Espírito Santo durante a grande noite da Páscoa. No entanto, muito rapidamente, o ensinamento da Igreja destacou os diferentes aspectos dela, quebrando as celebrações de acordo com a cronologia dos evangelhos.

Por outro lado, sabemos que os sacramentos da iniciação cristã: batismo, confirmação e Eucaristia, eram anteriormente atribuídos aos candidatos durante a mesma celebração, uma prática mantida pelas igrejas orientais. Cito o cardeal Schuster sobre a ligação intrínseca e ao mesmo tempo distinta entre Batismo e Confirmação:
Embora o sacramento do Batismo seja distinto do da Confirmação, ele recebe esse nome porque a descida do Espírito Santo na alma do fiel completa a obra de sua regeneração sobrenatural. Através do caráter sacramental, é conferido ao neófito uma mais perfeita semelhança com Jesus Cristo, que imprime o último selo ou confirmação à sua união com o divino Redentor. A palavra confirmação era também utilizada na Espanha para indicar a oração invocatória do Espirito Santo durante a missa: Confirmatio sacramenti; também a analogia existente entre a epíclese (que na missa, pede ao Paráclito a plenitude de seus dons sobre aqueles que se aproximam da Santa Comunhão) e a Confirmação, que os antigos administravam imediatamente após o batismo, esclarece o profundo significado teológico que está escondido sob o vocábulo “Confirmação” atribuído ao segundo sacramento. [3]
Tertuliano já fala da celebração dos batismos, não só na grande vigília de Páscoa, mas também para o Pentecostes:
Outro dia solene do batismo é Pentecostes, quando acontece um longo intervalo de tempo para dispor e educar aqueles que devem ser batizados.
A escolha não é inocente, porque no batismo, o bispo coloca sua mão direita sobre a cabeça do neófito, chamando o Espírito Santo por meio de uma bênção. [4]

Temos também uma carta do Papa Siricius (384-399) [5] ao bispo de Tarragona Himera atestando essa prática. Além disso, em uma carta aos bispos da Sicília, o Papa São Leão Magno (440-461) exorta-os a imitar São Pedro, que batizou três mil pessoas no dia do primeiro Pentecostes. [6]

Os livros litúrgicos posteriores nos dão um diagrama de uma celebração do mesmo tipo da Vigília Pascal, que encontramos em todos os missais que precederam a reforma de Trento e no Missal de São Pio V até a reforma da década de 1950.

Vamos deixar a Dom Guéranger o cuidado de descrever essa prática:
Nos tempos antigos, esse dia se assemelhava a véspera da Páscoa. Na noite os fiéis iam para a igreja para participar nas solenidades da administração do batismo. Na noite que se seguia, o sacramento da regeneração era conferido aos catecúmenos cuja ausência ou alguma doença os tinham impedido de se juntar aos outros na noite de Páscoa. Aqueles que ainda não tinham sido considerados suficientemente aprovados, ou cuja educação não parecia completa, tendo satisfeito as justas exigências da Igreja, também ajudavam a formar o grupo de aspirantes ao novo nascimento que se recebe a partir da fonte sagrada. Em vez das doze profecias que se liam à noite de Páscoa, enquanto os sacerdotes executavam os ritos preparatórios aos catecúmenos para o batismo, eles costumavam ler seis; Isto leva à conclusão de que o número de batizados na noite de Pentecostes era menos considerável. [7] 
O círio pascal reaparecia durante esta noite de graça, para educar o novo recruta o que fazia a Igreja, respeito e amor pelo Filho de Deus que se fez homem para ser "a luz do mundo”. Todos os rituais que temos descrito e explicado no Sábado Santo se realizavam nesta nova oportunidade, onde aparecia a fecundidade da Igreja, e o Divino Sacrifício do qual tomaram parte os felizes neófitos começava ainda antes do amanhecer. [8]

Nos tempos antigos, como relata Schuster, a celebração, junto com a Vigília Pascal, se fazia no Latrão durante a noite de sábado para domingo. No século XII foi antecipada para o início da tarde. Pelo fim do dia, o Papa então ia para São Pedro, para o canto das Vésperas e Matinas solenes. A extensão da celebração do batismo a outros dias e a prática do batismo infantil quam primum removeram a exclusividade destas celebrações na véspera de Pentecostes, reduzindo esse dia ao grau de preparação para a festa, mesmo grau das demais vigílias, mas mantendo na celebração um caráter claramente batismal.

Como apresentou Pio Parsch:
“Hoje é uma vigília solene e, portanto, de penitência completa, com jejum e abstinência (em algumas dioceses, no entanto, esta obrigação não se impõe mais com a pena do pecado; isso não é mais do que um simples conselho). A vigília é sempre um dia de preparação. A casa da alma deve ser limpa e preparada para a grande festa. Dois pensamentos ocupam o cristão que vive com a Igreja: a) ele se lembra de seu batismo; b) ele se prepara para Pentecostes.” [9]

Tempo e Estrutura da Vigília

Depois das nonas, lemos as profecias sem título, com as velas apagadas, assim como no Sábado Santo.

Esta é a rubrica que antecede a celebração da Vigília de Pentecostes nos missais. O seu tempo é o mesmo que o da vigília pascal. Anteriormente celebrada na noite de sábado para domingo, em seguida, no início da tarde, ele caiu dentro do âmbito do decreto de São Pio V, que impôs a antecipação dos ofícios ao amanhecer. A Vigília de Pentecostes, portanto, é celebrada na manhã de sábado.

Sua estrutura é semelhante ao do Sábado Santo, com a exceção da bênção do fogo e do Círio Pascal. Pius Parsch chama-lhe uma imitação abreviada do Sábado Santo. Ela começa pelas leituras das profecias, cada qual seguida de uma resposta e uma oração pelo celebrante, que é precedido por um convite do diácono: Oremus. Flectamus genua.

Depois, partimos em procissão até o batistério com a bênção da água, cantando versos do Salmo 41 (Sicut Cervus ad fontes aquarum). Depois de uma oração, o celebrante diz a oração de bênção da água, como na Vigília Pascal. Em seguida, retornamos para o altar em procissão cantando a Ladainha dos Santos, enquanto os celebrantes vão para a sacristia, a fim de revestir os paramentos para a Missa. [10]

A cor da vigília é o roxo. É especificado que o sacerdote utilize a capa de asperges para a procissão para o fonte batismal. O diácono e subdiácono levam a casula plicada (dobrada). A missa é em vermelho, a cor de Pentecostes.

No final das ladainhas, acendem-se as velas, os ministros vão para o altar enquanto o coro canta o Kyrie, eles recitam as orações ao pé do altar e o sacerdote incensa e entoa o Glória, durante o qual se tocam os sinos. [11]


Plano Da Vigília de Pentecostes

Proclamação das seis profecias:
Leitura + resposta + Flectamus genua + Oração
Procissão a pia batismal
Salmo 41
Bênção da Água
Procissão até o altar
Ladainha dos Santos
Missa


As Profecias

No rito primitivo havia doze leituras, como na Páscoa. Este número foi reduzido para seis por São Gregório Magno, e foi assim mantida até o século VIII, quando, sob a influência do Sacramentário Gelasiano, devolvemos à Vigília Pascal suas leituras originais.

As leituras de Pentecostes são tiradas da Páscoa, mas em uma ordem diferente.

Leitura
Pentecostes
Páscoa
1
Gn. 22 Sacrifício de Abraão
3
2
Ex 14 e 15 A passagem do Mar Vermelho
4
3
Dt 31 O Testamento de Moisés, o cumprimento da Lei
11
4
Is 4 A libertação de Jerusalém
8
5
Bar 3 O retorno à Terra Prometida
6
6
Ez 37 ossos secos
 7

A cada leitura se segue um responso.  Três desses são os mesmos que na Vigília pascal. As orações que se seguem, no entanto, são diferentes, retiradas do Sacramentário Gregoriano [12].

Elas reforçam, a sua própria maneira, a continuidade entre os dois Testamentos, e entre a passagem do Israel do Antigo Testamento, liberto da escravidão, ao novo Israel, de pessoas batizadas, libertas do pecado. Citamos aqui apenas aqueles que seguem a segunda e a quarta leitura, que são admiráveis:
“Deus, Vós revelastes pela luz da Nova Aliança o significado dos milagres realizados nos primeiros tempos: o Mar Vermelho tornou-se a figura da fonte sagrada do batismo, e as pessoas libertados da escravidão no Egito expressam os mistérios do povo cristão: fazei com que todas as nações que receberam pelo mérito da fé o privilégio de Israel sejam regeneradas através da participação em seu Espírito”. 
“Deus eterno e Todo-Poderoso, Vós tendes mostrado através de seu Filho unigênito que Vós sois o jardineiro de sua Igreja, misericordiosamente cuidador de todos os ramos frutificados em seu Cristo, que é a videira verdadeira, para que produzam mais frutos: fazei que os espinhos do pecado não sobrepujem vossos fiéis, que libertastes do Egito como uma vinha pela fonte do batismo; e que, fortalecidos pela santificação do Vosso Espírito, sejam enriquecidos por uma colheita sem fim”.
A descida para a pia batismal e a bênção da água, após a oração da sexta profecia, reutiliza todos os textos da Vigília Pascal, com exceção da coleta que precede a bênção da água, a qual fala da festa do dia:
“Concedei, nós vos rogamos, Deus Todo-Poderoso: nós, que celebramos a solenidade dos dons do Espírito Santo, que inflamados dos desejos celestes, tenhamos sede da fonte da vida.”
Vemos claramente, através destes textos, a íntima conexão entre o batismo, o dom do Espírito Santo e vida cristã.

Missa

Como vimos, a missa segue imediatamente a Ladainha. Como à Páscoa, não há Introito.  Só mais tarde, quando se espalhou o uso de missas privadas, que se acrescentou o Intróito "Cum sanctificatus”, emprestado da quarta-feira da quarta semana da Quaresma.

É o ápice da Vigília e reitera de uma maneira muito concisa a conexão entre o batismo e o dom do Espírito Santo em sua coleta:
Fazei, nós vos rogamos Deus Todo-Poderoso, que o esplendor de Vossa luz brilhe sobre nós; e o brilho de Vossa luz confirme, pela iluminação do Espírito Santo, os corações daqueles que Vossa graça tem revivido. Por Nosso Senhor...
Esta ligação é enfatizada ainda mais na carta dos Atos dos Apóstolos [13]. Trata-se do encontro de Paulo com os discípulos de João Batista.  Eles sequer tinham ouvido falar que há um Espírito Santo, depois do que Paulo batiza-os em nome de Jesus Cristo.

O resto da Missa é inteiramente centrada em Pentecostes, com o Evangelho [14] em que Jesus prometeu a seus discípulos que não os deixaria órfãos, mas que deviam orar ao Pai para que Ele enviasse o Consolador.

A Secreta e a Pós-comunhão pedem a purificação dos corações por meio do derramamento do Espírito Santo.

A oração do Canon contém duas partes próprias.  No Communicantes menciona-se a festa do dia:
“Unidos em uma comunhão e celebrando o santo dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo apareceu aos Apóstolos sob a forma de múltiplas línguas de fogo, e venerando primeiro a memória da gloriosa Virgem Maria, Mãe de Jesus Cristo nosso Deus e Senhor (...)”
Enquanto o Hanc igitur, como na Páscoa, reza pelos batizados da noite:
“Então, Senhor, este sacrifício que nós oferecemos, e com todos os seus filhos, hoje especialmente para aqueles que vós vos dignastes a regenerar pela água e pelo Espírito Santo, concedendo-lhes a remissão de todos os seus pecados...”

A reforma de 1955

Nos missais após 1955, a Vigília de Pentecostes é agora reduzida a missa, como descrito acima, com o seu Intróito "Cum sanctificatus”. As profecias, a procissão e a bênção da água foram simplesmente abolidos.

O caráter batismal da vigília foi apagado e a liturgia é inteiramente direcionada para a vinda do Espírito Santo.

Mantivemos a letra, que faz a conexão entre os dois sacramentos. Mas pode-se perguntar por que mantivemos o Hanc igitur que intercede pelos batizados da noite. E isto para a Vigília, dia e Oitava de Pentecostes, como era feito na Páscoa.

Esta oração já era simbólica antes da reforma, já que quase nunca havia batismos durante a celebração. No entanto, ela alargava o caráter batismal da vigília e [por isso] manteve seu lugar. Sua conservação aqui [após 1955], isola-a do resto da celebração e a reduz, mais do que antes, a um simples vestígio.

O missal de 1969

O Missal de 1969 inclui, como já dissemos acima, uma "Missa da noite." É uma missa de antecipação de Pentecostes que, apesar de uma ou outra oração mantida, está longe de ser a antiga vigília.

A antífona de abertura não é mais o velho Intróito "Cum sanctificatus", mas uma citação de Romanos 5.5: O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Seu Espírito que habita em nós, aleluia.

O aspecto batismal não é mais explicitamente mencionado e a ênfase é sobre a vinda do Espírito Santo e o encerramento do Tempo Pascal.

A antiga coleta foi mantida, mas é uma alternativa a outra, que está listada em primeiro lugar. Isto é, aparentemente, uma nova composição:
“Deus Todo-Poderoso e eterno, Vós quisestes que a celebração do mistério pascal crescesse durante estes 50 dias de alegria; fazei que as nações e os povos espalhados se reúnam apesar da divisão linguística para confessar juntos o teu nome. Jesus ...”
Esta é uma alusão a Babel, à divisão de linguagem, e à leitura Do dia seguinte, dos Atos, onde todos entendem na sua própria língua a pregação dos Apóstolos.

A peculiaridade desta Missa, única no missal, é uma escolha entre quatro textos como primeira leitura:
  • Gênesis 11, 1-9: A torre de Babel 
  • Êxodo 19, 3-20: Deus se manifestou no fogo, no meio de seu povo 
  • Ezequiel 37, 1-14: Os ossos secos 
  • Joel 3, 1-5: O Espírito vem habitar em todos os homens

À parte do texto de Ezequiel, todos os outros são diferentes das profecias da antiga vigília.
A continuação da Liturgia da Palavra é fixa: 
  • Salmo 104, 1: Senhor envie o seu Espírito e renovai a face da terra! 
  • Romanos 8, 22-27: O Espírito nos ajuda em nossa fraqueza 
Quanto ao evangelho, manteve-se Jo 7, 37-39: Jesus promete o Espírito aos crentes

O communicantes próprio da Oração Eucarística I é o do antigo missal:
“Na comunhão de toda a Igreja, celebramos o santo dia de Pentecostes, quando o Espírito Santo se manifestou aos Apóstolos em inúmeras línguas de fogo; e nós queremos mencionar primeiro a bem-aventurada sempre Virgem Maria, Mãe de Deus e nosso Senhor Jesus Cristo ...”
A mesma fórmula, adaptada, também é transferida para as outras orações eucarísticas e, portanto, à Oração III:
“É por isso que estamos aqui reunidos na vossa presença e na comunhão de toda a Igreja, celebramos o santo dia  Pentecostes, quando o Espírito Santo se manifestou aos Apóstolos em inúmeras línguas de fogo. Deus Todo-Poderoso, nós vos imploramos consagrar as ofertas que trazemos ...”
Há logicamente mais menções de batizados no Hanc igitur ou seu correspondente nas novas orações.

A Oração sobre as Oferendas e a Oração Após a Comunhão referem-se frequentemente ao Espírito:
“Nós oramos, Senhor, derramai a bênção de Vosso Espírito em nossas ofertas; que Vossa igreja receba essa caridade que fará brilhar no mundo a verdade de sua salvação.”
E
“Senhor, que esta comunhão nos seja aproveitável, fazendo-nos viver do fervor do Espírito Santo com o qual Vós preenchestes vossos apóstolos maravilhosamente.”

Quanto à Antífona da Comunhão, ela é tirada do Evangelho:
“O último dia da festa, Jesus levantou-se e gritou: ‘Se alguém tiver sede, venha a mim e beba’ Aleluia.”
É de se perguntar por que a seqüência da frase, " Quem crê em mim", não foi adicionada.

Continuidade ou ruptura?

"A obrigação de rever e enriquecer as fórmulas Missal Romano foi sentida. O primeiro passo dessa reforma foi o trabalho de nosso predecessor Pio XII, com a reforma da Vigília Pascal e do rito da Semana Santa. Esta é a reforma que deu o primeiro passo para a adaptação do Missal Romano à mentalidade contemporânea”. Assim se expressa Paulo VI na Constituição Apostólica Missale Romanum [15].
Nós sempre voltamos para a mesma pergunta: as alterações desde os anos 50, e então durante a reforma litúrgica, são elas continuidade lógica e histórica do antigo rito romano-franco ou elas marcam uma ruptura?

Aqui vemos uma prática antiga completamente abolida. Esta eliminação, assim diz Mons. Gromier, remove todo o caráter batismal deste dia e centra-o na vinda do Espírito Santo.  Provavelmente era o objetivo dos membros da Comissão insistir sobre o batismo na Páscoa e sobre a confirmação em Pentecostes, através do dom do Espírito Santo.

No entanto, a Missa foi conservada, ainda que contenha elementos que lembram a vigília. Isto é, no mínimo, uma inconsistência. A "restauração" dos anos 50, aqui, nada restaurou. Não há necessidade de grande erudição para se perceber que esta reforma foi realizada às pressas e descobrir nela muitas inconsistências.

Quanto à forma de 1969, ela é, como já mencionado, uma nova criação. Atualmente a maioria das dioceses organizam uma "Vigília de Pentecostes”, às vezes com a Missa da Vigília, frequentemente com o sacramento da Confirmação, mas com largo espaço para "criação" e "criatividade" devido à falta de orientações suficientes da parte do Missal.

Longe do “desenvolvimento orgânico” [16] querido pelo Padre Reid, devemos, mais uma vez, ver a falta de lógica e continuidade nos trabalhos das comissões. Neste caso, muita coisa foi removida, deixando um vácuo e criando um amplo espaço para a improvisação. Talvez mais do que em qualquer outro dia do ano litúrgico, as práticas da Vigília de Pentecostes nos diferentes lugares – dioceses e paróquias -, mostram uma diversidade que é uma lembrança de uma das leituras oferecida a escolha dos celebrantes: a de Babel.

Bibliografia

  • SCHUSTER, I., Liber Sacramentorum. Notes historiques et liturgiques sur le Missel romain. Tome IV : Le baptême dans l’Esprit et dans le feu (la Sainte liturgie durant le cycle pascal). Bruxelles, 1939.
  • GUERANGER P., L’année liturgique, Tome ii: Le Temps pascal, Mame & Fils, Paris, 1920,
  • PARSCH, P., The Church’s Year of Grace, Liturgical Press, Collegeville, 1953.
  • REID A., The Organic Development of the Liturgy, St Michael’s Abbey Press, Farnborough 2004

Notas



[3] Schuster, I., Liber Sacramentorum. Notes historiques et liturgiques sur le Missel romain. Tome IV : Le baptême dans l’Esprit et dans le feu (la Sainte liturgie durant le cycle pascal). Bruxelles, 1939.

[4] Tertuliano, De Baptismo 8, 1.

[5] Epist. ad Himerium cap. 2 : Patrologia Latina vol. XIII, col. 1131B-1148A

[6] Epist. XVI ad universos episcopos per Siciliam constitutos : P.L. LIV col. 695B-704A

[7] Durante a leitura das profecias do Sábado Santo, os sacerdotes terminavam os ritos de preparação dos catecúmenos ao Batismo, o que tomava um certo tempo.  Daí o comentário de Dom Guéranger sobre a relativa brevidade das profecias.

[8] GUERANGER P., L’année liturgique, Tome ii: Le Temps pascal, Mame & Fils, Paris, 1920, p. 260

[9] PARSCH, P., The Church’s Year of Grace, Liturgical Press, Collegeville, 1953.

[10] A rubrica especifica: nos lugares onde não há pia batismal, depois da sexta profecia com sua oração, o celebrante tira a casula e se prosterna com os ministros diante do altar.  E, estando ajoelhados todos os outros, cantam-se as ladainhas.  São cantadas por dois cantores no meio do santuário, as dois coros respondem juntos.  Ao verso Peccatores, te rogamus o padre e os ministros levantam-se e vão à sacristia, e vestem paramentos vermelhos.

[11] Citamos novamente a rubrica: Ao fim das ladainhas, canta-se o Kyrie Eleison para a missa, repetindo-o conforme o costume.  Durante esse tempo o celebrante e os ministros vão para o altar e fazem a confissão. Ao fim do Kyrie Eleison se entoa o Gloria in excelsis Deo e tocam-se os sinos.

[12] Esse documento, catalogado Codex Regina 337, foi recentemente publicado pela Biblioteca Vaticana. É um manuscrito do século VIII que descreve a liturgia papal em Latrão, depois da organização da liturgia pelo Papa São Gregório Magno e seus sucessores, até o tempo do papa Adriano I (+795), que enviou o manuscrito ao imperador Carlo Magno a fim de estabelecer a liturgia romana em todo o seu império. O Codex Regina 337 foi analisado por H.A. Wilson no livro The Gregorian sacramentary under Charles the Great, publicado pela Henry Bradshaw Society em Londres em 1915.

[13] Atos 19, 1-8.

[14] João, 14, 15-21.

[15] 03 de abril de 1969.

[16] Alcuin Reid OSB, The Organic Development of the Liturgy, St Michael’s Abbey Press, Farnborough 2004.

Palavra e Silêncio

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"O silêncio, portanto, não é um fim em si mesmo; não gera mais silêncio, mas produz fruto, que é a palavra, favorecendo o colóquio da alma com Deus. Daí que se pode dizer que o silêncio realça a Palavra."


Passamos recentemente por mais um setembro, mês dedicado às Sagradas Escrituras pela Igreja no Brasil. Neste contexto, por mais estranho que possa parecer, é muito apropriado falarmos sobre o silêncio.

No mundo hodierno vivemos constantemente bombardeados por estímulos artificiais, principalmente visuais e sonoros. São outdoors amontoados, construções arquitetônicas desconexas do seu redor, televisores constantemente ligados em nossas casas, veículos automotivos, músicas com ritmos frenéticos, etc. Todos estes estímulos causam em nosso íntimo uma sensação de desordem, de falta de harmonia, que nos dificulta - e muito! - o recolhimento interior e a reflexão sobre aquelas questões essenciais ao homem e a nossa vida terrena.

A situação chegou em tal ponto que a maioria dos homens têm um certo medo do silêncio. Basta pensarmos no televisor ligado na sala para gerar ruído, sem que ninguém o esteja assistindo. Ou nos fones de ouvido que muitas pessoas usam ao andar nas ruas, num momento que seria propício para a reflexão interior, para, como se diz, colocar o pensamento em dia, por mais que o ambiente exterior continue rodeado destes estímulos. Não que o uso de fone de ouvido na rua seja de todo ruim; pelo contrário, ouvindo uma boa música (calma, independentemente do gênero) conseguimos eliminar muito destes ruídos externos que causam harmonia e desordem. Mas os homens, em geral, parecem acreditar que silenciar é perder tempo, e então procuram subterfúgios para evitá-lo a todo custo.
"No silêncio, escutamo-nos e conhecemo-nos melhor a nós mesmos, nasce e aprofunda-se o pensamento, compreendemos com maior clareza o que queremos dizer ou aquilo que ouvimos do outro, discernimos como exprimir-nos. Calando, permite-se à outra pessoa que fale e se exprima a si mesma, e permite-nos a nós não ficarmos presos, por falta da adequada confrontação, às nossas palavras e ideias." (Papa Bento XVI. 46º Dia Mundial das Comunicações Sociais)
São Bento, ao falar do silêncio, faz uma distinção entre quies e silentium: o primeiro é a ausência de ruídos, a quietude, o silêncio físico; o último é um estado da mente, duma consciência atenta, voltada para os outros e para Deus. O homem de hoje, movido principalmente pela falta de quies, perdeu a capacidade do silentium, que tão desconhecido lhe é a ponto de causar-lhe medo.



Tenho por certo que nesta pouca quietação do homem moderno encontra-se uma das principais causas de sua enorme dificuldade em buscar o transcendente. Recordemo-nos da experiência do Profeta Elias, a quem Deus manifestou-Se não na força ou no ruído, mas na brisa suave:
11. O Senhor disse-lhe: Sai e conserva-te em cima do monte na presença do Senhor: ele vai passar. Nesse momento passou diante do Senhor um vento impetuoso e violento, que fendia as montanhas e quebrava os rochedos; mas o Senhor não estava naquele vento. Depois do vento, a terra tremeu; mas o Senhor não estava no tremor de terra.
12. Passado o tremor de terra, acendeu-se um fogo; mas o Senhor não estava no fogo. Depois do fogo ouviu-se o murmúrio de uma brisa ligeira.
13a. Tendo Elias ouvido isso, cobriu o rosto com o manto, saiu e pôs-se à entrada da caverna. (I Reis XIX - Bíblia Ave Maria)
Se a oração é o colóquio da alma com Deus, e toda conversação exige tanto momentos de fala como de escuta (silêncio), uma alma que não silencia torna-se incapaz de ouvir a Deus. 
“Para que as coisas possam guardar-se no interior e ser ponderadas no coração, é condição indispensável guardar silêncio. O silêncio é o clima que torna possível o pensamento profundo. Quem fala demasiado dissipa o coração e leva-o a perder tudo o que há de valioso no seu interior; assemelha-se então a um frasco de essência que, por estar destapado, perde o perfume, ficando apenas com água e um ligeiro aroma a recordar vagamente o precioso conteúdo de outrora” (SUÁREZ, Federico. A Virgem Nossa Senhora, Ed. Quadrante, pág. 185)
Infelizmente, no momento da história em que a humanidade menos silencia, nossas celebrações litúrgicas habitualmente não propiciam momentos de silêncio, ou não lhes dão a devida importância. Com isso, desacostumamo-nos com o silêncio na Liturgia, tal como estamos desacostumados com o silêncio no dia-a-dia. Sentimo-nos incomodados com os cinco segundos a mais que o grupo de música demorou para entoar o Kyrie, ou com o leitor que demora em começar a leitura do Lecionário.

Não temos uma alma contemplativa, que sabe silenciar (silentium). E aí temos um problema: sem o silêncio, a Liturgia transforma-se numa sequência ininterrupta de palavras, gestos e rituais em que apenas o homem fala, com pouco espaço para Deus. Este silêncio pode ser entendido como a pausa numa música, que possui uma função essencialmente ativa. Um instrumento em pausa coloca o seu instrumentista num estado de contemplação, por conta da sinfonia ocasionada pelos demais instrumentos, e simultaneamente de atenção, enquanto aguarda o momento de juntar-se aos demais de forma harmônica e bela. Sem as pausas, uma música transformar-se-ia num punhado de notas sobrepostas e difíceis de serem ouvidas e, portanto, contempladas.

De fato, a própria Liturgia cristã tem muito a ver com este sentido de pausa, de descanso. Deus, terminada a obra que havia feito, descansou ao sétimo dia da criação, consagrando-o (Gn II, 2ss). Também os cristãos passaram a consagrar o domingo, o Dies Domini (Dia do Senhor), o dia da nova criação, através principalmente da Liturgia, mas também do descanso do trabalho.

É preciso ter em conta que silenciar não é passar de uma postura ativa para outra, passiva. Não é passar do fazer para o nada fazer. Quem silencia troca uma ação (falar, fazer algum gesto ou rezar em voz alta) por outra ação (ouvir o que outro ou o próprio Deus fala, rezar interiormente unindo-se ao celebrante).

Uma das condições pessoais exigidas para uma frutuosa participação litúrgica é 
"o espírito de constante conversão que deve caracterizar a vida de todos os fiéis: não podemos esperar uma participação activa na liturgia eucarística, se nos abeiramos dela superficialmente e sem antes nos interrogarmos sobre a própria vida. Favorecem tal disposição interior, por exemplo, o recolhimento e o silêncio durante alguns momentos pelo menos antes do início da liturgia, o jejum e — quando for preciso — a confissão sacramental; um coração reconciliado com Deus predispõe para a verdadeira participação." (Papa Bento XVI, Sacramentum Caritatis, 55)
O silêncio, portanto, não é um fim em si mesmo; não gera mais silêncio, mas produz fruto, que é a palavra, favorecendo o colóquio da alma com Deus. Daí que se pode dizer que o silêncio realça a Palavra.
Não há que surpreender-se se, nas diversas tradições religiosas, a solidão e o silêncio constituem espaços privilegiados para ajudar as pessoas a encontrar-se a si mesmas e àquela Verdade que dá sentido a todas as coisas. O Deus da revelação bíblica fala também sem palavras: «Como mostra a cruz de Cristo, Deus fala também por meio do seu silêncio. O silêncio de Deus, a experiência da distância do Omnipotente e Pai é etapa decisiva no caminho terreno do Filho de Deus, Palavra Encarnada. (...) O silêncio de Deus prolonga as suas palavras anteriores. Nestes momentos obscuros, Ele fala no mistério do seu silêncio» (Exort. ap. pós-sinodal Verbum Domini, n. 21). No silêncio da Cruz, fala a eloquência do amor de Deus vivido até ao dom supremo. Depois da morte de Cristo, a terra permanece em silêncio e, no Sábado Santo – quando «o Rei dorme (…), e Deus adormeceu segundo a carne e despertou os que dormiam há séculos» (cfr Ofício de Leitura, de Sábado Santo) –, ressoa a voz de Deus cheia de amor pela humanidade.

Se Deus fala ao homem mesmo no silêncio, também o homem descobre no silêncio a possibilidade de falar com Deus e de Deus. «Temos necessidade daquele silêncio que se torna contemplação, que nos faz entrar no silêncio de Deus e assim chegar ao ponto onde nasce a Palavra, a Palavra redentora» (Homilia durante a Concelebração Eucarística com os Membros da Comissão Teológica Internacional, 6 de Outubro de 2006). Quando falamos da grandeza de Deus, a nossa linguagem revela-se sempre inadequada e, deste modo, abre-se o espaço da contemplação silenciosa. (Papa Bento XVI. 46º Dia Mundial das Comunicações Sociais)



Por esta razão a Liturgia Romana sempre dedicou muito espaço para o silêncio. Quando foi normatizada por São Pio V, a Liturgia Romana já possuía muitos momentos de silêncio, e que ainda podem ser observados na Forma Extraordinária. Hoje, mesmo que todos os momentos de silêncio prescritos na Forma Ordinária sejam observados - o que raramente ocorre - ainda são em menor quantidade. Isto, aliado ao crescente interesse dos jovens pelo Usus Antiquior e à constante necessidade dos últimos Papas em reforçar a redescoberta do silêncio na Liturgia, leva a um saudável questionamento, tendo em vista uma eventual Reforma da Reforma, se a diminuição brusca do silêncio foi pastoralmente apropriada ou não. (Por outro lado, é digno de menção que a catequese litúrgica dos fiéis daqueles tempos muitas vezes não permitia que o rito mais silencioso fosse acompanhado de forma mais frutífera, algo que hoje parece superado entre os fiéis que freqüentam a Forma Extraordinária.)

O Silêncio na Forma Ordinária

Por não ser tão observado nas celebrações litúrgicas da Forma Ordinária, falemos mais do silêncio aí. O silêncio foi tido em conta pelos Padres Conciliares, a ponto de tocarem - embora sucintamente - de forma explícita no assunto. Ao contrário daquele que é o senso comum entre certos liturgistas modernos, o silêncio entrou justamente num trecho em que fala da participação ativa do povo, o que reforça o que foi dito anteriormente.

A Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia, publicada em 1963, em seu Capítulo I, intitulado "Princípios Gerais em Ordem à Reforma e Incremento da Liturgia", na seção "III - Reforma da Sagrada Liturgia", subseção "A. Normas gerais", diz o seguinte:
"A participação do povo
30. Para fomentar a participação ativa, promovam-se as aclamações dos fiéis, as respostas, a salmodia, as antífonas, os cânticos, bem como as ações, gestos e atitudes corporais. Não deve deixar de observar-se, a seu tempo, um silêncio sagrado."
No 40º aniversário da Sacrosanctum Concilium, São João Paulo II, observando como o silêncio havia sido deixado de lado na liturgia, escreveu com maior ênfase sobre esta questão:
"Um aspecto que é preciso cultivar com maior compromisso, no interior das nossas comunidades, é a experiência do silêncio. Temos necessidade dele "para acolher nos nossos corações a plena ressonância da voz do Espírito Santo, e para unir estreitamente a oração pessoal à Palavra de Deus e à voz pública da Igreja"(32). Numa sociedade que vive de maneira cada vez mais frenética, muitas vezes atordoada pelos ruídos e perdida no efémero, é vital redescobrir o valor do silêncio. Não é por acaso que mesmo para além do culto cristão, se difundem práticas de meditação que dão importância ao recolhimento. Por que não começar, com audácia pedagógica, uma educação ao silêncio no contexto de coordenadas próprias da experiência cristã? Que esteja diante dos nossos olhos o exemplo de Jesus, que "tendo saído de casa, retirou-se num lugar deserto para ali rezar" (Mc 1, 35). Entre os seus diversos momentos e sinais, a Liturgia não pode minimizar o silêncio." (João Paulo II. Spiritus et Sponsa, n. 13)
Os livros litúrgicos modernos tratam do silêncio em alguns trechos, apresentados abaixo:

IGMR - Instrução Geral do Missal Romano, 3ª edição (2008)
O silêncio

XII. SILÊNCIO SAGRADO
201. Geralmente, em todas as celebrações litúrgicas se há de procurar «guardar, nos momentos próprios, um silêncio sagrado». Consequentemente, na celebração da Liturgia das Horas, facultar-se-á também a possibilidade de uns momentos de silêncio.
202. E assim, conforme as conveniências e a prudência aconselharem, seguindo o costume dos nossos maiores, poder-se-á introduzir uma pausa de silêncio após cada salmo, depois de repetida a antífona, mormente quando, a seguir ao salmo, se disser uma coleta salmódica (cf. n. 112); ou ainda após as leituras, breves ou longas, antes ou depois do responsório. Este momento de silêncio visa obter a plena ressonância da voz do Espírito Santo nos corações e unir mais estreitamente a oração pessoal à palavra de Deus e à oração oficial da Igreja.
Cuidar-se-á, porém, que o silêncio não venha alterar a estrutura do Ofício ou causar aos que nele participam mal-estar ou enfado.
203. Na recitação individual, é deixada mais ampla liberdade quanto a estas pausas, com o fim de meditar alguma fórmula susceptível de estimular afetos espirituais, sem que por isso o Ofício perca o seu caráter de oração pública.
45. Oportunamente, como parte da celebração deve-se observar o silêncio sagrado*. A sua natureza depende do momento em que ocorre em cada celebração. Assim, no ato penitencial e após o convite à oração, cada fiel se recolhe; após uma leitura ou a homilia, meditam brevemente o que ouviram; após a comunhão, enfim, louvam e rezam a Deus no íntimo do coração.
Convém que já antes da própria celebração se conserve o silêncio na igreja, na sacristia, na secretaria e mesmo nos lugares mais próximos, para que todos se disponham devota e devidamente para realizarem os sagrados mistérios.
* Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. sobre a S. Liturgia, Sacrossanctum Concilium, n. 30; S. Congre. dos Ritos, Instr. Musicam sacram, de5 de março de 1967, n. 17: A.A.S. 59 (1967) p. 305 

Na edição anterior da IGMR, que acompanha a 2ª edição do Missal Romano, este trecho equivale ao n. 23. O último parágrafo, contudo, a respeito do silêncio extra-litúrgico na igreja, é uma novidade da atual edição da IGMR.

Ordo Lectionum Missae (1981), tradução minha a partir do espanhol
28. A Liturgia da Palavra deve celebrar-se de tal maneira que favoreça a meditação; por isso, há de se evitar todo tipo de pressa, que impede o recolhimento. O diálogo entre Deus e os homens, que se realiza com a ajuda do Espírito Santo, requer breves momentos de silêncio, adequados à assembléia presente, para que neles a palavra de Deus seja acolhida interiormente e se prepare uma resposta por meio da oração. 
Estes momentos de silêncio podem ser guardados, por exemplo, antes de começar a Liturgia da Palavra, depois da primeira e da segunda leituras, e ao terminar a homilia.

Instrução Geral sobre a Liturgia das Horas
XII. SILÊNCIO SAGRADO

201. Nas ações litúrgicas deve-se procurar em geral que se guarde também, há seu tempo, um silêncio sagrado; por isso, haja ocasião de silêncio também na celebração da Liturgia das Horas.

202. Por conseguinte, se parecer oportuno e prudente, para facilitar a plena ressonância da voz do Espírito Santo nos corações e unir mais estreitamente a oração pessoal com a Palavra de Deus e com a voz pública da Igreja, pode-se intercalar uma pausa de silêncio, após cada salmo, depois de repetida sua antífona, de acordo com antiga tradição, sobretudo se depois do silêncio se acrescentar a coleta do salmo; ou também após as leituras tanto breves como longas, antes ou depois do responsório.

203. Na recitação a sós, haverá maior liberdade para demorar na meditação de alguma fórmula, que incentive a elevação espiritual, sem que com isso o Ofício perca sua natureza pública.


E você, caro leitor? Conte-nos como o silêncio é ou não vivido por ti ou em tua comunidade. Consegues aproveitar o silêncio em tuas celebrações litúrgicas? Ou ele está em falta?

Referências


Arquibasílica do Santíssimo Salvador

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História
Na região do monte Célio, em Roma, também conhecido como latrão fora construído um palácio  para a mulher do Imperador Constantino que, depois da conversão do imperador passou a servir de morada aos papas desde os tempos antigos até o cativeiro de Avignon. Não se localiza propriamente no centro da cidade antiga, mas bem próximo aos muros aurelianos que delimitavam-na.



Por uma questão de conveniência, esta mesma região foi escolhida para abrigar a catedral da diocese de Roma a ser construída no século IV depois do édito de Milão. A basílica primitiva conhecida como Basilica Aurea, foi construída tendo a faixada voltada para o oriente e a abside para o ocidente, o oposto das tradicionais igrejas medievais. A basílica antiga já brilhava em grandeza e arte, possuía 5 naves separadas por colunas, com clarestórios. Sua arquitetura original sofreu muitos restauros em função das agressões do tempo e de vândalos, entre os quais se destaca aquela feita a mando do Papa Adriano na páscoa de 744, quando ali foi batizado Carlo Magno. Todavia, devido a um terremoto no ano de 896 o teto veio a baixo, sendo necessária uma completa reconstrução da basílica.




A segunda basílica, da baixa idade media, foi construída respeitando as proporções da antiga e dedicada no início do século X, foi também nessa época que a catedral ganhou o Batistério que fora dedicado a São João Batista, que passou a ser co-titular também da catedral. No século XII o Papa Julio II dedicou a São João Evangelista o Palácio Lateranense, acrescentando-o ao grupo dos co-titulares da catedral. Desse período até o século XIV a Catedral de Roma ganhou inúmeras obras de arte como mosaicos e túmulos. O fim da imponência desta igreja chegou com o cativeiro de Avignon, quando o complexo do latrão se viu em completo abandono. Até que na noite de 6 de Maio de 1608 a basílica foi quase que completamente destruída por conta de um incêndio.


A terceira basílica, alta idade media, mantinha a estrutura básica das antigas, mas embora se enviasse de Avignon a Roma algum dinheiro para a construção da basílica, as tentativas de manter a beleza de outrora eram insuficientes. A grande novidade na construção desta basílica foi a inserção do transepto, uma nave perpendicular às principais que fazia a igreja ganhar o formato de cruz latina. Assim a planta da basílica do latrão, por influência de São Paulo fora dos muros, passou a ser também em cruz. Também foi acrescentado ao altar um grandioso cibório com os bustos dos apóstolos Pedro e Paulo.



O fim da terceira basílica se deu quando o Papa Inocêncio X decidiu por confiar a Barromini a reforma da igreja. A quarta basílica, a atual, foi construída de Inocêncio X até clemente XII, quando foi terminada a faixada, projeto de Alessandro Galilei. Das basílicas medievais restaram apenas o chão, o cibório e os mosaicos próximos à catedra do Papa.
Títulos

 O título completo desta igreja é "Sacrossanta Catedral Papal Arquibasílica Romana Maior do Santíssimo Salvador dos Santos João Batista e Evangelista no Latrão, mãe e cabeça de todas as igrejas da Cidade (Roma) e do Mundo". Trata-se da Catedral de Roma, umas das quatro basílicas maiores da mesma cidade e a única com o título de arquibasílica, superando assim todas as demais igrejas no mundo, mesmo a Basílica Papal de São Pedro no Vaticano. Sua dedicação é a única celebrada em todo o mundo de rito romano a título de festa do senhor, tendo precedência inclusive sobre a liturgia dominical do tempo comum. Apesar de todos esses títulos, a Arquibasílica não é matriz paroquial, a dita Paróquia do Santíssimo Salvador tem como matriz uma capela anexa ao batistério da catedral, para uma melhor manutenção da vida paroquial.

Arquitetura e Arte Sacra

A Arquibasílica é riquíssima em arte e arquitetura sacra, descacam-se a faixada de estilo renascentista onde se notam três níveis básicos: os portões que dão para o átrio, a loggia e a cobertura onde estão diversas imagens de santos, dentre as quais a mais proeminente é a do Cristo com a Cruz, símbolo da Salvação. Entre os portões que dão acesso ao átrio se encontra a inscrição de "Mater et Caput..." e também as claves com a umbella.



Existe ainda uma faixada lateral, menor, de onde se pode sair da igreja em procissão ao batistério ou chegar à praça João Paulo II onde se encontra o Obelisco. Essa segunda entrada possui também um segundo átrio, decorado não com escultura como o principal, mas com pintura. Sobre este átrio encontra-se uma loggia igualmente decorada e ainda o campanário com os sinos da igreja.




No interior, as quatro naves laterais são decoradas com figuras angélicas alternadas, nessas naves se encontram os confessionários em madeira, todos identificados com as armas papais, o triregnum e as chaves, e as inscrições relativas à arquibasílica. Também se encontram ali as entradas para as muitas capelas laterais. A nave principal e o transepto possuem um pé direito mais elevado e também uma decoração muito mais pesada, baseada em símbolos litúrgicos esculpidos em material dourado sobre um fundo que se alterna entre o vermelho e o azul.





A lateral da nave principal possui esculturas representando os doze apóstolos feitas por diversos artistas, mas mantendo um mesmo estilo e dimensões, São Pedro e São Paulo ocupam a posição principal, próximos ao altar.


À frente do altar se encontra uma pequena "confessio" onde se encontra o túmulo do Papa Martinho V. O altar propriamente dito se encontra um baldaquino que abriga o busto dos apóstolos Pedro e Paulo. É um baldaquinho proveniente da terceira basílica de estilo gótico e por isso mesmo de dimensões muito mais reduzidas em relação àquele de São Pedro.


Na parte do fundo da nave central, atrás do transepto se encontra o elemento que confere a essa igreja tamanha dignidade: a catedra romana. Sobre uma quantidade considerável de degraus, em meio ao coro de madeira, a cátedra do Bispo de Roma.


 No transepto, do lado do evangelho se encontra o "Altar do Sacramento", um belíssimo altar com relicário e sacrário e um baldaquino unido à parede do fundo, ocupando o espaço do antigo órgão. No lado da epístola o órgão novo sobre o acesso ao átrio lateral. Uma atração que se pode ver por toda a igreja é o chão, uma das poucas partes da igreja que sobreviveram às agressões do tempo.


Das muitas capelas que a Igreja possui, uma que chama a atenção é a Capela de São Francisco de Assis, onde é reposto o santíssimo sacramento após a Missa na Ceia do Senhor da Quinta-feira Santa.



 Diferente das outras basílicas papais, o batistério da arquibasílica se encontra em um edíficio que, embora próximo, é separado. Neste edifício se encontram além da pia batismal, cinco altares. 



Vida Litúrgica
A Igreja Lateranense possui uma vida litúrgica intensa, oferendo diariamente pelo menos oito missas, um número ainda maior nos dias festivos. Existem na igreja doze confessionários onde os padres franciscanos atendem diariamente confissão em dez idiomas: polonês, italiano, espanhol, romeno, alemão, russo, francês, irlandês, português e inglês. Além disso, existe adoração eucarística todos os dias, com bênção eucarística duas vezes por dia: ao meio dia e às cinco da tarde.

Tomada de Posse da Catedra Romana
Embora o início do ministério do Bispo de Roma não se inicie com a sua posse na Catedral, a primeira visita do Papa à sua catedral e o simbólico gesto de sentar na cátedra se mantém como um dos mais importantes do início do pontificado. O rito bastante simples constitui em uma visita do sucessor de Pedro à arquibasílica e, no início da celebração eucarística, com mitra e báculo sobe os degraus da abside e se coloca no posto símbolo de sua autoridade suprema na Igreja. À seguir juram obediência ao Papa alguns representantes das diferentes classes de fiéis da diocese de Roma.








Inscrições que marcam a dedicação da Catedral pelo Papa Inocêncio X no ano jubilar de 1650.

12 de Novembro: início dos 30 dias de preparação para a Consagração Total! Envie seus dados por aqui…

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Seguindo os passos de São João Paulo II, chegamos agora ao auge da nossa 5ª Campanha Nacional de Consagrações à Virgem Maria. A primeira após a canonização deste Papa de Maria!  Milhares de pessoas espalhadas em grupos por todo o Brasil prepararam-se para fazer ou renovar a sua Consagração Total a Nosso Senhor Jesus Cristo, por meio de nossa Mãe Santíssima, pelo método de São Luis Maria Grignion de Montfort, no dia 12 de dezembro de 2014, Festa de Nossa Senhora de Guadalupe (ou datas próximas, por razões locais).

Vivemos um Momento Mariano na Igreja, pois:
  • No Grande Jubileu do ano 2000, São João Paulo II consagrou o Terceiro Milênio à Nossa Senhora.
  • No dia 13 de Outubro de 2013, o Papa Francisco consagrou o mundo ao Imaculado Coração de Maria.
  • No dia 27 de Maio de 2014, o Papa Francisco elevou João Paulo II, que tão bem viveu a Consagração à Virgem Maria , à glória dos altares, juntamente com João XIII.
Agora, cabe a cada um de nós tomar posse, pessoalmente, dessa Consagração, e consagrar-se à Virgem Maria. É isso que queremos fazer em 12 de Dezembro.

A CONSAGRAÇÃO ou RENOVAÇÃO da Consagração pode ser feita, de preferência, na Santa Missa, ou ainda de maneira privada.

Para que não reste nenhuma dúvida, por favor, leiam o texto abaixo.

QUEM PODE SE CONSAGRAR EM NOSSA CAMPANHA?

Todos que se prepararam em grupo ou individualmente para fazer a Consagração Total à Maria Santíssima, pelo método de São Luis Maria Grignion de Montfort, no dia 12 de dezembro de 2014, ou ainda em datas próximas.

De forma geral, recomendamos não se consagrar e nem mesmo iniciar os 30 dias de preparação SEM A LEITURA COMPLETA do Tratado. Devido à importância e abrangência da Consagração não é possível realizá-la sem conhece-la bem. Além disso, a Consagração é feita uma vez na vida, portanto, é importante conhecê-la bem.

Esclarecemos também que a Consagração pode ser realizada em outro momento, após a leitura do livro. Ela pode ser feita em grupo ou individualmente, em data escolhida livremente.

Para quem ainda não tem o “Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem”, ele poderá ser adquirido através dos links abaixo, em nosso material de apoio.

QUEM PODE RENOVAR A CONSAGRAÇÃO NA NOSSA CAMPANHA?

Todos que já fizeram a Consagração Total pelo método de São Luis Maria Montfort, em absolutamente qualquer da data que tenha feito (a Consagração pode ser renovada, individualmente, todos os dias, inclusive).

A data da Renovação NÃO depende necessariamente da data da Consagração.

Recomendamos que aqueles que renovarem a Consagração façam também os 30 dias de orações preparatórias (embora não seja imprescindível, e quem por alguma razão não o fizer, poderá renovar tranquilamente).

ORAÇÕES PREPARATÓRIAS

Aqueles que irão se consagrar ou tão somente renovar a consagração na Festa de Nossa Senhora de Guadalupe, devem iniciar os 30 dias de orações preparatórias no dia 12 DE DE NOVEMBRO.

As orações próprias estão indicadas no “Tratado” (n. 227-233), podendo também ser encontradas abaixo, em nosso material de apoio.

FALHEI DURANTE OS 30 DIAS: O QUE FAZER?

Recomendamos que, mesmo que haja alguma falha durante as orações preparatórias, que isso não seja motivo de desistência. Permaneça fiel e consagre-se.

O demônio odeia esta consagração total e poderá se utilizar de algum escrúpulo por não ter cumprido cem por cento os atos de preparação para, assim, incitar à desistência.

Além disso, a consagração é um ato interior, que não depende necessariamente dos atos exteriores de preparação.

No caso de uma queda em pecado mortal, que haja, evidentemente, arrependimento e se busque a Confissão o mais rápido possível, mas que isso também não seja motivo de desistência.

NO DIA DA CONSAGRAÇÃO, O QUE SE FAZ?

- deve-se oferecer algum tributo a Nosso Senhor e a Santíssima Virgem, em penitência das nossas infidelidades e em sinal de dependência Deles. Poderá ser algum jejum, ou penitência, ou ato de caridade a um necessitado (ver Tratado, n. 232).

- deve-se utilizar um sinal físico da Consagração, a ser levado sempre junto consigo (Tratado n.236-242). São Luis sugere usar “pequenas cadeias de ferro”, mas evidentemente que este sinal pode ser substituído com algo mais compatível com o estilo de vida de cada um (como uma Medalha da Santíssima Virgem, um Escapulário, uma pequena corrente, um anel etc).

- para a Consagração, propriamente dita, deve ser escrita e assinada em uma folha a fórmula da Consagração (que pode ser encontrada em nosso Material de Apoio). Aqueles que irão se consagrar durante a Santa Missa, devem ler a fórmula rezando a respectiva oração após a homilia ou Comunhão. 

Trata-se de um tesouro que deve ser guardado com muito zelo.

IMPORTANTE: ENVIO DOS DADOS
Aqueles que quiserem participar da nossa Campanha FAZENDO ou RENOVANDO a Consagração, deverão enviar os seus dados, preenchendo o formulário no link abaixo, até o dia 09 de Dezembro de 2014 (os nomes serão oferecidos na Santa Missa):

CLIQUE AQUI.

Os dados das crianças deverão ser enviados normalmente, da mesma forma que dos adultos.

Os coordenadores dos diversos grupos de preparação para Consagração deverão estar atentos para enviar os dados dos membros do grupo não tiverem acesso à internet.

MATERIAL DE APOIO

Temos à disposição:
  • Aulas do Pe. Paulo Ricardo explicando parte por parte do “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem” (aulas preparatórias para a Campanha de 2011) – versão on-line ou DVD
As dúvidas de todos poderão ser respondidas também pelo mail:  duvidas@consagrate.com

Site de referência: http://www.consagrate.com
“Por fim, o Meu Imaculado Coração Triunfará!”


Já estão abertas as inscrições para o evento "O tesouro da educação"

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Não percam! 

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Os alunos que fizeram parte da primeira turma do curso, relatam:
"Prezados Rafael e Aline, Em primeiro lugar, gostaria de agradecer pelo conteúdo do curso Como Catequizar Seus Filhos em Casa! Para mim e para meu marido, que não tivemos boa formação religiosa na infância e temos agora que educar nossos filhos, Teresa (quase 2 anos) e Luís (6 meses), o curso está sendo muito bem aproveitado e veio num momento providencial."
"Confesso que estou sendo educada na fé ao procurar educar meus filhos, e quanta coisa que estou aprendendo! Sou muito grata a Deus por ter encontrado o blog de vocês, Aline e Rafael."
"Ontem, assisti a aula 5 ( espero hj pegar a 6), e queria que você soubesse que você "tocou meu coração " ontem. Sua aula foi profunda e me fez refletir sobre o meu papel de mãe. Me fez pensar em quão efetiva estou sendo na tentativa de guiar as manhãs filhas para a santidade. Cheguei a conclusão que tenho que aprimorar muito as técnicas aqui de casa. Meu Deus, ilumine a minha caminhada! Muito importante a astúcia que precisamos ter para extrair o melhor dos diferentes temperamentos, e também para fortalecer a virtude ao mesmo tempo em que tentamos atenuar/corrigir os defeitos. A questão crucial da ACEITAÇÃO, também me fez pensar em quanto eu realmente aceito cada um dos meus tesouros com suas limitações, tentando ajudá-las a se tornarem seres humanos melhores, e o quanto eu tento impor o que eu acho correto. Tenho muitas dúvidas em relação a isso. Se você tiver alguma bibliografia que possa me ajudar a aprofundar essa questão, eu te agradeceria imensamente. Enfim, obrigada por mais essa aula."
"As correntes pedagógicas apresentadas são de uma relevância imensurável para a formação do catequizando como ser humano em toda sua dimensão! Sou catequista e em nenhum documento lido e estudado tive conhecimento dessas pedagogias. Há algum tempo venho me sentindo incomodada com essa questão pedagógica na Catequese e com essa instrução vejo que é possível refazer e reestruturar meu trabalho catequético, mais que isso: Devo começar educar eu mesma nessa riqueza pedagógica. Muitíssimo obrigada!!!"
"O que vejo na minha realidade, Arquidiocese de Brasília, é que a maioria das catequeses paroquiais, utilizam livros e/ou apostilas "sem pé e sem cabeça" não há uma coesão: um começo, um meio e um fim no conteúdo a ser abordado, são temas soltos. Além de ser catequista sou "formadora" de catequistas, "formadora" : não se pode falar professora... Estava na Escola Arquidiocesana de Catequese e decidi sair para estudar, principalmente nos padres da Igreja, buscar respostas para minha angústia. E nesse curso que você e sua esposa estão ministrando vejo que eu estava certa, o que estava fazendo está tudo errado!!! Ufa, perdoe-me ta exurrada deste desabafo, mas o problema da Catequese hoje é muito, muito sério!!! Obrigada pela instrução!!!"
"assistindo agora: "pais com fé adulta transformam crianças com fé infantil; pais com fé infantil não transformam crianças com fé nenhuma...", excelente!"
"As aulas estão excelentes, dão um bom norte sobre como funciona a catequese familiar. Tanto na parte mais prática, de como montar um plano de aulas, etc., como na parte sobre os temperamentos. Percebo que temos um curso completo, não só sobre a catequese formal, mas também sobre como nos adaptarmos à personalidade de cada uma de nossas crianças. Muito rico! Irá nos ajudar muito, e imagino que todos os alunos. Parabéns e obrigado!"
"Você possui uma didática excelente, e como alguns já colocaram, aprendi mais nestes vídeo que em toda minha vida de catequese. Já fui catequista (com 15 anos) e na época não tinha a dimensão da responsabilidade e complexidade de uma catequese. Encontrei o blog de vocês em minhas pesquisas pela internet, e fiquei muito animada, pois quero muito que meus dois filhos tenham uma boa base de fé (coisa que eu não tive plenamente)."
"Rafael, gostei muito da forma com que você situou o curso. Aspecto surpreendente foi a catequese adulta, fundamental para catequese infantil. Gerou muita reflexão e a certeza de que Deus iluminou minha caminhada para encontrar esse curso, nesse momento!"
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Livraria Salvem a Liturgia

Reforma da reforma e Semana Santa

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Introdução

Continuando nossa série sobre uma futura unificação do rito romano, teço breves linhas sobre a unificação do rito romano quanto à Semana Santa, falando das cerimônias da Semana Santa pré-1955, aa reforma de Pio XII e do Novus Ordo.

Quero propor aqui um brainstorming, mencionando os três usos de Semana Santa no rito romano: pré-1955, reforma de Pio XII em 1955 continuada pelo Beato João XXIII em 1962 (hoje, rito tridentino/forma extraordinária) e reforma de Paulo VI em 1969 (hoje rito moderno/forma ordinária), salientando aspectos positivos e negativos de cada etapa, e o que poderia compor, de modo natural e orgânico, uma eventual e futura unificação litúrgica em nosso rito.

O que era positivo pré-1955 e deveria ter sido mantido e não foi? O que era negativo e, graças a Deus, foi reformado em 1955, permanecendo no rito de 1962? E o que era negativo em 1955-1962 que foi reformado em 1969 e o que era positivo e não poderia ter sido recusado?

Muito das cerimônias anteriores à reforma de Pio XII, em 1955, era duplicação desnecessária, barroquismo demasiado, e o próprio deslocamento dos horários naturais era um absurdo (Vigília Pascal na manhã do Santo Santo, Missa In Coena Domini na manhã de Quinta-feira Santa… “CEIA” de manhã? “VIGÍLIA” de manhã?). Todavia, muito do que foi reformado em Pio XII, até mais do que em Paulo VI, talvez, também foi fruto de exageros.

Vou usar as siglas OHS 1955/MR 1962 para a Semana Santa reformada por Pio XII em 1955 e mantida no Missal de João XXIII de 1962; MR 1952 para a Semana Santa pré-1955, constante no Missal de 1952; e MR 1969 para o Missal reformado por Paulo VI.

Irei nos basear em diversas fontes, sobretudo nas memórias do Cardeal Ferdinando Antonelli, OFM, da comissão responsável pela reforma da Semana Santa e, após o Vaticano II, do Consilium ad exsequendam Constitucionem de Sacra Liturgia.

Bibliografia indicada:

ANTONELLI, Ferdinando. Il ripristino della solenne Veglia Pasquale. Lezioni di Liturgia, in ALV, pp. 1-20
___. Progetto per la revisione dei riti del Sabato Santo nella eventualità di un ripristino della vigilia di Pasqua, 1951, SRC Sect. Hist., in SCCS, pp. 1-30
___. Questioni intorno alla Veglia Pasquale, 1953, in SCCS, pp. 1-4
___. Annotazioni intorno alla riforma della Domenica delle Palme, 1954, in SCCS, pp. 1-20
___. Intorno alla Settimana Santa, 1954, in SCCS, pp. 1-2
___. Storia dei Riti del Triduo Sacro, RAI, 1965, in SCCS, pp. 1-9
___. Promemoria sulla revisione dei libri liturgici in esecuzione della Costituzione Conc. della S. Liturgia, 1963, in SCCS, pp. 1-9
SAGRADA CONGREGAÇÃO DOS RITOS. De Sollemni Vigilia Paschali Instauranda. Decretum et Rubricae si Vigilia Paschalis Instaurata Peragitur, 1951
___. Memoria sulla riforma liturgica, 1951
___. Ordo Sabbati Sancti, 1951
___. De Instaurationi Liturgica Maioris Hebdomadae, 1955
___. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria, 1955
GIAMPIETRO, Nicola. The development of the liturgical reforma. As seen by Cardinal Ferdinando Antonelli  from 1948 to 1970, Fort Collins, 2009: Roman Catholic Books
GODDARD, Philip. Festa Paschalia: A history of the Holy Week liturgy in the Roman Rite, Leominster, 2011: Gracewing

Domingo de Ramos da Paixão do Senhor

Comecemos com o Domingo de Ramos. O que havia no rito pré-1955? Deste rito, o que foi mudado em 1955? Das mudanças, o que foi positivo e o que foi negativo? Noutras palavras, o que Pio XII fez de bom ao reformar o Domingo de Ramos e o que, em minha opinião, não deveria ter sido reformado?

O OHS 1955 (mantido pelo MR 1962) introduziu o pluvial vermelho para a procissão, mantendo o roxo para a casula da Missa. O MR 1969 fez tudo ficar vermelho. Penso que o vermelho para a casula, como em 1969, rompe com todos os séculos de tradição litúrgica romana que viram no Domingo de Ramos também uma comemoração da Paixão. De fato, é a preparação próxima para a Paixão, inauguração da Semana Santa. O roxo é mais adequado para a Missa e não o vermelho. Surge, entretanto, a pergunta: é certo que o MR 1969 foi longe demais em prescrever vermelho para a Missa de Ramos, e o roxo deveria continuar como sempre, mas a procissão também deveria ser com pluvial roxo, como no MR 1952 (ou seja, pré-1955), ou foi uma inovação positiva e um desenvolvimento sadio a adoção do vermelho para o pluvial da procissão no OHS 1955/MR 1962?

Conforme comentário do leitor Marcio Braga, em conversa nas redes sociais:

"Eu considero interessante a mudança das cores dos paramentos no Domingo de Ramos em nome da catequese visual. No início da Missa o sacerdote usa vermelho, cor que normalmente é vista pelo povo nas celebrações de memórias dos Mártires e Apóstolos, além de Pentecostes. Ou seja, em ocasiões festivas. Aqui o povo canta hosanas na procissão vendo o sacerdote trazer uma cor das comemorações. Ao entrar na Igreja (vale lembrar o antigo costume do acólito que traz a cruz bater três vezes com ela na porta da Igreja, simbolizando o acesso que temos por meio da Cruz, que aliás será lembrado na Proclamação da Paixão), o sacerdote passa a usar roxo e o povo é surpreendido com essa cor penitencial. Vale lembrar que não é comum a troca de cores durante a Missa, exceto nas celebrações deste Tempo Santo da Paixão. Logo da troca das cores é colocado na boca do povo o doloroso "Crucifica-o", que dizemos com aperto no peito. Isso tudo motiva a reflexão das vezes em que o aclamamos Rei e Senhor de nossas vidas e o entregamos ao sofrimento na sequência, por meio de nossos pecados."

Um pastor anglicano High Church usando pluvial roxo na procissão de ramos,
conforme o uso mais tradicional, pré-1955.

O vermelho foi utilizado, a partir da OHS 1955/MR 1962, como símbolo de realeza, como a "púrpura real", e por isso só para a procissão de Ramos (em que se honrava Cristo Rei). Ocorre que essa não é a simbologia do vermelho no rito romano. A cor das festas cristológicas é o branco ou, mais propriamente, o dourado. O vermelho não indica realeza em toda a história do rito romano, e se constituiu em uma novidade. De qualquer modo, penso que até se poderia conceder que a procissão fosse vermelha e que a cor tivesse esse caráter, mas a troca do roxo até da Missa, em 1969, me parece abusiva demais. Quanto às cores de Ramos no rito novo, tenho opinião formada: sou contra. Quanto às cores de Ramos entre 1955 e 1969, ainda estou na dúvida. Até 1955, a cor exclusiva do Domingo de Ramos era o roxo penitencial, e da Sexta-feira Santa o preto em luto. Entre 1955 e 1969, o Domingo de Ramos passou a ter duas cores: vermelho na procissão e roxo na Missa, e a Sexta Santa continuou com o preto. Só em 1969, adotou-se o vermelho para ambas. O vermelho para a Missa de Ramos e para a Sexta-feira Santa é completamente destoante da tradição romana. Para mim, é fora de questão que o arranjo de 1955/1962 é melhor do que o de 1969. Mas estou em dúvidas se o arranjo de 1955/1962 é melhor ou pior, no quesito cor litúrgica, do que o de 1952 (e anterior).

Seguindo o rito de 1955/1962, o sacerdote usa o pluvial vermelho na procissão de ramos, exatamente como no rito reformado por Paulo VI em 1969.

Outro ponto, ainda sobre Ramos: a abolição, para os diáconos e subdiáconos, na Missa Solene, da casula plicada ou dobrada e dos estolões, no OHS 1955/MR 1962, a meu ver foi um desnecessário simplismo e um jogar fora toda uma rica tradição. E uma tradição nada estéril. Tinha significado. O uso da casula dobrada pelo diácono e pelo subdiácono (ao invés da dalmática e da túnica) e do estolão pelo diácono lembravam a profunda tristeza da Igreja na Semana Santa, que se refletia até mesmo nas vestes "rasgadas", além de ser um dos costumes mais antigos, pré-medievais. Nisso, tenho posição convicta: nem 1969 nem 1955/1962, mas a forma pré-1955 era melhor. Em uma eventual reforma da reforma que contemple a unificação do rito romano, não basta retornar a 1955/1962: é preciso retroceder mais e resgatar o uso tradicional e milenar, tal qual no MR 1952.

Aqui se vê, ao centro, o celebrante (anglicano, aliás) 
com uma casula romana comum, e nos lados, o diácono e o subdiácono 
com as casulas romanas dobradas.

Aqui um subdiácono com casula gótica dobrada.


O estolão, que o diácono colocava, ao tirar a casula dobrada, 
para ler o Evangelho e para suas funções mais ativas, 
na Missa Solene em tempos penitenciais.

Outra foto de um diácono (anglicano) com estolão.


Já um terceiro ponto acho que foi positivo na reforma de Pio XII (OHS 1955/MR 1962): a simplificação do rito da bênção dos ramos. No MR 1952, pré-1955, portanto, havia uma Missa Seca, com Epístola, Gradual, Evangelho, Prefácio e até Sanctus, tudo no altar e versus Deum. Isso tornava o conjunto Procissão-Missa excessivamente longo. Que a Vigília Pascal seja longa se entende, pois é a noite das noites e a mãe de todas as vigílias, a festa cristã por excelência. Mas Ramos?

Com uma "Missa" dentro da Missa, há uma multiplicação de símbolos que deixam o fiel até perdido, além de demorar demais. Lembremos que a ausência de sinais é um erro, mas o excesso deles também: tanto a ausência quanto o excesso nos deixam perdidos e sem referência. A eliminação pelo OHS 1955/MR 1962 dessa cerimônia demasiado complexa e sua troca por um rito mais simples, com a leitura do Evangelho da Entrada Triunfal, e uma mera bênção das palmas, versus populum, é positiva, a meu ver. Um único detalhe poderia ser mantido dos ritos pré-1955: ao menos uma parte do prefácio que falava da realeza de Cristo, dado que ela é a tônica da procissão. Poder-se-ia, então, para uma unificação do rito, no futuro, adotar o modo simples e reformado em 1955/1962 - não muito diferente da forma ordinária em 1969 -, acrescentando-se o prefácio da bênção do MR 1952 ou parte dele. Com a simplificação do rito da bênção dos ramos, ademais, deu-se ênfase à procissão em honra a Cristo Rei, com uma maior realidade do evento que se celebra, a entrada triunfal de Cristo em Jerusalém. Essa ênfase na procissão pelo Reinado de Cristo foi positiva, e é ainda mais forte pela inserção da rubrica que manda cantar na procissão, além do Gloria Laus, o Christus Vincit - um hino tipicamente relacionado à realeza do Senhor.

Outro ponto positivo é a supressão das orações "de exorcismo" das palmas. Não que tenhamos que negar seu poder sacramental, seu símbolo contra o mal. Nada disso. Mas a tônica de Ramos NÃO é a guerra espiritual. As palmas abençoadas como sacramentais são consequência, são acidentais, não a essência das cerimônias desse dia. É bem verdade, contudo, que nem só de essência vive a liturgia e muitos acidentes são importantes. Não julgo, entretanto, que esse acidente das orações imprecatórias seja um deles. Andou bem Pio XII, o OHS 1955, João XXIII e o MR 1962, pois.

Interessante notar que o costume do acólito bater com a cruz por três vezes na porta, embora feito pelos que usam a forma extraordinária (OHS 1955/MR 1962) NÃO consta da reforma de Pio XII/João XXIII. Ela constava antes, nos ritos pré-1955, i.e., no MR 1952. Mas mesmo a reforma piana não conseguiu apagar o antigo costume: ainda que não constasse nas rubricas, se continuou a proceder assim. Acho interessantíssimo esse bater na porta com a cruz, que simboliza a resistência do povo judeu a Cristo, e a abertura não só de Jerusalém para a entrada triunfal, mas da Jerusalém Celeste, o Céu: e o céu foi aberto justamente pela cruz! Aliás, o próprio João XXIII não estava de todo contente com o OHS 1955, ainda que o tenha preservado no MR 1962, pois celebrou suas Semanas Santas com alguns costumes e mesmo hinos e observância de rubricas advindas dos ritos pré-1955. Enfim, o costume de bater com a cruz na porta, embora ausente no OHS 1955/MR 1962 e no subsequente MR 1969, continua a ser feito amplamente em todas as Semanas Santas celebradas de acordo com o Proprium de 1962 e até mesmo em alguns lugares que usam o Proprium de 1969.

Mesmo não constando nas rubricas do OHS 1955/MR 1962, o padre, ao utilizar a forma extraordinária, mantém o costume de bater na porta da igreja com a cruz.

Após a procissão e a entrada na igreja, o OHS 1955/MR 1962 introduziu uma oração conclusiva, para encerrar as cerimônias e dar início à Missa. Embora bela e piedosa, alguns admitem que foi uma introdução desnecessária e que cria uma ruptura, uma solução de continuidade entre a procissão e a Missa. Além disso, não consta em toda a tradição anterior. O próprio Pe. Carlos Braga, um dos responsáveis pela reforma de Pio XII e colaborador estreito do Mons. Bugnini, admitiu, anos mais tardes, que a criação e introdução dessa oração foi uma escolha infeliz: "O elemento que está fora de lugar no novo Ordo é o discurso de encerramento da procissão, que interrompe o unidade da celebração." (BRAGA, Carlos. Maxima Redemptionis Nostrae Mysteria: 50 anni dopo (1955-2005), in Ecclesia Orans, n. 23, 2006, p. 25) Todavia, ser algo novo não parece ser um argumento absolutamente convincente. Do contrário, ainda estaríamos celebrando como na Jerusalém do séc. I, sem nenhum desenvolvimento. A pergunta não deve ser feita quanto à novidade de uma cerimônia, mas sim se essa novidade se constitui um desenvolvimento HARMÔNICO ou artificial. Não sou perito e não saberia responder. Agradeço aos leitores se puderem comentar a respeito.

Enfim, pelas rubricas pré-1955, ao terminar a procissão e entrar na igreja, começando propriamente a Missa, o sacerdote deveria recitar as orações ao pé do altar. Com o OHS 1955, houve a supressão dessas orações para a Missa de Ramos que segue a procissão, inovação mantida no MR 1962 (nem se fale no MR 1969, onde as orações ao pé do altar foram suprimidas de todas as Missas). Ora, parece que o desejo de simplificação, justo em alguns pontos, não encontra freio. Aqui não há nenhuma razão plausível de ordem pastoral ou teológica para omitir as orações ao pé do altar, bem como fere toda a tradição do rito romano. A Missa, antecedida ou não por uma procissão, não deve ter justamente a preparação ao sacrifício que são as orações ao pé do altar, suprimidas. Nem o Asperges dominical faz as orações ao pé do altar desaparecem, por que a procissão de Ramos o faria?

Também no Missal pré-1955, portanto MR 1952, o canto da Paixão não substitui o Evangelho. São duas coisas distintas, ainda que as cerimônias sejam uma subsequente à outra. Primeiro, com três diáconos, como até hoje, no OHS 1955/MR 1962 e no MR 1969, se canta a Paixão. Imediatamente ao término da Paixão, o diácono da Missa apenas segue cantando o Evangelho, em outro tom, auxiliado pelo subdiácono e pelo acólito, como em qualquer Proclamação do Evangelho nas Missas normais. Havia uma pequena pausa entre a Paixão e o Evangelho, e o silêncio para a troca de cerimônias representava o luto de toda a Criação e da Igreja pela morte do Senhor. O incenso se usava no Evangelho, mas não na Paixão. Com o OHS 1955/MR 1962, Paixão e Evangelho se tornam uma coisa só, com as três vozes seguindo no trecho que antes era do Evangelho, e no mesmo tom. Alguns criticam tal decisão da Comissão, afirmando que a Missa se viu privada do Evangelho, além do rito anterior à reforma de 1955 ser mais representativo - e, obviamente, mais tradicional e de acordo com o legítimo costume ancestral romano.

Aliás, antes da Paixão, que é antes do Evangelho, no MR 1952, havia a leitura de um segundo trecho do Evangelho (terceiro, se contarmos a Procissão), que narra a Instituição da Eucaristia na Última Ceia. O sentido era claro: ligar a Ceia à Cruz, a Eucaristia à Paixão, pois Ceia, Cruz e Missa são uma coisa só. A Missa é a renovação da Cruz e a Ceia sua antecipação. Ao eliminar esse trecho evangélico no OHS 1955/MR 1962, não só uma importante cerimônia tradicional foi retirada, como se perdeu algo de catequético e profundamente espiritual. O MR 1969 manteve a retirada do OHS 1955/MR 1962.

Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa

No MR 1952, a Missa de Segunda-feira Santa continha uma oração Contra Persecutores Ecclesiae e uma Oração pelo Papa. O OHS 1955/MR 1962 a removeu, e o MR 1969 não a fez retornar. Além de ser uma supressão de uma cerimônia tradicional no rito romano, o que não se pode fazer sem graves razões, penso que essa omissão a partir de 1955 representa a adoção de uma mentalidade irenista, que não quer explicitar que a Igreja tem perseguidores e inimigos. Isso é lamentável. Na Grande Semana, onde os poderes das trevas tentam destruir a obra do Senhor, mais clara deve se manifestar a doutrina da guerra espiritual que movemos contra os inimigos espirituais e materiais da Igreja de Cristo.

Na Terça-feira Santa e na Quarta-feira Santa, as Missas tinham as leituras da Paixão, conforme São Marcos e São Lucas. O OHS 1955/MR 1962 manteve essas leituras da Paixão, mas as encurtou, o que não faz sentido algum. Já a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, foi além e desfigurou completamente a Liturgia da Palavra dessas Missas, trazendo prejuízos até mesmo para comentários espirituais de santos e de padres sobre a Semana Santa que, refletindo nas perícopes das Missas do dia, alimentaram centenas de gerações ao longo dos anos.

Um ponto positivo da reforma de Paulo VI, em 1969, foi a recomendação de que, na Semana Santa, especialmente na Segunda-feira Santa, Terça-feira Santa e Quarta-feira Santa se fizessem comemorar nas igrejas e oratórios  as chamadas Celebrações da Penitência, que constam do Ritual Romano ou da separata Ritual da Penitência, preparando o povo para a confissão auricular.

Missa Chrismatis e Quinta-feira Santa In Coena Domini

O arranjo de 1955 para a Quinta-feira Santa, continuado em 1962, com o Missal do Beato João XXIII, consistiu em mudanças de menor envergadura. Uma delas foi a observância do princípio da veritas horarium, com a restauração do horário da Missa In Coena Domini ao para a tardinha, seu horário natural. Esse era o horário original desta Missa, para melhor simbolizar que se tratava da comemoração da Última Ceia, feita por Cristo e os Apóstolos justamente ao cair da noite. Primitivamente, havia essa Missa em todas as paróquias, à tardinha ou começo da noite, e uma outra Missa, a Missa Chrismatis, presidida pelo Bispo na Catedral com a presença do seu clero, na manhã da mesma Quinta-feira Santa. Com o tempo, multiplicou-se o costume de se celebrar a Missa In Coena Domini na própria manhã, e isso resultou na perda de uma melhor observância do sentido da Última Ceia, bem como a eliminação da Missa Chrismatis - e a consagração dos óleos passou a ser feita na Missa In Coena Domini catedralícia.

 Missa Chrismatis pelo rito de 1962, em Campos, RJ

A restauração do horário natural melhor acomodou a Missa In Coena Domini e permitiu o reaparecimento da Missa Chrismatis. Ambas foram consequências positivas, e mantidas não só no Missal de 1962 como no oriundo da reforma de Paulo VI, em 1969.

Todavia, a Missa Crismal não era celebrada há séculos. Teve a comissão litúrgica da Santa Sé, encarregada da reforma da Semana Santa, que buscar os ritos da Idade Média, conforme os sacramentários e missais mais antigos, para compor o Próprio dessa Missa. A Missa Chrismatis já era celebrada no séc. IV, presidida pelo Bispo, com todo o seu presbitério em concelebração sacramental, e com a consagração dos óleos, o que sempre foi observado por outros ritos, como o armênio. Havia uma outra Missa, de caráter penitencial, preparando os fiéis à Páscoa. Essa Missa penitencial desapareceu, e só se unificou a Crismal com a Missa In Coena Domini quando o costume tornou todas as Missas obrigatórias no período da manhã. Também a concelebração sacramental se tornou uma mera concelebração ritual ou cerimonial, com os padres de casula, mas não consagrando, quando a concelebração não foi mais permitida no rito romano.

Outra mudança de 1955 foi o deslocamento do Mandatum (o rito do lava-pés) do fim da Missa para depois da homilia, antes do Ofertório. O que nos causa estranheza foi que o princípio da veritas horarium, invocado para que a In Coena Domini passasse a ser celebradas à tardinha, não foi observado aqui. Ora, o horário natural para o lava-pés é depois da Missa, pois Nosso Senhor lavou os pés dos Apóstolos depois de haver ceado, ou seja, depois de celebrar a Eucaristia. A ordem cronológica Missa-Mandatum que era observada e estava correta pelo veritas horarium, é violada. Mas não foi a veritas horarium que deslocou a Missa da manhã para a tardinha? Por que no caso do Mandatum o princípio não vale? Além disso, o lava-pés depois da homilia interrompe a Missa, o que poderia ser justificado na sábia decisão de 1967 de assim fazer quando o Batismo, o Matrimônio ou a Confirmação fossem celebrados com Missa, dado que são sacramentos e não ficaria mau que se os celebrassem dentro do próprio Santo Sacrifício. Porém, um rito bonito, simbólico, mas que não é sacramento, interromper a Missa poderia parecer demais.

Procurou-se justificar o lava-pés após a homilia pois como era feito antes, depois do desnudamento dos altares, o luto tomaria conta da igreja e se passaria à adoração eucarística no monumento ou altar da reposição. Ora, então que se o deslocasse para o período compreendido entre a transladação do Santíssimo Sacramento e o desnudamento dos altares, e não para dentro da celebração eucarística.

Outra justificativa do lava-pés após a homilia, segundo o Cardeal Antonelli, um dos responsáveis pela reforma da Semana Santa, seria tornar a cerimônia mais conhecida pelos fiéis, de vez que feita na própria Missa, em um lugar central. Ademais, o Evangelho da Missa fala justamente do lava-pés e é bem simbólico que, após sua leitura, se proceda a esse ato narrado nas santas páginas. Por outro lado, não se trataria de uma interrupção da Missa, pois a cerimônia faz parte do Próprio do dia, afastando-se, então, o argumento de uma ruptura. O argumento do nobre Purpurado, sem embargo, não enfrenta o problema de não ser mais observado o veritas horarium que orientou as decisões de reforma - exceto neste ponto.

Aliás, o Mandatum, em 1955, passou a ser feito no coro ou no presbitério, e isso prejudica a sacralidade, permitindo que, mais uma vez, leigos ingressem no santuário. É certo que há ocasiões em que eles já adentravam a tão sagrado recinto, mas não vejo com bons olhos criar mais uma situação para isso. Fazer, como no MR 1952, o rito na nave é o mais adequado, como sempre se fez.

Já a supressão de um terceiro Confiteor, antes da Comunhão do diácono, foi positiva, a meu ver. Simplificação correta, pois se tratava de um acréscimo sem fundamento claro. Se for por conta de manifestar a própria indignidade antes de Comungar, o Confiteor já recitado é suficiente, e se um ou dois não o são, não será o terceiro que o será, e nunca bastarão recitações de Confiteor.

O Agnus Dei, com o OHS 1955/MR 1962, passa a não ter na terceira resposta o Dona nobis pacem, mudada pelo Miserere nobis, uma vez que a paz (simbolizada pelo beijo da paz logo após o Agnus) não é dada em função da traição de Judas (também com um beijo). Trata-se de uma novidade, mas plenamente justificada e com muito sentido. Infelizmente, o MR 1969 não manteve essa novidade - logo ele, que abraçou tudo o que era novo na OHS 1955/MR 1962, rechaçando muito do que era antigo. A opção do MR 1969, pelo retorno ao MR 1952 foi infeliz. A nosso ver, a escolha do OHS 1955/MR 1962 é a mais correta em um futuro rito unificado.

Enfim, uma outra mudança é a retirada também da cruz e dos castiçais do altar quando do seu desnudamento. Ainda que a cruz seja um elemento próprio da Sexta-feira Santa que em breve começa, sua retirada do altar, com os respectivos castiçais, dá mais visibilidade ao desnudamento dos altares. Não apenas as flores e alfaias são retirados, conforme era no MR 1952, mas, segundo o OHS 1955/MR 1962, tudo o que está sobre o altar. O altar fica realmente nu, e isso demonstra com mais dramaticidade e compreensão plástica, uma catequese bem visível, a realidade do luto da Igreja. Se o aleluia e o Glória cessam na Septuagésima, se o comer mais fartamente é impedido e as flores são retiradas na Quaresma, se as cruzes e as imagens são veladas no I Domingo da Paixão (chamado de V Domingo da Quaresma no MR 1969), nada mais terrível e, por isso, tremendamente simbólico, do que haver um desnudamento do altar de forma radical. Nem mesmo a cruz é deixada, em sinal de luto extremo. Isso dá margem, igualmente, à cerimônia do retorno da cruz em forma triunfal da sacristia, na Sexta-feira Santa, tema do qual nos ocuparemos abaixo, mostrando que a Cruz de Cristo é morte do Senhor, mas é triunfo da graça sobre o pecado. Penso, então, ser positivo esse avanço no desnudamento do altar, agora de modo total.

O altar completamente nu após a Missa In Coena Domini.

Sabemos, enfim, que liturgia não é apenas a Missa. A Liturgia das Horas, ou Ofício Divino, condensada no livro denominado tradicionalmente breviário, é parte das ações litúrgicas da Santa Igreja. Pois bem, no Triduum, a recitação das Matinas (hoje denominadas estranha e totalmente contra a tradição litúrgica como Ofício de Leituras, na forma ordinária) e das Laudes, adquirem um colorido todo especial. De tal sorte, ambas as horas canônicas são unidas no que se chama de Ofício de Trevas, ou Tenebrae. Há o Tenebrae de Quinta-feira Santa, o de Sexta-feira Santa e o do Sábado Santo. Como são Matinas e Laudes, são ofícios próprios para a manhã de quinta, sexta e sábado. Tradicionalmente, porém, o de Quinta-feira Santa era celebrado na noite de Quarta-feira Santa, uma vez que a manhã da quinta era dedicada à Missa In Coena Domini, visto que antes de 1955, não tinha esta retornado ao seu horário natural à tardinha.

Com a reforma de Pio XII, acomodando a Missa da Ceia do Senhor segundo o veritas horarium, a manhã de Quinta-feira Santa pôde, então, ter seu Tenebrae celebrado no próprio dia, sem antecipar para o dia anterior. Corrigiu-se, pois, uma outra imperfeição lógica dos ritos de Semana Santa pré-1955, voltando à natureza das coisas, tal qual era séculos antes.O Ofício de Trevas da Quinta-feira Santa é, pois, celebrado na manhã da própria Quinta-feira Santa e não na noite da quarta. Uma exceção foi permitida pelas rubricas: nas Catedrais, como há, na manhã da quinta a Missa Chrismatis, o Tenebraeé celebrado na noite da quarta, exatamente como antes. Isso porque o motivo que autorizava, antes de 1955, o Ofício de Trevas da quinta ser celebrado na noite de Quarta-feira Santa, permanece, qual seja a Missa na manhã da quinta-feira.

Alguns argumentam contra esse tema do Tenebrae que celebrar à noite dá mais profundidade espiritual ao drama narrado no ofício, por conta das trevas, das luzes que se apagam. Ora, mas se fossem para ser celebrados à noite ou tardinha anterior seriam Completas ou, no mínimo, Vésperas. E são Matinas - oração da madrugada - e Laudes - oração da manhã. Ademais, o período para celebrar o Tenebrae não é necessariamente o dia claro, como se Laudes ou até Tércia fosse: é possível fazê-lo de manhã bem cedo, madrugada, sem o sol ter nascido, e até mesmo após a meia-noite, pois o dia litúrgico começa e termina nesse horário. Meia-noite já não é mais Quarta-feira Santa, mas Quinta-feira Santa, e a escuridão própria para o Tenebrae é a mesma da noite de quarta. Pode-se, pois, mesmo com o OHS 1955/MR 1962, celebrar-se o Ofício de Trevas "no escuro": não na noite de Quarta-feira Santa, e sim após a meia-noite, sendo já Quinta-feira Santa.

Obviamente, estamos falando do Ofício de Trevas litúrgico, não de celebrações para-litúrgicas inspiradas no Tenebrae. Assim, se um grupo de pessoas, um convento, ou uma igreja que não seja catedral, desejam celebrar o Tenebrae de Quinta-feira Santa, devem fazê-lo no próprio dia de quinta (ou seja, após a meia-noite, seja na madrugada, seja na manhã), não podendo antecipar para a quarta. Só o Tenebrae de quinta da Catedral pode ser celebrado na Quarta-feira Santa à noite. Isso na forma ordinária, de 1969, ou na forma extraordinária, de 1962. Já as ações devocionais inspiradas no Tenebrae, e que só levam esse nome por conta da inspiração mesma, podem ser celebrados em qualquer dia da Semana Santa.

Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor, ou Parasceve

A primeira mudança do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962 é a do nome oficial que consta do Missal. Anteriormente à reforma de 1955, o culto litúrgico principal de Sexta-feira Santa se chamava "Missa dos Pré-santificados", enquanto depois passou a se chamar "Solene Ação Litúrgica", termo mantido no MR 1969.

Realmente, não se trata de uma Missa, de modo que Ação Litúrgica é teologicamente mais adequado. Isso ajudaria, em tese, a desfazer no povo a impressão de que se trata de um sacrifício, o que não é. Sexta-feira Santa não tem sacrifício, não tem Missa.

Várias outras mudanças do OHS 1955/MR 1962 na liturgia da Sexta-feira Santa da Paixão do Senhor tiveram por motivação exatamente desfazer qualquer equívoco no povo de que pudesse ser essa ação solene uma Missa. Aliás, as primeiras versões da liturgia de Sexta-feira Santa no rito romano, ao menos até o séc. XII, não traziam elementos sacrificais. O MR 1952 chega a mandar que se reze o Orate Fratres, o que não guarda nenhum sentido de vez que não há sacrifício sendo oferecido. Nesse sentido, o OHS 1955/MR 1962 é melhor: "purifica" o rito e ainda retorna ao cerimonial medieval, sem prejuízo e sem radicalismos. Foi, a meu ver, uma mudança oportuna a supressão de elementos claramente sacrificais em uma liturgia que não é sacrifical. Já o nome "Missa dos Pré-santificados" poderia ter sido mantido, de vez que, embora tradicionalmente associemos "Missa" com o sacrifício eucarístico, a palavra, por si só, não é sacrifical. No Oriente, é comum que, quando não há Missa, haja uma Divina Liturgia (i.e., Missa) chamada também de "dos Pré-santificados". Embora "Missa" possa se prestar a confusões de que é um sacrifício, a expressão completa, com o "dos Pré-santificados", indicando que as espécies foram consagradas em Missa anterior, já desfaz eventuais equívocos.

No rito pré-1955, o padre vestia a casula preta desde o início da celebração, como se fosse uma Missa. Após 1955, passou a usar alva, cíngulo, amito e estola preta durante a Liturgia dos Catecúmenos, envergando o manípulo e a casula apenas após o sermão, na Liturgia dos Fiéis. Em 1969, Paulo VI, retoma o antigo dispositivo de o padre iniciar toda a Ação Litúrgica já de casula - todavia, troca a cor preta pela vermelha, lamentavelmente.

Também até 1955, a celebração iniciava com uma única toalha - e não três - sobre o altar, que era colocada pelos acólitos enquanto o padre se prostrava. Já em no OHS 1955/MR 1962, o altar permanecia nu até que, na Liturgia dos Fiéis, fosse coberto com as três toalhas. Penso que, nesse sentido andou bem a reforma de Paulo VI, com o MR 1969, mandando que o altar permanecesse nu, como no OHS 1955/MR 1962, mas mandando que se colocasse um único pano, como a tradição litúrgica romana, guardada até o MR 1952, dispunha, e não três.

As preces da Oração Universal pouco mudaram do MR 1952 para o OHS 1955/MR 1962, embora o título da oração pela conversão dos hereges e cismáticos tenha se convertido em Pro Unitate Ecclesiae, o que não é mau e cuja alteração é meramente circunstancial.

Já vimos que a cruz permanece no altar, pelas rubricas do MR 1952, mesmo depois do seu desnudamento na Quinta-feira Santa, e isso foi sabiamente mudado no OHS 1955/MR 1962. Então, como no OHS 1955/MR 1962 o altar está realmente nu, sem nem mesmo a cruz, nesse ponto os reformadores, para a adoração ao Senhor Crucificado, reintroduziram uma Procissão com a Cruz que vem triunfalmente da sacristia. Isso foi inspirado no relato famoso da peregrina Egéria que narra os ritos da Semana Santa na Jerusalém dos primeiros séculos. O MR 1969 mantém essa procissão, e a mim parece uma "novidade" boa, que se insere no sadio desenvolvimento litúrgico de modo harmônico.

Outra procissão teve mudança. No MR 1952, assim como o Santíssimo Sacramento saiu solenemente do altar-mor para o monumento onde foi adorado após a Missa de Quinta-feira Santa, ou seja, na noite anterior, Ele deve voltar, com a mesma solenidade para o altar-mor antes de ser feita a Comunhão do celebrante, diáconos e subdiácono, e distribuída aos acólitos e ao povo. O OHS 1955/MR 1962 minimizou essa procissão, fazendo apenas uma procissão simples com o Santíssimo sendo trazido pelo subdiácono como nas Missas solenes comuns em que o Cristo, eventualmente, não esteja no tabernáculo do altar-mor. Em 1969, o disposto em 55/62 foi mantido. Uma futura reforma da reforma poderia recuperar o rito anterior a 1955. Se é perfeitamente possível criar a procissão da Cruz é perfeitamente possível também manter a procissão solene do Sacramento, para mostrar os dois movimentos: o de sumida do Senhor na Quinta-feira Santa, e Sua volta na Sexta-feira Santa, o que, aliás, vem de séculos anteriores. A supressão da incensação à hóstia consagrada, no OHS 1955/MR 1962, foi também, a meu ver, uma perda: pode-se e deve-se fazer luto na Sexta-feira Santa, mas não a ponto de deixar de prestar as devidas honras ao Senhor realmente presente no Sacramento da Eucaristia.

Também o OHS 1955/MR 1962 foi pioneiro em deixar que, na Sexta-feira Santa, o Pater Noster pudesse ser recitado pelo povo junto com o padre, o que não é nada errado, e andou bem a Comissão nesse sentido.

Sábado Santo

De vez que na manhã do Sábado Santo não mais se celebra a Solene Vigília Pascal, transferida para seu horário normal, à noite, para que entre Páscoa adentro, o dia todo do sábado pôde ser consagrado ao silêncio junto ao Cristo que desceu aos infernos. É uma espécie de santo velório o clima desse dia, não mais um "Sábado de Aleluia", mas um sábado de espera.

O breviário do Sábado Santo era recitado na Sexta-feira Santa (outro ponto obtuso) em razão de o sábado, em si, estar dedicado na manhã à Vigília, e o dia de sexta estar livre, uma vez que a Cerimônia da Paixão era feita pela manhã. Com a transferência da Vigília, então, se recuperou plenamente não só os horários naturais, como o sentido do Sábado Santo, com seu Ofício sendo recitado no dia próprio. A tarde de sexta, sem obrigação do Ofício de Sábado Santo antecipado, pôde ser consagrada às devoções populares tão caras às almas do fiéis, como a Via Sacra, a Procissão do Senhor dos Passos etc. A liturgia observante do veritas horarium, longe de instaurar o pernicioso liturgicismo, deu mais força à espiritualidade privada também.

Um ponto que aparentemente é negativo, mas que foi necessário e, portanto, se revela na verdade positivo, é a criação das Vésperas do Sábado Santo, com a consequente supressão das I Vésperas da Páscoa. Poderia soar negativamente que a solenidade mais importante da Cristandade seja a única a não ter I Vésperas. Todavia, pensemos: se o dia litúrgico começa com as I Vésperas, então, ao manter esse ofício, a Páscoa começaria antes da Solene Vigília Pascal. Isso porque, lembremos, a Vigília foi deslocada para seu horário natural, em atenção ao princípio do veritas horarium. Nos missais anteriores à reforma de Pio XII, a Solene Vigília Pascal é celebrada na manhã do Sábado Santo - daí ser conhecido como Sábado de Aleluia, até em um contrassenso com a Páscoa da Ressurreição que só ocorre no Domingo. Ora, se é celebrada pela manhã, então o Sábado Santo já é pascal e nada mais justo do que as Vésperas celebradas no sábado à tarde sejam as I Vésperas do Domingo da Páscoa. Ocorre que com a restauração piana da Vigília Pascal para a noite do Sábado Santo, manter as Vésperas do sábado como I Vésperas da Páscoa implicaria em começar a celebração pascal antes da própria Páscoa (que inicia na Vigília), diminuindo até mesmo o sentido da Vigília Pascal.

Assim, andou bem e de modo coerente o reformador de 1955, pois tal era consequência obrigatória da fixação da Solene Vigília Pascal à noite.

Domingo de Páscoa

A mudança do horário da Solene Vigília Pascal entrou antes do OHS 1955. Começou em 1951 com sua vigência em caráter experimental, culminando com a reforma de toda a Semana Santa em 1955. De toda a forma, a Vigília Pascal passa a ser o primeiro ato do Domingo de Páscoa e não mais um rito do Sábado Santo. A menção a "santa noite", "noite abençoada", "esplendor da  noite", expressão constantes no rito da Vigília Pascal, soava absurdamente descompassada em uma celebração diurna. Voltar à tradição medieval de se celebrar à noite era imperativo. Ademais, muitos trabalhavam no sábado pela manhã, visto que nem todos os países o adotam como feriado: a participação dos fiéis nessa Vigília tão importante seria facilitada com a transferência. Razões de ordem histórica, litúrgico-teológicas e mesmo pastorais moveram Pio XII a transferir a Vigília Pascal para seu horário original e mais adequado: a noite.

Bênção do fogo novo no rito tradicional

Até a reforma do Sábado Santo, em 1951, o canto Exsultet era usado para a bênção do Círio Pascal. Isso a partir da Idade Moderna. Nos missais, ele era realmente intitulado Benedictio Cerei. Entretanto, a oração específica para essa bênção, analisando-se o seu conteúdo e compulsando os sacramentários mais antigos, deveria ser o Veniat, o qual, por sua vez, ainda nos ritos pré-reforma de Pio XII, era usado, todavia, como bênção dos grãos de incenso a serem colocados no Círio, a Benedictio Granorum. Facilmente se constata que o tempo trouxe uma confusão das cerimônias: o texto da Proclamação da Páscoa, o Exsultet, se tornou, equivocadamente, de uso para a bênção do Círio Pascal, e a bênção do Círio - o Veniat - se tornou a bênção dos grãos de incenso. Além da nítida inobservância do significado dos textos e da irrealidade das cerimônias, notemos que os grãos de incenso são sempre os mesmos, todos os anos, o que nos leva a indagar da necessidade de anualmente os abençoar (ainda mais com um texto que, de fato, abençoa o Círio). Andou bem Pio XII, portanto.

Urge, sem embargo, recuperar a opção do uso do trikirion, como nos ritos pré-1955, abolido por Pio XII. Uma notável influência bizantina que se acomodou tranquilamente à liturgia romana. A abolição do trikirion foi feita para que não este e sim o Círio fosse levado em procissão. No uso do MR 1952, era o trikirion que se carregava em procissão e com ele o Círio, que permanecia junto ao presbitério, era aceso. Pio XII quis dar destaque ao Círio. Contudo, isso tornou obsoleta uma tradição secular e aposentou os triplos candelabros, que tinham até relação com o triplo canto do Lumen Christi... Uma boa saída na reforma da reforma seria um uso ad libitum pelo celebrante de quais velas levar na procissão, o Círio ou o trikirion.

Trikirion romano segundo o uso anterior à reforma de Pio XII, usado em procissão para acender o Círio

Quanto às leituras, antes de 1951, havia doze profecias na Vigília, e a Epístola e o Evangelho na Missa, totalizando quatorze lições. Em 1951 ad experimentum, mantido em 1955 por Pio XII e em 1952 pelo Beato João XXIII, mudou-se para quatro profecias, mantendo-se também a Epístola e o Evangelho, com seis leituras no total. Um visível retrocesso. A boa intenção da simplificação dos ritos não pode anular o sentido profundo que cada uma das profecias indicava. A Vigília pretende contar a história da salvação, apontando-a para Cristo Ressuscitado. A diminuição das leituras no OHS 1955/MR 1962, foi uma mutilação. Já em 1969, Paulo VI, vendo que isso era negativo, trouxe algumas profecias de volta, e de seis leituras da forma extraordinária ficamos com nove na forma ordinária (sete profecias, a Epístola e o Evangelho). O rito de 1969 é, pois, mais completo e tradicional, nesse ponto, do que o rito de Pio XII e João XXIII. Porém, não suficiente. Em uma reforma da reforma, com tendência à unificação do rito romano, faz-se necessário retomar o esquema antigo, das doze profecias: ou seja, aumenta-se o que já temos hoje no rito moderno, e não se retrocede ao rito tridentino de 1962, mas ao pré-1955.

Depois das profecias, ainda na Vigília, e antes da Missa em sentido estrito, havia, pré-1951, uma bênção da água batismal, eventuais batismos e o canto da ladainha de todos os santos. O Batismo e a bênção da água são tradicionais na Páscoa, data em que, desde os tempos mais antigos, se celebrava esse sacramento para os catecúmenos admitidos na Quaresma (ritos, aliás, perdidos com o tempo e sabiamente revigorados pela reforma de Paulo VI, MR 1969, com seu Rito da Iniciação Cristã de Adultos). Mudou-se o esquema dessas cerimônias com Pio XII e novamente com Paulo VI. Para melhor entendimento de nossa proposta, vejamos como era a ordem em cada um dos ritos:

ANTES DA REFORMA DE PIO XII EM 1951
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA DO SÁBADO SANTO EM 1951 (OHS 1955/MR 1962)
- 1ª parte da Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- 2ª parte da Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

REFORMA LITÚRGICA DE PAULO VI (MR 1969)
- Ladainha
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo

Não há motivo algum para que, no na reforma da Vigília em 1951, portanto na OHS 1955/MR 1962, a ladainha seja abruptamente cortada em duas partes. Muito menos para, no MR 1969, ela ser deslocada para antes da bênção da água batismal e do Batismo. O lugar tradicional era depois dessa bênção e desse Batismo, como súplica pelos recém-batizados e por toda a Igreja. Antonelli informa que, em tempos imemoriais, os Batismos na Vigília eram acompanhados pela ladainha que iniciava antes do sacramento, era interrompida, e continuava após o Batismo. Todavia, pensamos que a unificação da ladainha é algo mais natural e essa unificação processou-se pelo princípio do desenvolvimento harmônico da liturgia. Uma eventual e futura reforma da reforma deve restaurar o uso antigo, pré-1951, nesse aspecto: ladainha como última cerimônia, e durante a qual se mudam os paramentos.

A introdução da Renovação das Promessas do Batismo, embora novidade, parece ser um desenvolvimento harmônico, de vez que não conflita com o espírito da celebração e não se trata de algo artificial. A Páscoa é a festa do Batismo. Nela se benzem a água lustral, se fazem batismos, se lembra a Ressurreição de Cristo - e o Batismo de cada um é uma participação nessa Páscoa do Senhor. Nada mais justo do que renovar nossos votos batismais exatamente na Páscoa. Foi bem o OHS 1955/MR 1962 que criou a cerimônia, e o MR 1969 que a manteve.

Para que, visualmente, tenhamos bem clara a nossa proposta, compare o leitor os esquemas acima com o que pensamos:

REFORMA DA REFORMA
- Bênção da água batismal
- Batismo
- Renovação das promessas do Batismo
- Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos

Na prática, é o rito anterior a 1951 com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo, entre o próprio Batismo e a ladainha.

A Bênção da Pia Batismal, antes de 1951/1955/1952, era feita no batistério, onde fica a própria pia. O OHS 1955/MR 1962 moveu o local para a presbitério. Já o MR 1969 restaurou a bênção no batistério, ao menos como opção. Não faz sentido benzer a pia sem pia - trocando-a por um balde, jarra ou outro recipiente. Faz-se necessário retornar aos ritos pré-1951.

Até 1951, como vimos, a Solene Vigília Pascal era celebrada na manhã do Sábado Santo. Assim, após a Vigília em sentido estrito, havia a Missa, e, por fim, antes do Ite Missa Est, as I Vésperas da Páscoa, reduzidas (salmo com sua antífona, e Magnificat com sua antífona). Isso porque Vésperas são rezadas à tarde, sendo pois a primeira hora maior após a Missa da Solene Vigília Pascal. Com a mudança desta para seu veritas horarium, tornou-se inconcebível que após a Missa se rezassem Vésperas. A hora maior correspondente ao fim da Missa no novo horário seria Laudes. Assim, à ordem anterior - Vigília, Missa, Vésperas -, substituiu-se um novo esquema: Vigília, Missa, Laudes. E Laudes reduzidas, como Vésperas anteriormente: salmo com sua antífona, e Benedictus com sua antífona: o salmo, aliás, foi mantido, e as antífonas também, só sendo mudado o Cântico Evangélico, que é específico de cada hora. O texto, então, é o mesmo, apenas com mudança do Cântico. As Matinas se tornaram dispensadas por quem celebra ou assiste a Solene Vigília Pascal, pois ocupa seu mesmo horário.

A crítica à falta de I Vésperas justamente na Páscoa, a festa das festas, já foi por nós enfrentada acima. Resta a crítica à falta do Te Deum, ocasionada pela não celebração das Matinas por quem assiste ou celebra a Vigília Pascal. O Te Deum ou Hino Ambrosiano é cantado ou recitado em todos os Domingos, exceto da Quaresma e em todas as festas e solenidades (antigamente, festas de segundo e primeiro grau). Ora, se a Páscoa é a solenidade das solenidades e além disso é dominical, acabar com o Te Deum nela é terrível! Até porque o Te Deum permanece para aqueles que, não tendo celebrado ou assistido a Solene Vigília Pascal, rezam as Matinas no breviário. Todavia, o alegado impasse é fácil de resolver: introduza-se o Te Deum ao fim da Missa, seja antes ou depois das Laudes.

Assim, nossa proposta para um rito romano unificado no tocante à Solene Vigília Pascal seria: horário como no atualmente em qualquer das duas formas, ordinária ou extraordinária (visto que o OHS 1955/MR 1962 e o MR 1969 coincidem nisso); paramentos e suas cores como no rito tradicional (ou seja, os mesmos tanto no MR 1952, quando na reforma ad experimentum de 1951 e mantida na OHS 1955/MR 1962); doze profecias como no MR 1952 (melhor do que as seis do MR 1969 e bem melhor do que as quatro do OHS 1955/MR 1962); esquema batismal do rito do MR 1952, com a introdução da Renovação das Promessas do Batismo do OHS 1955/MR 1962 e MR 1969 (resultando em Bênção da Água Batismal, Batismo, Renovação das Promessas do Batismo, Ladainha, durante a qual o padre, o diácono e o subdiácono vão à sacristia mudar os paramentos de roxos para brancos); introdução do Te Deum no fim da Missa; Laudes.

São meras sugestões, mas servem para iniciarmos um diálogo acerca dessa semana tão importante no calendário cristão e remodelá-la com a preservação das reformas de Pio XII e Paulo VI resgatando o uso anterior de séculos.

Tudo para as celebrações do Jubileu da Misericórdia

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O Papa Francisco anunciou no dia 13 de março na Basílica de S. Pedro que decidiu proclamar um “jubileu extraordinário” centrado na “misericórdia de Deus” e que terá início a 8 de dezembro deste ano de 2015 e percorrerá todo o ano de 2016:
“Decidi convocar um Jubileu Extraordinário que tenha o seu centro na Misericórdia de Deus. Será um Ano Santo da Misericórdia. (…) Este Ano Santo iniciar-se-á na próxima Solenidade da Imaculada Conceição e concluir-se-á a 20 de novembro de 2016.”
O Ano Santo Jubilar da Misericórdia terá início com a abertura da Porta Santa na Basílica de S. Pedro a 8 de dezembro de 2015, na Solenidade da Imaculada Conceição e será encerrado no dia 20 de novembro de 2016, na Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo. 
A abertura do próximo Jubileu coincidirá com o cinquentenário do encerramento do Concílio Ecuménico Vaticano II, que aconteceu em 1965 e reveste este ano santo de um significado especial, encorajando a Igreja a prosseguir a obra iniciada no Concílio. 
No Jubileu, as leituras para os domingos do tempo comum serão extraídas do Evangelho de Lucas, chamado “o evangelista da misericórdia”. Algumas das parábolas mais conhecidas escritas por ele são as da ovelha perdida, a da moeda perdida e a do pai misericordioso.
O Papa Francisco enviou uma carta ao Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, Arcebispo Rino Fisichella, responsável pela organização do Jubileu da Misericórdia, na qual descreve as diversas formas em que será possível obter indulgências durante o Ano Santo. Veja abaixo: 
Peregrinação
Para viver e obter a indulgência, os fiéis são chamados a realizar uma breve peregrinação rumo à Porta Santa, aberta em cada Catedral ou nas igrejas estabelecidas pelo Bispo diocesano, e nas quatro Basílicas Papais em Roma, como sinal do profundo desejo de verdadeira conversão.
“Estabeleço, igualmente, que se possa obter a indulgência nos Santuários onde se abrir a Porta da Misericórdia e nas igrejas que tradicionalmente são identificadas como Jubilares. É importante que este momento esteja unido, em primeiro lugar, ao Sacramento da Reconciliação e à celebração da santa Eucaristia com uma reflexão sobre a misericórdia”, recordou o Papa.
“Será necessário acompanhar estas celebrações com a profissão de fé e com a oração por mim e pelas intenções que trago no coração para o bem da Igreja e do mundo inteiro”, acrescentou Francisco.
Enfermos
Sobre aqueles que, por diversos motivos, estiverem impossibilitados de ir até à Porta Santa, sobretudo os doentes e as pessoas idosas e sós, que muitas vezes se encontram em condições de não poder sair de casa, o Papa garantiu:
É preciso “viver com fé e esperança jubilosa este momento de provação, recebendo a comunhão ou participando na santa Missa e na oração comunitária, inclusive por meio dos vários meios de comunicação – que será para eles o modo de obter a indulgência jubilar”, afirmou o Papa.
Presos
O pensamento de Francisco dirige-se também aos encarcerados:
“O Jubileu constituiu sempre a oportunidade de uma grande amnistia, destinada a envolver muitas pessoas que, mesmo merecedoras de punição, todavia tomaram consciência da injustiça perpetrada e desejam sinceramente inserir-se de novo na sociedade, oferecendo o seu contributo honesto”, destacou o Pontífice.
E fez um pedido: “A todos eles chegue concretamente a misericórdia do Pai que quer estar próximo de quem mais necessita do seu perdão”.
O Papa destacou ainda que os presos “poderão obter a indulgência, e todas as vezes que passarem pela porta da sua cela, dirigindo o pensamento e a oração ao Pai, que este gesto signifique para eles a passagem pela Porta Santa, porque a misericórdia de Deus, capaz de mudar os corações, consegue também transformar as grades em experiência de liberdade”.
Misericórdia
Ao recordar o seu pedido para que “a Igreja redescubra neste tempo jubilar a riqueza contida nas obras de misericórdia corporais e espirituais”, o Papa recordou que a experiência da misericórdia torna-se visível no testemunho de sinais concretos como o próprio Jesus nos ensinou”.
“Todas as vezes que um fiel viver uma ou mais destas obras pessoalmente obterá, sem dúvida, a indulgência jubilar. Daqui o compromisso a viver de misericórdia para alcançar a graça do perdão completo e exaustivo pela força do amor do Pai que não exclui ninguém. Portanto, tratar-se-á de uma indulgência jubilar plena, fruto do próprio evento que é celebrado e vivido com fé, esperança e caridade”.
Falecidos
O Papa explicou ainda que a indulgência jubilar poderá ser obtida também para quantos faleceram.
“A eles estamos unidos pelo testemunho de fé e caridade que nos deixaram. Assim como os recordamos na celebração eucarística, também podemos, no grande mistério da comunhão dos Santos, rezar por eles, para que o rosto misericordioso do Pai os liberte de qualquer resíduo de culpa e possa abraçá-los na beatitude sem fim”.
Remetendo ao seu magistério apresentado na Encíclica Laudato si, Francisco recordou que um dos graves problemas do nosso tempo é certamente a alterada relação com a vida: “uma mentalidade muito difundida já fez perder a necessária sensibilidade pessoal e social pelo acolhimento de uma nova vida”.
Aborto
Neste contexto caótico, Francisco afirmou que “o drama do aborto é vivido por alguns com uma consciência superficial, quase sem se dar conta do gravíssimo mal que um gesto semelhante comporta. Muitos outros, ao contrário, mesmo vivendo este momento como uma derrota, julgam que não têm outro caminho a percorrer”.
O Papa dedicou atenção especial às mulheres que recorreram ao aborto. “Conheço bem os condicionamentos que as levaram a tomar esta decisão. Sei que é um drama existencial e moral. Encontrei muitas mulheres que traziam no seu coração a cicatriz causada por esta escolha sofrida e dolorosa”.
O que aconteceu é profundamente injusto – sublinhou o Papa – “contudo somente a sua verdadeira compreensão pode impedir que se perca a esperança. O perdão de Deus não pode ser negado a quem quer que esteja arrependido, sobretudo quando com coração sincero se aproxima do Sacramento da Confissão para obter a reconciliação com o Pai”.
Absolvição do pecado do aborto
Também por este motivo – destacou o Pontífice – “decidi conceder a todos os sacerdotes para o Ano Jubilar a faculdade de absolver do pecado de aborto quantos o cometeram e, arrependidos de coração, pedirem que lhes seja perdoado”.
Ao estender a absolvição do aborto a todos os sacerdotes, o Papa recomendou: “os sacerdotes devem se preparar para esta grande tarefa sabendo conjugar palavras de acolhimento genuíno com uma reflexão que ajude a compreender o pecado cometido, e indicar um percurso de conversão autêntica para conseguir entender o verdadeiro e generoso perdão do Pai, que tudo renova com a sua presença”.
Fraternidade São Pio X
Nas suas últimas considerações, o Papa dirigiu um pensamento aos fiéis que “por diversos motivos sentem o desejo de frequentar as igrejas oficiadas pelos sacerdotes da Fraternidade São Pio X”.
“Este Ano Jubilar da Misericórdia não exclui ninguém”, – assegurou o Pontífice. “De diversas partes, alguns irmãos Bispos referiram-me acerca da sua boa fé e prática sacramental, porém unida à dificuldade de viver uma condição pastoralmente árdua”, explicou.
“Confio que no futuro próximo se possam encontrar soluções para recuperar a plena comunhão com os sacerdotes e os superiores da Fraternidade”, auspiciou Francisco.
“Entretanto, movido pela exigência de corresponder ao bem destes fiéis, estabeleço por minha própria vontade que quantos, durante o Ano Santo da Misericórdia, se aproximarem para celebrar o Sacramento da Reconciliação junto dos sacerdotes da Fraternidade São Pio X, recebam validamente e licitamente a absolvição dos seus pecados”.




Clique aqui para saber mais! 

Perguntas e respostas sobre o Natal

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Dom Henrique Soares da CostaBispo Diocesano de Palmares - PE, nos deu, em sua página no Facebook, uma catequese sobre o real significado do Natal que merece e muito ser compartilhado!






Que significa celebrar o Natal?

Significa celebrar NA LITURGIA, memorial do culto cristão, instituído por Jesus nosso Senhor, o mistério e a graça da Sua piedosa Vinda, da Sua graciosa Manifestação na nossa natureza humana e no nosso mundo, cumprindo as promessas feitas por Deus a Israel.


Que é esse MEMORIAL instituído pelo Senhor?

No Israel da Antiga Aliança, toda a obra salvífica do Senhor era celebrada anualmente nas festas instituídas pelo Senhor Deus: a Páscoa, Pentecostes, as Tendas, o Kippur, a Dedicação do Templo...
Tudo isto preparava para o Cristo nosso Senhor.

Ele veio, realizou a salvação e na noite em que foi entregue instituiu o Sacramento do Seu Corpo e do Seu Sangue, Memorial sagrado de tudo quanto Ele fez por nós, cumprindo tudo quanto Deus havia prometido.
Assim, no Sacramento da Ceia, no santo Sacrifício Eucarístico, toda a salvação torna-se presente: a criação do mundo, a história santa do antigo Israel, os atos e gestos salvíficos do Senhor, as graças dadas aos cristãos, a vida da Igreja e até mesmo a Sua Vinda no final dos tempos.

NA LTURGIA, pela força potente do Santo Espírito do Cristo imolado e ressuscitado, tudo, tudo absolutamente, em Cristo Senhor, torna-se contemporaneamente, simultaneamente presente, de modo que, para um cristão, celebrar os santos mistérios litúrgicos é entrar realmente e verdadeiramente em contato com o Mistério da nossa salvação e com cada um dos mistérios especificamente.

NA LITURGIA, toda a obra da salvação é-nos dada realmente: "Fazei isto em memória ( = memorial, zikaron, isto é, celebração ritual, eficaz e presentiiacante ) de Mim!"
O Natal é, então, celebração do quê?

É real e verdadeira celebração da Manifestação, da Vinda do Senhor na nossa carne mortal.
Celebrar a Eucaristia no Natal é tornar realmente presente sobre o Altar como oferta ao Pai no Espírito Santo o Cordeiro imolado e ressuscitado no Qual tudo, absolutamente tudo da nossa salvação se encontra presente!
Cristo é tudo, resume tudo, sintetiza tudo, atrai tudo, realiza tudo! Nele, eucarístico, está a criação do mundo,
Nele, toda a história de Israel,
Nele o Natal,
Nele a Páscoa,
Nele a vida da Igreja,
Nele a Glória dos santos,
Nele o Dia Final, na consumação de tudo!


Cada mistério da nossa fé que celebramos na Liturgia coloca-nos realmente, verdadeiramente em contato com a graça que nos veio daquele mistério.
Quem celebra as Eucaristias do tempo sagrado do Natal entra em contato real com a graça da Vinda do Salvador!

Este é um luxo, uma graça, uma elegância de Deus que somente recebe quem participa da Liturgia e só na Liturgia é dado!

Perguntas e respostas sobre o Natal - IV

O Natal é aniversário de Jesus?

De modo algum!

Jamais a Igreja pensou numa coisa dessas!


Na Liturgia não se diz: Jesus nasceu há 2000 anos! Diz-se: "Hoje nasceu para vós um Salvador: Cristo, o Senhor!"

A Liturgia, na potência do Espírito, coloca-nos no HOJE de Deus, coloca-nos em contato direto com a graça salvífica do acontecimento que, ocorrido uma vez por todas no passado, torna-se eternamente presente na Glória do Céu, em Cristo, único e eterno sacerdote, que na Tenda eterna do Céu ministra a Liturgia eterna que torna-se presente sobre o Altar da Igreja!

No Natal nunca, de modo algum, por motivo algum, deve-se cantar "Parabéns" para Jesus! Seria algo totalmente contrário ao significado do Natal cristão!

Cristo nasceu no dia 25 de dezembro?

Não, com certeza. E os cristãos sempre souberam disso!
Desde o início, esta festa é celebrada em datas diferentes pela Igreja no Oriente e no Ocidente: no Oriente, a 6 de janeiro; no Ocidente, a 25 de dezembro.

Eis os motivos do 25 de dezembro:

Segundo antigas tradições, o mundo teria sido criado no dia 25 de março. Neste dia também se celebrava a Festa da Anunciação de Gabriel à Virgem Maria, início da recriação de todas as coisas em Cristo: Ele, vindo ao nosso mundo no seio da Virgem, recriou o mundo envelhecido e caduco pelo pecado. Assim, o 25 de dezembro ocorre nove meses após a celebração da concepção.

Mas, há outro motivo. Depois de o cristianismo já ter se espalhado no Império Romano e os imperadores terem aceitado a fé cristã, surgiu um que apostatou da fé e quis restaurar o paganismo em Roma: Juliano, o Apóstata! Ele fez o possível para restaurar a festa do deus Sol Vencedor em Roma, que ocorria no dia 25 de dezembro, solstício do inverno. Exatamente a época em que o sol começa a ficar mais forte e fazer os dias começarem a ficar mais longo, vencendo o frio e as trevas do inverno. Esta seria a vitória do deus sol sobre as trevas!

Os cristão reagiram fortemente, celebrando aí não o deus sol, mas o verdadeiro Sol da justiça, Luz do Alto que nos veio visitar, vencendo as trevas da idolatria, do pecado e da morte! O verdadeiro Sol Invicto é o Cristo nosso Deus, que vindo à nossa terra, tudo iluminou com a Sua piedosa Manifestação.

Assim, a data do Natal estabeleceu-se de vez no século IV para toda a Igreja do Oriente e do Ocidente. No dia 6 de janeiro, a Igreja passou a celebrar a Epifania do Senhor. Mas, isto é outra história..

Seria realmente errado ver o Natal como aniversário de Jesus?

Totalmente.

  1.  Comemora-se o aniversário contando os dias de acontecimentos ou pessoas neste tempo. Jesus é o Senhor, entrou na Eternidade, é Senhor do tempo; não mais está preso ao nosso tempo, mas preenche todos os tempos: "A Ele o tempo e a eternidade˜!" - diz a Igreja na Vigília Pascal.
  2. Comemora-se o aniversário de alguém para festejar sua entrada nesta vida. Jesus entrou nesta vida, neste mundo, por humilhação, por esvaziamento de Si mesmo: sendo rico fez-se pobre, sendo Deus fez-Se homem, sendo Senhor fez-Se servo para nos salvar. Na verdade o nascimento de Jesus segundo a carne é um gesto de humildade e humilhação por amor!
  3. O nascimento definitivo para um cristão é o nascimento para a Glória: dos santos, celebra-se não o dia do nascimento para este mundo, mas o Die Natalis para o Céu, o dia da morte para este mundo.
  4. E o mais importante: NENHUMA celebração da Liturgia é de aniversário; nunca é uma recordação do passado que ficou lá trás, mas é um torna-se realmente presente de um fato ou evento salvífico que se torna atual e atuante na vida dos que celebram os santos mistérios na Liturgia. É uma pena que a deficiência de catequese tenha feito os cristãos perderem isto, que no início da Igreja era claro para todos os filhos da Igreja!
  5. Recordemos que o aniversário vai distanciando cada vez mais da origem, do fato inicial recordado. Com o Senhor Jesus não é assim: Ele nos é contemporâneo em todos os Seus mistérios. Ele está presente nos nossos pobres "hojes" e enche os dias da nossa vida com o Seu Hoje eterno entrado no tempo em cada Liturgia. Alguns Padres da Igreja falam em aniversário do Natal, ou seja, no sentido antigo, da "volta do ano" na qual o mistério de sempre é novamente celebrado sem nunca envelhecer ou se afastar da origem! A origem dos acontecimentos salvíficos não está no passado, mas no Altar da Eucaristia!


O que é essencial para um cristão celebrar o Natal?

O que é essencial para qualquer festa cristã: participar da santa Liturgia eucarística.
É na Eucaristia que todo o mistério da nossa fé, o mistério da nossa salvação, da criação à Parusia do Senhor, faz-se presente: "Eis o Mistério da fé!" Isto é: ali, no Cordeiro imolado e ressuscitado, tudo faz-se contemporâneo na potência do Espírito!

Na Eucaristia tudo é celebrado na vida cristã e na vida do cristão! Sem a participação na Eucaristia é impossível ser cristão plenamente!

A Liturgia para o Natal fala das "festas que se aproximam". Do que se trata?

O Natal litúrgico (e este é o que importa) não é um dia, mas um tempo: o tempo no qual a Igreja celebra a Manifestação, a Vinda, o Aparecimento do Salvador na nossa carne mortal.

Este tempo é celebrado com cinco festas:

1. A Natividade
2. A Sagrada Família
3. Santa Maria Mãe de Deus
4. A Epifania
5. O Batismo do Senhor

Todas estas festas, cada uma com um aspecto próprio, celebram um só Mistério: o Verbo Eterno, Filho Eterno do Eterno Pai, fez-Se verdadeiramente homem de Maria a Virgem para que, assumindo o humano salvasse a humanidade e assumindo toda a criação, salvação todo o universo!

Há ainda mais uma festa que não pertence ao Tempo do Natal, mas está ligada ao ciclo do Natal: A Apresentação do Senhor, no dia 2 de fevereiro. É uma festa importantíssima do ponto de vista teológico! Infelizmente, a nossa catequese litúrgica é muito fraca e essa festa fica na penumbra...

Qual é a Missa principal do Natal?

A Igreja celebra o Dia do Natal com quatro missas, isto é, quatro formulários diferentes de missas: orações próprias e leituras próprias para cada uma, todas preciosas, todas belíssimas:

  1. A Missa da Vigília, celebrada na tarde do dia 24.
  2. A Missa do Galo, celebrada na Noite Santa. Chama-se do galo porque a antiga rubrica prescrevia que deveria iniciar-se ao cantar do galo. Hoje, por vários motivos, é celebrada quando o sol já se pôs. No entanto, quanto mais perto da meia-noite, melhor.
  3. A Missa da Aurora, celebrada sempre de madrugada, logo ao sol nascer.
  4. A Missa do Dia, celebrada já com o sol alto. É celebrada a qualquer hora do dia 25.


Dessas, a menos importante do ponto de vista litúrgico, é a da vigília. As mais importantes são a Missa da Noite e a Missa do Dia. Quem participa de qualquer uma delas, celebra o Natal. Contudo a Missa da Vigília não dispensa de participar de uma das outras três.




Proibida a comunhão na mão em diocese boliviana

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O indulto que autoriza a comunhão na mão foi suprimido na Diocese de Oruru, Bolívia. O decreto promulgado por Dom Bialasik estabelece que, devido às profanações que têm ocorrido naquela diocese, os fiéis deverão comungar somente na boca, a práxis tradicional da Igreja.

A justificativa dada por Dom Bialasik poderia facilmente ser aplicada em praticamente todas as dioceses brasileiras. Sabemos que a crença na Presença Real de Nosso Senhor na Eucaristia tem-se enfraquecido, e que mesmo em muitos daqueles que crêem falta a noção de que as pequenas partículas que por ventura restem em suas mãos ao comungar ainda são o Seu Sacratíssimo Corpo e não devem ser perdidas. Que mais bispos tenham a coragem de Dom Bialasik!

O decreto, que traduzimos ao português, pode ser lido abaixo.

***
Decreto Comunhão na Boca - Dom Bialasik, Oruro, Bolívia

DECRETO SOBRE A RECEPÇÃO DA SANTA COMUNHÃO NA BOCA

Nº 001/16

DOM KRZYSZTOF J. BIALASIK

PELA GRAÇA DE DEUS E DA SANTA SÉ APOSTÓLICA

BISPO DA DIOCESE DE ORURO - BOLÍVIA

CONSIDERANDO, que a Lei da Igreja estabelece:
  1. Que receber a comunhão na boca é a lei universal da Igreja, tal e como nos recorda a Instrução Memoriale Domini e Immensae Caritatis (29 de maio de 1968: AAS 61, 1969, 541-546; 29 de janeiro de 1973: AAS 65, 1973, 264-271; cf. também a instrução Redemptionis Sacramentum, sobre algumas coisas que se devem observar e evitar acerca da Santíssima Eucaristia, emitida em 25 de março de 2004, n. 92; cf. Missale Romanum, Institutio Generalis, n. 161.), onde se consagra como regra geral a forma tradicional de distribuição na boca, e o faz "não somente porque se funda numa tradição de muitos séculos, mas sobretudo porque exprime e significa a reverência dos fiéis para com a Eucaristia" (par. 8), mas também porque "é mais eficazmente assegurado que a Sagrada Comunhão seja distribuída com a reverência, o decoro e a dignidade devidos; que seja evitado todo perigo de profanação das espécies eucarísticas" (par. 10).
  2. Que a comunhão na mão é permitida somente como um indulto a tal lei universal, que a Santa Sé pode outorgar caso-a-caso a uma Conferência Episcopal quando ela o pede (Congregação para o Culto Divino, prot. N. 720/85: Notificação acerca da comunhão na mão, de 3-IV-1985).
  3. Que a ordenação da sagrada liturgia depende exclusivamente da autoridade da Igreja, que em cada diocese é exercida pelo Bispo diocesano (cânon 838, par. 1, Código de Direito Canônico), a quem corresponde dar normas obrigatórias em matéria litúrgica para todos os fiéis da porção da Igreja a ele confiada (cânon 838, par. 3, Código de Direito Canônico; cfr. Instrução Redemptoris Sacramentum, n. 19), atendendo às necessidades concretas da mesma e ao bem das almas.
  4. Que tanto a Instrução Redemptoris Sacramentum (n. 92) como a Sagrada Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos (dubium: notitiae 35 (1999) pp. 160-161.) insistem em que "se existe perigo de profanação, não se distribua aos fiéis a Comunhão na mão".
  5. VISTO que insistir na prática geral da comunhão na boca é mais conveniente nesta Diocese, não apenas por ajudar na recepção mais devota da Eucaristia e sustentar a fé na presença real e substancial de Jesus Cristo na mesma, senão também por evitar as profanações do Corpo de Cristo, posto que se tem notado ultimamente que há pessoas que não consomem a Sagrada Forma no momento de recebê-la e desejam levá-La para fora do templo com fins desconhecidos (cf. minha homilia da missa de 16 de agosto de 2015).

DECRETO

REAFIRMAMOS PARA A DIOCESE DE ORURO A OBRIGAÇÃO DE SEGUIR A LEI GERAL DA IGREJA DE RECEBER A COMUNHÃO NA BOCA, NÃO SENDO APLICÁVEL O INDULTO DE PODER COMUNGAR NA MÃO.

Comunique-se e publique-se a quem se faz necessário, e seja arquivado. Dado na Sede Episcopal, na Solenidade da Epifania do Senhor, em 06 de janeiro do Ano do Senhor de 2016.

Revmo. Pe. Ludgardo Carlos Ortíz
Chanceler da Diocese de Oruro

Dom Krzysztof Janusz Bialasik, SVD
Bispo da Diocese de Oruro

Perguntas e respostas sobre a Quaresma

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O que é a Quaresma? 


“A Quaresma é um tempo de jejum e de penitência, instituído pela Igreja por tradição apostólica” (São Pio X, Catecismo Maior, 35).

Para que fim foi instituída a Quaresma? 


“A Quaresma foi instituída: 1° Para nos fazer conhecer a obrigação que temos de fazer penitência em todo o tempo da nossa vida, da qual, segundo os Santos Padres, a Quaresma é a figura; 2° Para imitar de algum modo o rigoroso jejum de quarenta dias que Jesus Cristo fez no deserto; 3° Para nos preparar por meio da penitência para celebrar a festa da Páscoa” (Idem, 36).

 Por que se chama dia das Cinzas o primeiro dia da Quaresma?


 “Chama-se o primeiro dia da Quaresma dia das Cinzas, porque a Igreja impõe naquele dia as cinzas na cabeça dos fiéis” (Idem, 37). A Igreja no-lo indica nas orações recitadas por seus ministros: “Deus, que não quereis a morte, mas a conversão dos pecadores apiedai-vos da fragilidade humana e abençoai estas cinzas que pretendemos colocar sobre a nossa cabeça, como sinal de humildade cristã por nós professada, e em sinal de penitência para obtermos perdão”. É, pois, a penitência que a Igreja nos quer ensinar pela cerimônia deste dia. Já no Antigo Testamento os homens cobriam-se de cinzas para exprimir sua dor e humilhação (Jó 42, 6). Nos primeiros séculos da Igreja, os penitentes públicos apresentavam-se nesse dia ao bispo ou penitenciário, pediam perdão revestidos de um saco; e como sinal da sua contrição, cobriam a cabeça de cinzas. Mas como todos os homens são pecadores, diz Santo Agostinho, estenderam essa cerimônia a todos os fiéis, para lhes recordar o preceito da penitência. Não havia exceção alguma: pontífices, bispos, sacerdotes, reis, almas inocentes, todos se submetiam a essa humilhante expressão de arrependimento.

Por que impõe a Igreja as cinzas no princípio da Quaresma? 


“A igreja, no princípio da Quaresma, impõe as cinzas a fim de que nós, lembrando-nos de que somos feitos de pó, e de que após a morte nos havemos de reduzir a pó, nos humilhemos e façamos penitência dos nossos pecados, enquanto temos tempo” (Idem, 38). Entremos nos mesmos sentimentos. Deploremos as nossas faltas ao recebermos das mãos do ministro de Deus as cinzas bentas pelas orações da Igreja. Quando o sacerdote nos disser: “Lembra-te que és pó e em pó te há de tornar”, humilhemos o nosso espírito pelo pensamento da morte, que, reduzindo-nos ao pó, nos porá sob os pés de todos. – Assim dispostos, longe de lisonjearmos o nosso corpo destinado à dissolução, decidir-nos-emos a tratá-lo com dureza, a maltratar o nosso paladar, os nossos olhos, os nossos ouvidos, a nossa língua, todos os sentidos; a observar, o mais possível, o jejum e abstinência que a Igreja nos prescreve.

Com que disposição devemos receber as cinzas?


 “Devemos receber as cinzas com o coração contrito e humilhado, e com a santa resolução de passar a Quaresma em obras de penitência” (Idem, 39). A Igreja termina a bênção das cinzas por uma exortação aos fiéis: admoesta-nos a não nos contentarmos com sinais externos de penitência, mas a lhe bebermos o espírito e os sentimentos. Jejuemos, diz ela, como o Senhor deseja, mas acompanhemos o jejum com lágrimas de arrependimento, prostremo-nos diante de Deus e deplorando a nossa ingratidão na amargura dos nossos corações. Mas essa contrição, para ser proveitosa, deve ser acompanhada de confiança. Por isso a Igreja acrescenta, a seguir, que nosso Deus é cheio de bondade e misericórdia, sempre pronto a perdoar-nos. Forte motivo este para esperarmos firmemente a remissão das nossas faltas, se delas nos arrependermos! Deus não despreza jamais um coração contrito e humilhado.

 Que devemos fazer para passar bem a Quaresma, segundo o espírito da Igreja? 


“Para passar bem a Quaresma, segundo o espírito da Igreja, devemos fazer quatro coisas: 1ª. Observar exatamente o jejum e mortificar-nos não só nas coisas ilícitas e perigosas, mas ainda, quanto pudermos, nas coisas lícitas, como seria moderar-nos nas recreações; 2ª. Fazer orações, esmolas e outras obras de caridade cristã para com o próximo, mais do que em qualquer outro tempo; 3ª Ouvir a Palavra de Deus, não por mero costume ou curiosidade, mas com o desejo de pôr em prática as verdades que ouvirmos; 4ª Ter grande cuidado em nos prepararmos para a confissão, para tornar mais meritório o jejum, e para nos dispormos melhor para a Comunhão pascal “(Idem, 40).

Fonte: Devocionário Quaresmal (Padre Rafael Lugão -

Orações típicas da Quaresma

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Oração penitencial:


"Abre-me as portas da penitência, Senhor, Fonte de vida, pois desde a aurora, meu espírito que
leva o templo de meu corpo todo manchado de pecado está voltado para Teu Templo santo! Em
Tua infinita bondade, purifica-me por Tua doce misericórdia. Aplana-me o caminho da salvação,
ó Mãe de Deus! Pois sujei minha alma com pecados infames dissipando minha vida na negligência. Por Tua intercessão, salva-me de toda impureza! Quando medito, miserável, sobre a multidão de
minhas más ações fico aterrorizado ao pensar no temível dia do Julgamento. Porém confiando em Tua bondade misericordiosa, chamo a Ti, como David: Tem piedade de mim, ó Deus segundo Tua imensa misericórdia!

Oração do 1º dia de Quaresma:


"Comecemos alegremente o Tempo do jejum e lancemo-nos no combate espiritual, guardemos nossa alma do mal e purifiquemos nossa carne. Jejuemos de toda paixão assim como de alimento, e que
nossas delícias sejam as virtudes do Espírito. E que praticando-as com perseverança e amor possamos todos nós conseguir ver a venerável

Paixão de Cristo, e, no júbilo espiritual, a Santa Páscoa." Oração de Quaresma de São Efrem o Sírio:
"Senhor e Mestre da minha vida afasta de mim o espírito de preguiça, o espírito de dissipação, de domínio e de vã loquacidade! Concede a Teu servo o espírito de temperança, de humildade, de
paciência e de caridade. Sim, Senhor e Rei, concede-me que eu veja as minhas faltas e que não julgue a meu irmão, pois Tu és bendito pelos séculos dos séculos. Amém."

Oração ao Anjo no Horto


Eu te saúdo, santo Anjo, que consolastes Jesus no Monte das Oliveiras. Tu consolastes meu Senhor
Jesus Cristo em Sua agonia.

Contigo louvo a Santíssima Trindade, que te escolheu dentre todos os Anjos, para consolar e
fortalecer a quem é Consolo e Fortaleza de todos os aflitos e que diante dos pecados do mundo e, de
modo especial, diante dos meus pecados, repleto de dor, caiu no solo.

Pela honra que recebeste e pela disponibilidade, humildade e amor com que ajudaste a santa humanidade de meu Salvador Jesus eu te peço um arrependimento perfeito de meus pecados. Consola-me na tristeza que atualmente me aflige E em todas as outras penas que vão
sobrevir, especialmente na hora da minha agonia. Amém. (SS. Bento XV).

Oração a Nosso Senhor Agonizante no Getsêmani


Ó meu Jesus, Divino Redentor, leva-mecontigo e com os Teus três caros Apóstolos,
para assistir à Tua agonia no Horto do Getsémani. Advertida pela doce repreensão que Tu deste a Pedro e aos outros Discípulos adormecidos, quero vigiar, ao menos, uma hora contigo no Getsémani; quero sentir ao menos uma dilaceração do Teu coração agonizante, um hálito da Tua
respiração aflita. 

Quero fixar o meu olhar sobre o Teu rosto divino e contemplar como empalidece, se perturba, se angustia e se curva até ao chão. Ó meu Jesus sofredor, vejo, agora, como a Tua pessoa vacila
de um lado para o outro e por fim cai, como as Tuas mãos endurecidas se entrelaçam. Começo a ouvir os gemidos, os gritos de amor e de dor incompreensível que elevas ao Céu. Ó meu Jesus agonizante no Horto do Getsémani, nesta hora em que Te faço companhia, faz correr sobre
mim, um regato, uma aspersão daquele adorável sangue que corre, como torrentes, de todos os Teus membros adoráveis.

 Ó rio de sangue preciosíssimo do meu Sumo Bem, que agoniza por mim, que eu te sorva, te beba até à última gota, e contigo sorva e beba um sorvo, ao menos, do cálice amargo do Dileto, e sinta dentro de mim as penas do Seu Divino Coração, antes, sinto partir-me o coração pelo
arrependimento por ter ofendido o meu Senhor, que por mim passa por uma agonia de morte. Ah, meu Jesus! Dá-me a graça, ajuda-me a sofrer, a suspirar e a chorar Contigo, ao menos uma só hora no Jardim das Oliveiras! Ó Maria, Mãe Dolorosa, faz-me sentir a compaixão do Teu coração trespassado, por Jesus agonizante no Getsémani. Assim seja.

A revisão do rito bracarense

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Tratando mais uma vez a temática do rito bracarense, hoje irei abordar a questão do destino do rito após o Concílio Vaticano II; para tal, nada melhor do que recorrer ao Relatório apresentado à Sagrada Congregação para o Culto Divino. Como poderão ou não saber, o rito bracarense foi dos poucos ritos ocidentais que não foi revisto/reformado aquando da revisão do rito romano. Alguns de vós poder-se-ão perguntar o que aconteceu ao rito durante os anos da reforma litúrgica e porque tal nunca se deu neste caso. Tendo acesso a uma cópia do relatório da reforma do rito durante os anos tempestuosos após o CVII, gostaria de partilhar o seu destino, com vista a esclarecer porque o rito está quase desaparecido tirando uma ou outra celebração esporádica.

A Constituição Conciliar sobre a Sagrada Liturgia, Sacrosanctum Concilium, tem a dizer sobre ritos locais o seguinte:

4. O sagrado Concílio, guarda fiel da tradição, declara que a santa mãe Igreja considera iguais em direito e honra todos os ritos legitimamente reconhecidos, quer que se mantenham e sejam por todos os meios promovidos, e deseja que, onde for necessário, sejam prudente e integralmente revistos no espírito da sã tradiçãoe lhes seja dado novo vigor, de acordo com as circunstâncias e as necessidades do nosso tempo. [ênfase meu]

https://almabracarense.files.wordpress.com/2015/06/img_0791.jpg
Ao longo de todo o relatório, sempre que se menciona SC, sobretudo no que diz respeito ao rito bracarense, parece que o pressuposto é de que a revisão era obrigatória (talvez por factores historico-sociais?). Apesar do rito ter sido revisto apenas 50 anos antes, parece que se julgou necessário revê-lo mais uma vez. Todavia, os motivos que levaram à edição dos 1920's – recuperar o que era verdadeiramente bracarense e eliminar certas imposições romanas – não estiveram na base da desejada reforma após o Concílio Vaticano II.

A introdução do relatório, tratando a temática da reforma, tem o seguinte excerto da Nota Pastoral sobre a Constituição sobre a Sagrada Liturgia pelo ordinário diocesano:

[…] a reforma litúrgica é mais um espírito do que a alteração das cerimonias. Por isso, ir-se-á devagar, tanto mais que a obra completa não e para ser feita por uma geração. A nós compete começar o movimento que um dia terá corpo perfeito pelo seu desenvolvimento natural.

Trata-se duma prevenção de altíssimo valor prático, até para não termos de nos arrepender por haver andado depressa demais. Neste capítulo de inovações litúrgicas, vai melhor quem for mais devagar. […]


O ordinário continua, dizendo que o rito deverá ser renovado, mas não antes do romano (parece implicar ou que o rito bracarense era subordinado ao romano ou que a reforma do rito romano serviria de padrão para o bracarense). Quaisquer elementos que forem comuns a ambos os ritos estão sujeitos às novas normas litúrgicas, embora não necessariamente de imediato nem a partir do dia 7 de Março.

Numa carta ao clero no dia 17 de Dezembro de 1967 o ordinário diocesano salienta que: 

 […] pela supressão de algumas cerimónias em resultado dessa adaptação e pela aproximação do romano ao rito bracarense noutras, pelo menos na Santa Missa, pouco resta que distinga os dois ritos. […]
[…]
Se chegar ao fim, em breve, como se espera, e for aprovada a reforma do missal romano em estudo, poderá dizer-se que do antigo missal mal vai ficar pedra sobre pedra.
E na adaptação posterior do bracarense a luz do romano, que ficara nele de próprio a justificar existência a parte?

A 25 de Novembro de 1969 ouvimos do cabido que "o Cabido, na sua maioria, é da opinião que se deva procurar a sua [rito bracarense] sobrevivência". Apenas um cónego não concordou, tendo ficado registado o seguinte depoimento:

Ao signatário parece não deverem imiscuir-se particularidades do rito bracarense na feliz urdidura do ordo pós-conciliar. Ou continue, intacto e indemne, o ordinário bracarense, ou se aceite o opus perfectum do novo ordinário latino universal.

Parece que nesta altura existiria já alguma experimentação que, mais adiante no relatório depuramos, terá sido autorizada pelo ordinário. Pelo cariz dos comentários, parece-me que a reforma do rito bracarense não seguia pelo rumo pretendido.
Com que se pareceria está reforma? No meu parecer, um híbrido entre o rito bracarense e o missal Paulino. Chego a está conclusão a partir da introdução do relatório, que menciona que o rito revisto utilizaria do novo ordoromano o que fosse comum a ambos, e o que fosse particular ao bracarense seria adicionado posteriormente. Para este efeito estabeleceu-se um comité que iria estudar o rito bracarense e identificaria as suas particularidades. O comité apresentou a 25 de Novembro de 1969 a seguinte lista:

Ritos Iniciais:
  • Preparação do cálice
  • Bênção da água
  • Ave Maria
  • In nomine Patri… Sancti Spiritus adsit…
Liturgia da Palavra: como no rito romano
Liturgia Eucarística:
  • Ofertório: Acceptabilis sit… (hóstia): Ofertório: Offerimus tibi Domine… (cálice)
  • Genuflexão dupla
  • Uso da pala na elevação do cálice
  • Segunda elevação da hóstia
Rito da Paz
  • Domine Iesu Christe…
Preparação para a Comunhão:
  • Domine Sancte, Pater…
Conclusão:
  • Bênção: In unitate Sancti Spiritus… 

http://2.bp.blogspot.com/-wMyJIBv2yPs/TatJZRnMhXI/AAAAAAAAAXs/1kfj_2hNLvQ/s1600/P4171113.JPG
Celebração do rito bracarense durante a semana da Paixão

Inquiriram-se membros do clero e leigos relevantes da arquidiocese a propósito do rito e da sua reforma. O que segue, embora breve, é uma amostra reflectiva da atitude geral para com o rito da arquidiocese:
  • O comité para a aplicação de Sacrosanctum Conciliumé da opinião que o missal de Paulo VI devera ter prioridade na diocese. Ademais, o novo ordo está tão bem concebido que "a introdução de elementos estranhos – mesmo de tradição venerável – diminuiria o seu lustre." Assim sendo, a preservação das características bracarenses deverão ser confinadas a Sé Primacial.
  • Dever-se-á pedir à Santa Sé para que só se utilize o rito na Sé; os livros romanos são mais fáceis de gerir.
  • As diferenças entre ambos os ritos são mínimas, de tal modo que não merecem que se peça à Santa Se para as manter (ou então, apenas na Sé).
  • Devido à celebração da Missa ser transmitida na televisão a utilização do rito bracarense confundirá “pessoas menos evoluídas”.
  • “Antes haja coragem para romper com tradições veneráveis e ancestrais. Vale mais a participação do povo, deste povo moderno, tão habituado a expressões claras, inteligíveis e traduzíveis no seu modo profano de falar.”
  • “ [...] muitas pessoas [...] muitas vezes se queixaram todos do mesmo rito.”
  • “ [...] algumas rubricas mesmo ridículas.”
  • “algumas delas [particularidades] estão totalmente deslocadas, como [...] e preparação do cálice no principio.”
  • Deverá ser confinado a Sé, mas não a celebrações em que os leigos possam participar uma vez que não estão “preparados para participar activamente”.
  • Deve-se adoptar o novo ordo porque está "em mais perfeito contacto com o povo e portanto maior poder santificador, tornando-se mais simples, mais atraente, mais sóbrio, rápido e dinâmico, por conseguinte mais adaptado aos nossos tempos.
  • “Sermos todos iguais na Igreja de Deus, una e uniforme, e a nossa grande glória de sacerdotes católicos, e não queremos outra [refere-se aqui ao novo ordo]. […] Os nossos fiéis e sacerdotes e bispos andam por toda a parte do país e do estrangeiro, tomando parte activa no culto católico, que tem de ser igual para ser bom.”
No meio destas críticas todas encontramos um sacerdote com voz profética:

Deve notar-se que abolir o rito é ir contra uma veneranda tradição e contra o património religioso e cultural da diocese. E esta atitude destrutiva talvez venha a ser asperamente censurada num futuro mais ou menos próximo, quando, passada esta febre de reformas (e, em vários casos, de destruições), se tiver de repensar e de reassumir muitos dados tradicionais agora postos em causa e ate repudiados.
Alem disso, estando hoje no espírito da Santa Sé garantir a unidade dentro do essencial e aceitar no restante a diversidade de expressões de culto, autorizando a introdução de elementos tradicionais e de folclore na própria Santa Missa [dá-se aqui o exemplo de ordenações numa catedral africana], mal ficaria rejeitarmos formulas e ritos litúrgicos com séculos de tradição e aprovados pela Santa Sé.
[…]
As modificações introduzidas no novo Ordo Missaeromano são tão profundas e extensas que, pode dizer-se, com elas começa um novo rito e não apenas uma reforma existente. [...]

Desta breve amostra podemos ver que a maior parte do clero e dos leigos eram favoráveis ao abandono total do rito bracarense. Uma e outra vez sugere-se que o rito seja confinado à Sé, referindo-se que é uma relíquia que aí se deve guardar apenas para mostrar em determinados dias (alguns chegam ao cúmulo de lhe chamar peça de museu). Que a arquidiocese tenha seu próprio rito é encarado como algo vexaminoso, dizem alguns sacerdotes, uma relíquia dum período medieval atrasado que deveria ser abolido. A maioria dos leigos não compreende o contexto histórico do rito, mas não hesitam em dizer que ele não corresponde as necessidades pastorais do homem moderno. "Motivos pastorais" é um dos argumentos mais utilizados para justificar a abolição do rito. Outro motivo invocado é o económico: argumenta-se que é mais barato adoptar os novos livros romanos do que os de Braga. Facilidade na deslocação das comunidades e uniformidade como sinal de unidade são argumentos que surgem várias vezes também. Um sacerdote recorre a precedentes históricos para a adopção do missal Paulino, referindo-se ao facto da arquidiocese ter sido a primeira na península ibérica a adoptar o rito romano (o que não é totalmente verdade)!
Qual foi o parecer da CCD sobre a proposta de revisão? O parecer final foi de que o rito bracarense deveria ser preservado na sua integralidade, conforme era antes das revisões: 

Exclui-se toda e qualquer mistura do rito bracarense com o rito romano, de modo que o rito bracarense conserve integralmente a forma nativa, segunda a veneranda tradição secular.
Todavia:
  • Na celebração da Missa sem povo, o sacerdote que usa o rito bracarense pode tomar leituras do leccionário promulgado por autoridade de Paulo VI;
  • Na celebração da Missa com povo, o Ex.mo Arcebispo dará normas oportunas em ordem a providenciar os meios necessários a activa e consciente participação dos fiéis;
  • As leituras e a oração universal ou dos fieis devem ser proferidas em vernáculo. As leituras devem tomar-se do supracitado leccionário.
A CDD também deu ao clero bracarense a opção de utilizar ou um ou outro dos livros litúrgicos (desde a edição dos anos 1920's até à altura o bracarense era obrigatório em toda a arquidiocese).

Conclusão:
Porque nunca terá sido aprovada a revisão do rito bracarense? Terá a CDD concluído que era um rito moribundo tendo em conta os dados fornecidos? Talvez jamais saberemos. A verdade é que o rito bracarense está virtualmente morto. Tirando uma celebração esporádica por algum sacerdote desconhecido, a sua celebração diária, tanto quanto sei, não é uma realidade. Ocasionalmente há registos de celebrações presididas pelo arcebispo em Braga, mas do que me tem constado é que se trata duma celebração híbrida, influenciada pela Novus Ordo, quiçá o mesmo rito que a CDD recusou. Estas celebrações, à luz do que consta do relatório e dos factos a que tenho acesso obrigam-me a perguntar: Qual a legitimidade deste rito? Cairá sob a cláusula respeitante as celebrações presididas pelo arcebispo?
Qual a finalidade deste post? Acredito que o destino do rito bracarense é relevante para as discussões actuais que decorrem no mundo litúrgico respeitantes à vetus ordo do missal romano (também conhecido com forma extraordinária do rito romano). Espero que esta breve exposição levará a um estudo mais profundo do rito bracarense e a sua (eventual) reabilitação.

Da conveniência de uma Liturgia Universal, por Jorge Ferraz

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Liturgia universal catolicismo inculturação simbolismo significado mistagogia mistério


Não é a primeira vez que recomendo algum artigo do Deus lo Vult! E, sinceramente, espero não ser a última. Desta vez, Jorge Ferraz nos brinda com uma excelente reflexão sobre a universalidade da Liturgia.

É um tema fora de moda, eu sei. Há uma certa tendência por aí de querer adaptar a Liturgia aos gostos particulares de cada comunidade dizendo se tratar de inculturação. Esta infeliz tendência - muito em voga no Brasil, infelizmente - é fruto de uma concepção errônea de inculturação e, pior ainda, do que é a Liturgia em si.

Veja o que Jorge diz:
Eu entendo o argumento de que o Evangelho não é uma cultura pronta e acabada mas, ao contrário, uma força capaz de orientar para Cristo tudo aquilo que é verdadeiramente humano — e, portanto, tem em Si próprio a força de elevar a Deus qualquer cultura. Mas disso não me parece decorrer que o culto a Deus deva reproduzir as particularidades de cada povo, de cada grupo social, de cada costume local (ainda que legítimo). Ao contrário: penso que, no que diz respeito à Sagrada Liturgia, a catolicidade da Igreja deve se sobrepôr à legítima particularidade dos fiéis que do culto divino tomam parte em um momento histórico específico e em um lugar determinado do globo terrestre.
A seguir ele enumera três razões que fundamentam este seu pensamento, que resumo da seguinte forma:
  1. O simbolismo contido na Liturgia e o significado que ela carrega. A Liturgia em todos os seus aspectos deve ser mistagógica, deve comunicar o Mistério de um Deus que entregou Seu Filho por tamanho amor a cada um dos homens (Jo 3,16). Este ato sublime de amor torna-se presente através da Liturgia da Missa que, por isso, deve comunicar este caráter sagrado, extraordinário.
  2. A passividade da cultura no processo de inculturação. Ou seja, é o Evangelho o agente transformador aqui, e este age modificando uma determinada cultura humana presente num determinado momento histórico. Embora as culturas possam contribuir para o ethos católico, uma dita Cultura Católica, por assim dizer, esta influência sempre será muito menor do que a influência que o Evangelho e a Igreja devem exercer numa cultura.
  3. A universalidade da Liturgia, que não deve se contrapor ao seu caráter sagrado. Dito de outro modo: embora a Liturgia deva nos comunicar o Mistério, a sua forma e a execução do rito não nos devem causar estranhamento.
O texto na íntegra, cuja leitura recomendo fortemente, pode ser encontrado em "Da conveniência de uma Liturgia Universal".
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